Cuidado com o que você deseja

Um homem, em busca de sombra, se sentou embaixo de uma árvore. Cansado, pensou: “Ah se eu tivesse um bom copo d’água!”. O que ele não sabia é que aquela era a árvore dos desejos. Então logo apareceu diante dele um copo d’água sobre uma bandeja. O homem ficou surpreso e pensou: “… E se ao invés de água fosse um suco de frutas delicioso?”. Em questão de segundos, sobre uma mesa, apareceram várias jarras do sumo das mais variadas frutas, para que o desejoso pudesse degustar.

Entre a surpresa e o espanto, e ainda sem compreender muito bem o que estava acontecendo, o homem continuou a expressar os seus desejos: “Bem que podia ter algo para comer”. Num instante, a mesa ficou cheia dos mais variados quitutes. O homem, feliz da vida, não cabia em si. Fartou-se de boas bebidas e boas comidas.

Começou a se dar conta de que estava acontecendo algo muito especial. “Ah! Se tivesse um bom leito para descansar e tirar uma soneca”. Uma bela cama forrada com alvas cobertas, cheirando a frescor, estava bem ali, à sua inteira disposição. O homem acomodou-se para relaxar, mas daí pensou: “E se foram espíritos que colocaram todas essas coisas aqui?”. A indagação fez com que ele esquecesse a boa preguiça. Depois da primeira pergunta surgiram muitas outras. “E se eles forem maus espíritos?”. Em estado de prontidão, o homem sentou-se no leito: “E se forem espíritos assustadores?”. Já de pé, com os olhos arregalados: “E se eles me matarem?”.

E aí ele foi morto pelos espíritos que acabara de criar.

A história da árvore dos desejos possui várias versões e interpretações que atravessam os tempos. Todas elas partem do mesmo princípio de que “não vemos as coisas como elas são; vemos as coisas como nós somos”. Afinal, quem matou o homem? No início, um ser à base do desejo. Movido pelo querer, o homem conseguia o que almejava. De repente, e após ter conseguido o que queria, o medo e a desconfiança invadiram seus sentimentos. A partir daí não era mais um ser disposto a desfrutar as suas conquistas, mas um ser receoso de perder a sua sorte. Um ser medroso.

No mundo dos negócios, essa história se repete com muita frequência. Veja como funcionam, de maneira genérica, os estágios de vida de um negócio.

O sonho

No início, uma ideia e um sonho. O compromisso com o “dar certo” não é apenas racional, mas também emocional. Existe o risco, mas ele nem alcança o tornozelo do sonho. Não é o conhecimento do negócio que faz com que ele prospere, ao contrário do que muitos acreditam, mas a fé, a crença de que o sonho possa se transformar em realidade. E assim ele se realiza.

A realidade

A ideia ganha forma, o sonho adquire contornos. As coisas começam a acontecer efetivamente. A ideia inicial agora possui endereço e telefone. O sonho envolve pessoas e coisas ao seu redor. O negócio é feito de atenção e interesse pelo cliente. E também de empenho e excelência na forma de corresponder e responder às necessidades.

O crescimento

No primeiro estágio havia uma ideia, que no segundo foi posta em prática. O mercado corresponde positivamente aos produtos e serviços. As vendas aumentam e, com elas, se ampliam a estrutura e a capacidade produtiva. Mais vendas, mais produtos e serviços, mais trabalho para todos os envolvidos.
O crescimento traz consigo novos problemas. Um dos mais comuns é a crise do tamanho. A empresa já não é tão pequena a ponto de todas as decisões se concentrarem numa única pessoa, nem tão grande que necessite de um quadro de profissionais.

A bifurcação

Existe uma bifurcação no meio da estrada e o caminho escolhido vai selar o futuro do negócio. De um lado, o sonho a ser compartilhado com os novos integrantes. Implica que haverá reparos e o sonho individual, antes restrito apenas ao empreendedor, se transformará no sonho coletivo, capaz de fazer pulsar a alma de todos. Do outro lado, a busca por assegurar o sucesso do negócio através da sistematização. Nessa alternativa, o importante é obter a regularidade, por meio de planejamentos estratégicos e financeiros.

O caminho da empresa

Se o caminho for esse, a necessidade de segurança e controle rouba o lugar do sonho. Junto com o controle vem a desconfiança. A empresa perde o espírito de criatividade, inovação e incentivo às mudanças que a levou a prosperar. A empresa perde, também e inexoravelmente, a energia advinda do comprometimento espontâneo. Na mesma medida que prioriza os ganhos financeiros antes da satisfação dos clientes, os colaboradores internos também fazem o mesmo, colocando as recompensas pessoais antes dos resultados coletivos.

A empresa torna-se passiva diante das oportunidades de longo prazo. As metas de curto prazo com resultados relativamente garantidos tornam-se a regra. Tenta-se aumentar os lucros, graças à redução dos custos, não da expansão de receita.

Diante desse quadro, o cliente, antes acostumado a ser bem tratado e assistido, defronta-se com uma empresa autocentrada, ensurdecida e de costas para as suas necessidades. Por não conseguir canais de acesso às suas reclamações, prefere migrar para outro fornecedor.

O mesmo acontece com os colaboradores mais comprometidos e criativos. Na falta de ressonância para as suas ideias e competências, preferem saltar do barco à procura de reviver os bons tempos de motivação e resultados. Por outro lado, os mais burocratas se acomodam, eles que gostam de trabalhar apoiados em regras e procedimentos, sem nenhuma orientação para os resultados ou para a satisfação das necessidades dos clientes.

A parte final dessa história é o esquecimento do negócio. Ninguém mais se lembra da intenção inicial. Não há mais sonho, apenas rotina e afazeres.

O caminho do negócio

É no mundo da abundância que o negócio prospera mais. Existe um equilíbrio entre controle e flexibilidade. E também clareza sobre o que é o negócio. Adota-se uma gestão participativa para que todos continuem compartilhando sonhos e desejos. A comunicação é aberta e as pessoas se sentem altamente comprometidas e motivadas.

Volta-se à origem. O negócio recupera a sua essência. Agora não mais um sonho que se sonha só, mas um sonho que se sonha junto. Com outras pessoas. Mais do que os conhecimentos, é a crença que faz a roda girar. E, assim como na árvore dos desejos, o mundo responde com benevolência.

Roberto Adami Tranjan é educador da Cempre – Conhecimento & Educação Empresarial. www.cempre.net

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