Atraídas pelo crescimento econômico, 30 marcas internacionais desembarcam no País nos próximos meses

 Nova York, Quinta Avenida. Paris, Gallerie Lafayette. Londres, Bond Street. O ritmo no qual os cartões de crédito dos brasileiros saem das carteiras nos endereços mais caros do mundo não passou despercebido entre as principais grifes de luxo. Somente nos próximos meses, de olho no poder de consumo da classe média alta brasileira, cerca de 30 marcas sinônimo de sofisticação vão inaugurar suas primeiras lojas próprias no País, a maioria em São Paulo, no Shopping JK Iguatemi, que abre as portas em 19 de abril, e na expansão do Cidade Jardim.

O bom desempenho econômico do Brasil também influencia esse movimento, já que a crise tem limitado o crescimento nos Estados Unidos e na Europa. Ainda pouco explorado, o mercado brasileiro é um oásis em um deserto de margens apertadas – é comum que as grifes cresçam acima de 10% ao ano, uma taxa digna da China. No ano passado, as vendas no Shopping Cidade Jardim aumentaram 20% em relação a 2010. E a operação local da Lacoste foi líder mundial de crescimento: em 2011, a receita da marca francesa cresceu 43% no Brasil.

Projeções macroeconômicas mostram que o otimismo tem chances de se estender no longo prazo. Segundo a Fundação Getúlio Vargas (FGV), a população das classes A e B crescerá 29% entre 2012 e 2014 – expansão maior que a da classe C no período. Isso significa a inclusão de 7,7 milhões de brasileiros nos patamares mais altos de consumo, que passarão a concentrar quase 30 milhões de pessoas. Fazem parte deste contingente brasileiros com renda familiar superior a R$ 7.475 ao mês.

Disposição de comprar

A invasão das marcas estrangerias de primeira linha ficará clara nos novos endereços de comércio: só o JK Iguatemi terá um andar inteiro dedicado a grifes de altíssimo padrão e outro reservado para o que os especialistas em varejo chamam de "luxo acessível". Mas só foi possível convencer tantas novas empresas a fincar bandeira no País em um curto espaço de tempo graças à observação do comportamento do consumidor brasileiro na Europa e nos Estados Unidos. "O brasileiro já é um dos consumidores ‘top 10’ em nossas lojas no exterior", conta Maxime Tarneaud, diretor da marca de joias e relógios Cartier no Brasil.

O grupo Richemont, do qual a Cartier faz parte, vai abrir seis novas lojas no País este ano. Além de duas novas Cartier, uma em São Paulo e outra no Rio de Janeiro, o conglomerado vai introduzir quatro marcas no Brasil – três de relógios masculinos (IWC, Panerai, Jaeger-LeCoultre) e outra de joias e acessórios (Van Cleef & Arpels). Todas funcionarão lado a lado no JK, em um espaço de 500 metros quadrados. Segundo apurou o Estado, a abertura de uma loja voltada à classe A consome investimentos de R$ 10 mil a R$ 25 mil por metro quadrado. O investimento da Richemont somente em espaço físico no JK pode ter passado de R$ 12 milhões.

Com um tíquete médio que pode chegar a R$ 30 mil, no caso da Jaeger-LeCoultre, o grupo Richemont decidiu estreitar margens para impedir que o cliente deixe de ir às lojas nacionais e prefira fazer compras no exterior. "O posicionamento de todas as marcas é de um preço no máximo 15% superior ao praticado nos Estados Unidos", diz Ramon Neto, diretor-geral do conglomerado no País. Outra vantagem que as unidades locais vão oferecer é o parcelamento – uma possibilidade que também agrada o cliente de altíssima renda. "Vamos vender em até dez vezes."

O comportamento do consumidor classe A, no entanto, segue alguns rituais próprios. Segundo Ana Auriemo, diretora de desenvolvimento de mix da JHSF, proprietária do Shopping Cidade Jardim, as compras de maior valor se concentram nos dias de semana, período em que o movimento de pessoas no shopping é menor. "O shopping acaba prestando um serviço para o cliente", diz a executiva. "Temos 500 crianças na academia Reebok. Enquanto esperam os filhos, as mulheres podem passear pelo shopping. É o momento em que ocorrem nossas melhores vendas."

Degraus

O novo empreendimento do Iguatemi trará 25 "estreias" no Brasil, nas quais estão incluídas, além das marcas do Richemont, Goyard, Miu Miu, Lanvin, Nicole Miller, Tory Burch, Lacoste L!ve, Etiqueta Negra, Ladurée, Paula Cahen, Rapsodia, Vans, Coach e a primeira operação mundial da Gucci voltada ao público masculino. Embora sejam sofisticadas, nem todas as marcas são consideradas de luxo. No entanto, algumas dessas empresas podem subir um degrau na escala de consumo ao aportar no Brasil. Segundo especialistas em varejo, o sucesso local das linhas alternativas da Armani e da Calvin Klein no País é uma prova dessa possibilidade.

O luxo acessível será um dos vetores de expansão do portfólio de marcas internacionais no País, segundo Patricia Assui, diretora da Iretail, empresa do grupo Iguatemi que faz o "meio de campo" entre grifes estrangeiras e as oportunidades no Brasil. "Acredito que estamos passando por uma evolução do mercado de luxo brasileiro", diz. Para a executiva, à medida que o brasileiro viaja e se informa mais sobre moda, abrem-se oportunidades para marcas mais jovens. É nessa categoria que se encaixa, por exemplo, a Coach. A marca nova-iorquina de bolsas terá duas lojas em São Paulo até o fim do ano – a segunda será no Shopping Morumbi – e já planeja unidades para Rio e Brasília.

Mas o Shopping JK também terá operações de mercado de massa no exterior, como a britânica Topshop e a Zara Home, loja de decoração do grupo espanhol Inditex. Segundo o vice-presidente comercial da Iguatemi Shopping Centers, Rodolpho Freitas, a variedade é importante porque o Brasil ainda não comporta um centro comercial totalmente voltado à altíssima renda. As lojas serão agrupadas de acordo com o perfil de público e o mix incluirá ainda marcas populares e tradicionais no Brasil, como Havaianas, Luigi Bertolli e Hering.

Segundo fontes de mercado, porém, o shopping fez algumas escolhas em relação ao mix. A intenção da Riachuelo de criar uma unidade compacta só com a linha feminina no shopping, por exemplo, não foi adiante. O objetivo da Riachuelo com a entrada no JK era dar um toque de sofisticação à sua marca, considerada popular. É esse o caminho que a cadeia de fast fashion Topshop pretende trilhar ao começar sua história no Brasil pelo novo empreendimento do Iguatemi. Ainda em 2012, a Topshop vai abrir mais duas unidades em São Paulo, antes de iniciar a expansão para Rio de Janeiro e Brasília a partir do próximo ano.

O País deverá ser um terreno fértil para esse tipo de "ajuste para cima" do perfil das marcas, na opinião de João Carlos Lazzarini, professor do Programa de Administração de Varejo (Provar), da Fundação Instituto de Administração (FIA). Ele cita a Zara, presente tanto no Cidade Jardim quanto no JK, como exemplo de sucesso – e diz que a Topshop também pode criar uma aura de sofisticação. Segundo o especialista, a atração está no desconhecido – o que é consumido pela massa lá fora pode ser muito bem considerado um luxo acessível aqui.

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