Campo de gigantes

Demorou, mas finalmente o Brasil começa a se dobrar à geração eólica. Os bons ventos que sopram por aqui respondem por 1,39% de toda a eletricidade produzida no País. Sim, ainda é pouco, mas a quantidade de energia gerada cresce rápido. Em 2009, a participação eólica na matriz elétrica era de 0,6% e há 20 anos sequer tínhamos um aerogerador em funcionamento. Hoje são mais de 1 mil em atividade e se espera chegar a 4 mil até 2015. Estima-se que em 2020 os ventos respondam por 15% da energia produzida no Brasil.

E ainda há muito espaço para crescer. O potencial eólico brasileiro é estimado em 300 gigawatts (GW) e a capacidade instalada dos 79 parques em operação é de 1,734 GW, equivalente à metade de Jirau, hidrelétrica em construção no Rio Madeira, em Rondônia. Outros 60 empreendimentos estão sendo implantados e vão acrescentar 1,480 GW ao sistema. A perspectiva é chegar a 2016 com 8,4 GW de potência, representando 5,4% da matriz. “Já somos a segunda fonte mais competitiva no Brasil, atrás apenas da hidráulica”, destaca Elbia Melo, presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica).

A consolidação da geração eólica no Brasil começou em 2009, quando aconteceu o primeiro leilão desta fonte no País. Desde então foram realizados quatro certames e contratados 6,7 GW a preços cada vez mais competitivos. No leilão de 2009, o preço médio de venda foi de R$ 148,39/MWh. No último, em 2011, o valor médio ficou em R$ 99,54/MWh. “A inserção da energia eólica fortalece a estratégia do Ministério de Minas e Energia de manutenção do alto conteúdo renovável e de diversificação de forma sustentável da matriz elétrica brasileira”, resume Altino Ventura, secretário de Planejamento e Desenvolvimento Energético do MME.

O Global Wind Report 2011, relatório anual do Conselho Global de Energia Eólica (GWEC), coloca o Brasil entre os quatro países com maior crescimento do setor, atrás da China, Estados Unidos e Índia. O estudo, divulgado em abril deste ano, estima que, entre 2012 e 2016, a taxa média anual de crescimento da fonte eólica no País fique em torno de 40%, enquanto a taxa média global prevista é de 8%. Ao fim deste período, o Brasil deve ocupar a 10ª posição no ranking dos maiores produtores mundiais de energia gerada pelos ventos. Segundo dados do MME, em 2011 o crescimento da geração eólica foi de 24,2% em relação a 2010.

Cadeia produtiva

O cenário favorável aguça o apetite das empresas que fazem parte da cadeia produtiva do setor. Segundo sondagem realizada pela ABEEólica, a indústria de equipamentos eólicos vai disputar um mercado de R$ 10 bilhões por ano. São fabricantes de pás, transformadores, semicondutores, inversores e drives, entre eles muitas empresas estrangeiras que se instalaram no Brasil nos últimos anos. “Até 2008 tínhamos apenas um fabricante de aerogerador; hoje são 11, o que representa maior competição, ganhos tecnológicos importantes e tranquilidade para os investidores”, ressalta a presidente da ABEEólica.

O Brasil já ocupa posição de destaque nos negócios de muitos players globais do setor. É o caso da Arteche Turnkey Solutions. “O mercado eólico brasileiro gera em torno de 40% do volume de negócios da Arteche Brasil, o que representa aproximadamente 15% de faturamento para o grupo, em termos mundiais. Além disso, a experiência adquirida no Brasil está servindo como elemento propulsor para a estratégia de internacionalização da Turnkey Solutions em novos mercados potenciais da América Latina”, afirma a diretora comercial da empresa, Tânia Maira Aloisi de Souza.

A Turnkey Solutions conta com 30% de participação na matriz eólica instalada no País atualmente. “Já fornecemos soluções para 16 parques e estamos construindo outros cinco complexos para os principais players do mercado, totalizando 1,17 GW de potência construída e em construção”, afirma Tânia Souza. Segundo a executiva, a empresa trabalha com a expectativa de acréscimo de potência na matriz energética brasileira de 1,5 a 2 GW por ano, nos próximos 10 anos. “Avaliamos as perspectivas de expansão dos negócios relacionados ao mercado eólico brasileiro como muito promissoras, com geração de oportunidades em uma curva ascendente a longo prazo.”

Tânia Souza destaca ainda a rápida capacidade de inovação e adaptação das empresas que atuam na cadeia eólica brasileira às demandas apresentadas pelo mercado nacional. “Evidenciamos fabricantes internacionais de aerogeradores estudando modificações em suas turbinas para adequação de suas máquinas ao comportamento de vento do Brasil e fabricantes de materiais e componentes desenvolvendo pesquisas no campo da engenharia de materiais a fim de lançarem materiais mais leves e resistentes às intempéries inerentes ao setor eólico.” Um exemplo do avanço tecnológico é a altura das torres, que nos últimos três anos passou de 50 para 100 metros.

O potencial eólico brasileiro concentra-se nas regiões Nordeste e Sul, com destaque para os estados do Ceará, Bahia, Rio Grande do Norte e Rio Grande do Sul. Para a Renova Energia, proprietária do maior complexo eólico da América Latina, localizado no interior da Bahia, a empresa é a maior prova de que a energia dos ventos é um excelente negócio. “Continuamos fazendo novos projetos. Isso significa que os resultados estão agradando aos acionistas”, destaca Rodrigo Bota, superintendente de implantação. “Antigamente a desconfiança era muito grande, mas as expectativas dos projetos feitos lá atrás se mostraram verídicas”, reforça o executivo.

Valorização atrativa

A Renova Energia tem mais de 1 GW de capacidade instalada contratada em parques eólicos. O volume equivale ao consumo de 2 milhões de residências. Em 2010, a empresa fez seu IPO, oferta pública inicial de ações, e até hoje é a única empresa de geração de energia renovável com ações negociadas em bolsa. Desde então, as ações da companhia tiveram uma valorização de 73,4%. “Nós fomos pioneiros no segmento e hoje estamos colhendo os frutos por ter acreditado na eólica como uma fonte de energia importante dentro da estratégia do País de investir em fontes renováveis”, destaca Bota.

No início de julho, a Renova inaugurou no sudoeste da Bahia o Complexo Eólico Alto Sertão I. O empreendimento vai gerar 294 MW, representando um aumento de 29,4% na matriz eólica brasileira. O volume é suficiente para abastecer uma cidade de 2,16 milhões de habitantes. Foram investidos R$ 1,2 bilhão no complexo, formado por 14 parques e 184 aerogeradores. A energia do empreendimento foi comercializada no leilão de reserva de energia de 2009. Agora, a Renova parte para a construção de mais 15 parques eólicos, também na Bahia, com energia contratada nos leilões de 2010 e 2011. Seis deles, com capacidade de 163 MW, devem ser inaugurados em 2013; e os outros nove, com 212 MW de potência, em 2014.

No Sul do País, os investimentos na fonte eólica marcaram o retorno da Eletrosul à geração de energia – em 1998, o parque de usinas da estatal foi totalmente privatizado. Desde dezembro de 2011, a empresa, do Grupo Eletrobras, opera comercialmente seu primeiro empreendimento eólico, localizado em Sant’Ana do Livramento, no extremo sul do Rio Grande do Sul. O Complexo Cerro Chato tem 45 geradores e capacidade instalada de 90 MW. É o primeiro empreendimento do leilão exclusivo de eólica, realizado em 2009, a entrar em operação. “Na época, oferecemos a menor tarifa, R$ 131/MWh, considerada inexequível pelo mercado. Mostramos que era possível baixar mais ainda”, afirma Airton Silveira, assistente da Diretoria de Engenharia.

Com investimentos de R$ 1,8 bilhão, a Eletrosul está construindo mais 21 parques eólicos no Rio Grande do Sul, somando 480 MW de capacidade instalada. São empreendimentos viabilizados no 12º Leilão de Energia Nova (A-3), realizado em agosto de 2011, e representam quase metade (44,16%) do total de energia eólica contratada no certame (1.067,7 MW). A tarifa ficou em torno de R$ 100/MWh. Os parques serão implantados em Santa Vitória do Palmar (258 MW), em Chuí (144 MW) e em Sant’Ana do Livramento (78 MW). As obras deste último já estão em andamento e devem ser entregues em janeiro de 2013. Os demais devem ser concluídos no início de 2014.

Em pouco tempo, a geração eólica no Brasil deixou de ser uma aposta no futuro para se tornar uma fonte de energia viável e confiável, além de um excelente investimento. Hoje é impossível ignorar essa opção num país em que o consumo de eletricidade deve quase dobrar em dez anos. Por serem inconstantes, os ventos jamais substituirão completamente outras formas de geração, mas ganham um papel estratégico cada vez maior como fonte complementar no sistema elétrico brasileiro e ainda contribuem para manter limpa a matriz energética nacional. Que soprem bons ventos.

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