Ricardo Voltolini

por Mônica Pupo (monica@empreendedor.com.br)

Há tempos que o conceito de sustentabi­lidade deixou de ser aplicado apenas aos pro­dutos, para englobar também as ferramentas e formas de gestão. É neste contexto que cresce a importância dos chamados líderes sustentáveis. Conciliar produtividade, resultados e compro­missos socioambientais está entre os desafios destes profissionais, cada vez mais necessários e requisitados no mercado.

“A sustentabilidade é absolutamente im­prescindível para todas as empresas no século XXI. Então cabe à liderança puxar esse movi­mento, fazer a transformação acontecer, traba­lhar para mudar o modelo de negócio, inspirar e envolver mais pessoas na proposta de um novo modelo de negócio menos intensivo em recursos naturais e carbono”, afirma Ricardo Voltolini, consultor empresarial e autor do livro Escola de Líderes Sustentáveis, lançado em outubro de 2013 pela Editora Campus-Elsevier.

A seguir, o especialista fala mais sobre o conceito de liderança sustentável e como é pos­sível – e necessário – aplicá-lo em empresas dos mais diferentes portes e segmentos. Além disso, Voltolini propõe ferramentas e estraté­gias simples para incluir a sustentabilidade no planejamento estratégico.

O que significa ser um “líder sustentável”?

Ricardo Voltolini – É liderar com va­lores. Um líder sustentável é aquele que pratica os valores de sustentabilidade na gestão de seus negócios e esses valores são basicamente: respeito ao outro, res­peito ao meio ambiente, diversidade, ética e transparência. Esse líder deve compreender que o sistema econômico depende do sistema ambiental. Que seu modelo de negócio não seja permitido em prejuízo do planeta e da sociedade.

É possível citar um ou mais exemplos de líderes que o senhor considera sustentáveis?

Voltolini – Sim. Temos 30 deles em nossa Plataforma Liderança Sustentável, mas quero destacar alguns que foram marcantes para mim, como Fábio Bar­bosa, atual presidente do Grupo Abril e que antigamente era presidente do Banco Real. Ele transformou o banco em um dos maiores modelos de sucesso em sustentabilidade, com ações muito arrojadas para a época, com pioneiris­mo e muita sensibilidade. Paulo Nigro, presidente da Tetra Pak é outro líder consagrado. Ele tem feito grande revo­lução no sentido de tornar a embalagem Tetra Pak 100% reciclável. Temos o Car­los Fadigas, presidente da Braskem que tem se notabilizado por ser o maior pro­dutor de plástico verde no planeta e um dos maiores defensores dos processos químicos sustentáveis no mundo. Posso citar, ainda, o presidente da AES Brasil, Britaldo Soares, que teve a grande sensi­bilidade de inserir a sustentabilidade em uma companhia do tamanho da AES em nível nacional. É um trabalho gigantesco educar e capacitar todos os gestores de negócios para que eles pratiquem essa sustentabilidade em todas as unidades. Esses são líderes altruístas que têm um olhar humano muito intenso e que ava­liam todas as decisões considerando sempre o lado sustentável do negócio.

Como é possível conciliar liderança e sustenta­bilidade no atual contexto das empresas brasi­leiras?

Voltolini – Isso é necessário e urgen­te. Todas as empresas têm seus líderes e quando falamos em líderes não estamos falando só do presidente da empresa, mas de um conjunto de liderança. Cos­tumamos dizer que sustentabilidade é um conceito e que ele é absolutamente imprescindível para todas as empresas no século XXI. É fundamental no papel da liderança puxar esse movimento, fa­zer a transformação acontecer, trabalhar para mudar o modelo de negócio, inspi­rar e envolver mais pessoas na proposta de um novo modelo de negócio menos intensivo em recursos naturais e carbo­no. Sem esses líderes, não há como fazer uma mudança efetiva.

E no caso de micro e pequenas empresas: tam­bém é possível ser um líder sustentável? Ou isso só se aplica às grandes corporações que dispõem de um extenso organograma?

Voltolini – Claro que é possível. Isso da sustentabilidade se aplicar somente às grandes corporações é um mito. Não im­porta o tamanho da empresa, se é gran­de, média ou pequena. O que importa é o tamanho de nossas responsabilidades. É proporcional ao tamanho dos impac­tos socioambientais que nós geramos. É claro que uma empresa grande produz impactos grandes, como uma empresa de petróleo ou de papel e celulose, por exemplo, que produzem impacto social enorme. Mas isso não significa que uma loja de bairro ou uma padaria também não gerem. Todos nós geramos uma pegada ecológica no planeta de acordo com nosso estilo de vida.

Como os pequenos empreendedores devem agir para aderir à liderança sustentável?

Voltolini – No caso das pequenas empresas, talvez a forma de agir seja mais simples, pois o dono está mais per­to do cliente, dos funcionários, então, basta que ele tome uma atitude simples que é observar os impactos sociais e ambientais de sua empresa, e trabalhar para eliminar ou minimizar esses impac­tos negativos. Ele pode começar, por exemplo, pela gestão do lixo, do uso de energia, do uso da água ou com a redução nas emissões de carbono. Um exemplo bacana vem de uma pequena empresa de entregas de São Paulo, que está fazendo a diferença após trocar os motoboys por ciclistas.

Quais as principais características de um líder sustentável?

Voltolini – Primeiro, acreditar e praticar os valores da sustentabilidade; segundo, tem que acreditar no negó­cio que ele chama de interdependên­cia entre o sistema econômico, social e ambiental, pois o melhor lucro é aquele que vem em benefício da sociedade, de pessoas e em benefício dos recursos naturais. Normalmente, líderes susten­táveis olham o negócio a partir da opor­tunidade e não do risco. Eles devem ter coragem para propor mudanças que, às vezes, vão contra tudo o que a empresa pratica naquele momento. Além disso, ele precisa de resiliência para enfrentar as resistências que virão pelo caminho. Ele tem que ser pregador e um entusias­ta do tema. Alguém que usa o tema para engajar pessoas, valores, mobilizar senti­mentos, consciência, com capacidade de reunir pessoas em torno desse objetivo.

E, por outro lado, o que não deve fazer o líder que pretende se voltar à sustentabilidade?

Voltolini – Não deve, por exemplo, tomar decisões de negócios que, de al­gum modo, prejudiquem o planeta ou a sociedade. Um líder sustentável, ao tomar decisões, não pode deixar que elas tragam impacto negativo nem para pessoas nem para o meio ambiente, ain­da que estas decisões gerem resultado econômico para a empresa.

Quais ferramentas o senhor julga serem mais efi­cazes para engajar os colaboradores na questão da sustentabilidade?

Voltolini – Um primeiro passo im­portante é colocar a sustentabilidade na sua estratégia de negócio. Tem uma fer­ramenta bastante conhecida nas grandes empresas que é o planejamento estraté­gico. Ele acontece quando você reúne seus líderes e começa a desenhar uma missão, estratégias, valores e objetivos. Depois, esse planejamento será desdo­brado em metas que devem ser cumpri­das por todas as pessoas que trabalham ali. Ele vai permear toda a estratégia de fazer negócio dentro dessa empresa. Dependendo do seu porte, a empresa pode, também, lançar mão da estraté­gia de educação, envolvendo as pessoas nesse sentido. Estratégias que melho­rem o repertório dos colaboradores e desenvolvam ferramentas e atitudes.

Qual a importância da criação de comitês inter­nos para fiscalizar/disseminar questões referen­tes à sustentabilidade?

Voltolini – Comitês ou quaisquer instâncias que se criem na empresa para manter o tema em pauta e conectar pes­soas são, a rigor, muito importantes e bem-vindas. Mas, para dar certo, preci­sam de um ambiente propício. Não sei se vale a pena criar comitês para empre­sas que ainda não inseriram a sustenta­bilidade no planejamento estratégico. Quando a empresa já tem metas claras de sustentabilidade e envolve seus fun­cionários, os comitês são absolutamen­te bem-vindos, pois dão uma diretriz às ações.

Líderes sustentáveis costumam encontrar algum tipo de entrave nas organizações? O mercado como um todo já está preparado para esse tipo de profissional e empresa “verde”?

Voltolini – Repito que o líder susten­tável tem que ter coragem e resiliência, pois nem sempre ele vai encontrar am­biente fértil para isso. A sustentabilidade ainda é um conceito novo e quando pro­põe olhar para dentro, mudar modelos de negócios, mudar o modelo mental de pessoas é tudo muito complexo. Qual­quer mudança é muito complexa. O ser humano prefere se manter em zona de conforto. E quando você propõe a sus­tentabilidade e ela questiona o modelo que está ali, você encontra resistência. Por isso o líder tem que ser alguém com coragem para propor mudanças e fazer com que as mudanças aconteçam efeti­vamente no dia a dia. O grande fator de resistência à mudança é a lei da inércia, aquela que faz com que a gente continue na mesma situação. Certamente hoje os líderes encontram menos resistência ao conceito sustentabilidade do que há 10, 15 anos, mas ainda é um desafio.

Num futuro próximo, as empresas que não se adequarem à economia verde tendem a desapa­recer?

Voltolini – Essa é uma opinião bas­tante comum entre as empresas que trabalham com sustentabilidade. Em um futuro próximo, nem a sociedade, nem os governos, nem os clientes não admi­tirão mais produtos de empresas que não trabalhem em prol do planeta. As empresas que não aceitarem o mandato de mudança e não trabalharem no senti­do de mudar tendem a desaparecer, pois serão punidas pela sua inépcia, pela sua emissão, por não buscar caminhos para mudar o quadro.

Por fim, quais conselhos o senhor daria a um empreendedor que está prestes a inaugurar seu primeiro negócio e que deseje ser sustentável?

Voltolini – Muito simples: primeiro, avalie quais são os impactos sociais e ambientais negativos que o negócio vai gerar e parta sempre do princípio que todos geram impactos. Ao identificar, trabalhe para eliminá-los ou diminuí-los. Quem fizer isso vai começar muito bem o seu negócio.

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