Spotify x Apple: o embate que diz muito sobre o futuro

O Spotify e a Apple são apenas dois dos personagens que estão protagonizando a nova batalha nos negócios. A cultura organizacional dos negócios é o juiz que decide quem leva o prêmio.

Em uma época em que a maioria das empresas está adotando estruturas organizacionais mais simples em vez dos velhos e defeituosos modelos de comando-e-controle, a Apple continua a ter uma cultura de comando e controle na qual o poder é mantido por um grupo muito pequeno de indivíduos.

Tem sido bem divulgado que a Apple é  um lugar implacável, onde a responsabilidade é aplicada com rigor, as decisões são rápidas e a comunicação se articula claramente a partir do topo. Embora uma ligeira mudança dos dias de Steve Jobs, que guiou a Apple quase que como um ditador corporativo, possa ser notada, toda decisão crítica ainda é feita no topo da organização. Pelo seu tamanho, a organização da Apple é relativamente simples.

Apesar do tamanho e da complexidade da Apple, o organograma da empresa é enganosamente simples, sem nenhuma linha pontilhada ou responsabilidades que são tão populares em outras partes do mundo corporativo. Uma única pessoa — o chefe do setor financeiro — faz o balanço financeiro.

Esse é um exemplo radical do percurso diferente da Apple. A maioria das empresas encara o balanço financeiro como uma prova definitiva de responsabilidade de um gerente; a Apple contradiz essa ideia rotulando o balanço financeiro como uma distração que só diz respeito ao diretor financeiro.

A capacidade da Apple em manter um ambiente de comando e controle muito forte não só ajudou a sua capacidade de execução como também manteve a cultura de confidencialidade. Pare e pense, quantas vezes você já ouviu uma notícia da Apple sobre vazamento de dados ou informações? Provavelmente poucas. Quando essas noitícias acontecem, elas vêm de áreas com mais de 100 mil funcionários. Manter esse nível de ordem e de disciplina é algo extraordinário.

Leia também: Um novo campo de batalha nos negócios: nem mesmo a Apple está a salvo

Pode-se argumentar que tudo isso foi possível graças a uma equipe que não deixa a desejar em termos de conhecimento e alto envolvimento em todos os aspectos do negócio. Todos sabem que Steve Jobs colocava as suas mãos em cada decisão que a Apple fazia, seja concepção do produto ou tipo de materiais usados para construir os cases de exposição nas lojas. Os passos de Jobs já foram preenchidos por executivos como Jony Ive e outros que estão muito envolvidos nas decisões do dia a dia e em suas respectivas áreas.

O Spotify, um serviço sueco de streaming de música, foi lançado em outubro de 2008, e tem experimentado um crescimento tremendo e ostenta mais de 75 milhões de assinantes. Uma das chaves para o crescimento do Spotify tem sido a sua cultura, quase o extremo oposto da Apple.

Embora pequeno em comparação com a Apple, com 1,5 mil empregados, o Spotify é organizado na autonomia. Seu lema interno é “seja autônomo, mas não subotimize”. Cerca de 5 anos atrás, o Spotify decidiu repartir as suas equipes de engenharia para pelotões autônomos de 8 pessoas. Cada equipe trabalha para uma missão comum da empresa, mas tem autonomia para trabalhar em um projeto escolhido.

Leia também: Delegar é diferente de “Delargar”

Permitir que as equipes escolham o seu trabalho foi um processo difícil de gerir no início, mas o Spotify aprendeu com seus erros. A empresa tem sido capaz de proporcionar um elevado nível de autonomia, estabelecendo metas bem diferentes do padrão que estamos acostumados. Vamos a um exemplo:

A missão de uma equipe pode ser “fazer do Spotify o melhor lugar para descobrir música”, enquanto outro pode ser “fazer os testes A/B internos serem mais simples para as outras equipes”. Isso reúne a equipe em torno de um objetivo comum. Além disso, os líderes de equipe criam estratégias de produtos e metas de curto prazo que são discutidas a cada trimestre.

Há 2 conclusões e muitas perguntas abertas que vão moldar o novo campo de batalha para a Apple e muitas outras organizações que afastam os inovadores ou tentam perturbar os demais.

A 1ª é que não podemos encarar o comando-e-controle como uma forma ineficaz para operar. Ele depende muito do contexto da organização, da indústria e dos tipos de trabalho que são realizados. Claramente, o sucesso da Apple fala por si, mas o jeito “applesco” de ser é interpretado de um modo muito diferente do que costuma se ver:

1. A Apple mantém a sua direção bem simples, com modelos de prestação de contas muito claros. Raramente há casos em que várias pessoas cuidam do mesmo assunto;

2. A colaboração é a chave e ela começa nos níveis mais altos. Imagine como é trazer um produto como o Apple Watch para o mercado. É preciso de apenas 1 departamento para deixar a bola cair e arruinar o lançamento. Todos os aspectos da organização são extremamente alinhados em direção ao objetivo final, mas também são muito responsáveis ​​pela sua parte individual;

3. Ter uma equipe forte e ativa é essencial. Os executivos devem estar envolvidos e engajados. Quando muitos funcionários confiam no comando do executivo as decisões são tomadas rapidamente;

4. Este tópico vai causar polêmica, mas olhando para a classificação da Apple no Glassdoor e conhecendo um punhado dos seus funcionários, percebe-se que ainda é possível alcançar altos níveis de envolvimento e de propósito em um ambiente de comando-e-controle. Muitos funcionários da Apple são extremamente orgulhosos de trabalhar lá e enxergam um propósito claro no trabalho que fazem.

Em 2º lugar, os modelos de autorganização ou holocracia podem apresentar uma vantagem competitiva no longo prazo. Enquanto a história ainda não foi escrita, empresas como o Spotify e o Flipboard são obrigadas a dar ao seu dinheiro um bom destino e podem até sair vitoriosas depois de uma batalha épica no estilo Davi e Golias.

A capacidade de aproveitar a inteligência coletiva de uma organização, em uma era em que a complexidade continua crescendo e o ritmo da mudança acelera, cria vantagens únicas, como:

I. Uma taxa muito maior de resposta à mudança. As equipes podem ver as ameaças e podem se mobilizar muito mais rápido do que a liderança incentivando a mudança do topo para o restante da empresa;

II. A velocidade de execução pode aumentar muito quando a organização não precisa recorrer a um conjunto relativamente pequeno de líderes com pouco tempo para tomar decisões ou para instruir as pessoas sobre como executar as tarefas;

III. Problemas complexos são melhor compreendidos e resolvidos por meio do esforço de uma equipe distinta;

IV. Forte sentimento de empoderamento que leva a mais criatividade, produtividade e engajamento.

Uma coisa é certa: o próximo conjunto de batalhas será como nenhum outro. Com estratégias muito semelhantes e com a diferenciação se tornando praticamente inesistente, até mesmo as organizações mais inovadoras do mundo podem ter seu trabalho eliminado por ele.

Embora não exista um modelo para a arrancada, os líderes que abraçam a cultura como uma vantagem competitiva e dirigem a sua atenção para a criação de uma vantagem sustentável são aqueles que sairão vitoriosos.

O conteúdo original, escrito por Reuven Gorsht, você encontra aqui

Facebook
Twitter
LinkedIn