Internacionalização valoriza marca e é forma de avançar

por Raquel Rezende (raquel@empreendedor.com.br)

Empreender fora do Brasil é um cami­nho escolhido por muitas franquias. Segun­do dados da Associação Brasileira de Fran­chising (ABF), 4,8% das redes brasileiras – o que corresponde a 121 marcas – possuiam unidades no exterior em 2013. Para algumas delas, esse caminho acontece por conta da expansão natural dos negócios, para outras é mais proposital. Contudo, independente do processo de internacionalização vivido, as marcas devem ter em mente que a franquia terá que começar um novo empreendimen­to fora do Brasil e isso exige outro plano de negócios, pesquisas de mercado e estudos sobre hábitos e costumes do país escolhido para implantar a franquia.

O diretor da consultoria Vecchi Ancona Inteligência Estratégica, Paulo Ancona Lo­pez, observa que existe um interesse grande das franquias brasileiras em expandir para o exterior e, segundo ele, isso ocorre num primeiro momento muito mais pela valoriza­ção da marca que pode despertar interesse de futuros empreendedores na franquia no Brasil, do que pelos resultados financeiros mais imediatos. Lopez afirma que, de forma geral, as franquias que foram ao exterior real­mente com condições para isso, são aquelas que já se mostravam bastante fortes e pro­fissionalizadas no mercado brasileiro. “Essas marcas foram normalmente com escritórios próprios ou suportados por um máster fran­queado local com o intuito de realmente fincar o pé em outros mercados”, comenta.

Algumas marcas, entretanto, analisa Lopez, aventuraram-se em busca de maior nome, mesmo sem possuir a estrutura e formatação necessária para operar no Brasil. E com os problemas econômicos de muitos países nesses últimos anos, inclusive países que apresentavam economia forte, muitas empresas redirecionaram seus focos no ex­terior.

Para evitar o risco de investir em um processo de internacionalização que acabará mal sucedido, Lopez chama a atenção para o fato de que, em primeiro lugar, é preciso que a marca esteja muito bem estruturada e formatada no Brasil, com know how não só referente aos produtos e serviços, mas tam­bém sobre o seu papel como franqueadora em relação ao suporte que deve prestar aos franqueados. “Além disso, é preciso enten­der a expansão para outro país como sendo um novo negócio, uma vez que se trata de um outro mercado, outros concorrentes, outros costumes e outra legislação”, alerta.

Foto: “A internacionalização da marca aconteceu de forma natural, pois encontramos a parceira ideal”, analisa Danyelle Van Straten, da Depyl Action

O presidente da Associação Brasileira de Franchising do Rio de Janeiro (ABF Rio), Beto Filho, analisa que o processo das mar­cas se organizarem para buscar novos mer­cados é uma forma natural de avançar nos negócios. Ele destaca que o Brasil é o tercei­ro lugar no mundo em quantidade de fran­quias e as marcas brasileiras estão presentes em mais de 70 países. “O Brasil começa a mostrar sua potencialidade empreendedora no exterior”, avalia.

O sucesso da internacio­nalização, na opinião do presidente da ABF Rio – que também é presidente do grupo Astral, franquias com atuação no mercado de controle de pragas e vetores urbanos presente em quase 20 estados brasileiros e também em Portugal – está ligado ao fato da marca ter uma estrutura forte no país de origem para apresentar a potencialidade de expandir para outros países. “Não só inves­timento é necessário. É preciso realizar es­ tudos e pesquisas com o propósito de fazer adaptações nas características mercadológi­cas e, ainda, gerenciar tudo isso.

Nos EUA, por exemplo, é necessário ter uma empresa organizada funcionando por pelo menos seis meses antes de efetivar a internaciona­lização”, comenta Beto Filho. Ele acrescenta ainda que para atuar na Europa, é exigido o registro e patente da marca na comunidade europeia para não correr o risco de ter o nome da rede roubado.

Agora quando a marca está elaborada e já tem uma gestão consolidada com 20 anos de frachising no Brasil, Beto afirma que a tendência natural é crescer. “A marca O Boticário, com 4 mil lojas no País, não tem mais espaço para crescer, então é natural que busque outros mercados fora do Brasil. Não existe negócio que para, se parar, acaba ou outra empresa passa na sua frente”, enfa­tiza. Porém, ele alerta que realmente é uma empreitada diferente. “Deve-se estar prepa­rado para entrar na cultura de outros países e estudar a abrangência de seus costumes e conceitos para entender seu novo cliente.”

Para o presidente da ABF Rio, o mo­mento é oportuno para expandir, pois os EUA apresentam um nível de recuperação grande e a Europa também demonstra que está saindo da crise. Na visão dele, a interna­cionalização terá a tendência de se fortificar nos próximos anos. “O movimento de inter­nacionalização se iguala a outro movimento que estamos promovendo há um tempo para acordar o mercado do interior do País com o franchising”, considera. Ele acres­centa que está acontecendo uma reforma do varejo brasileiro através do franchising. “Quando chega uma marca no interior do Norte e Nordeste do Brasil, a presença da marca gera um choque que impacta positi­vamente o varejo nas cidades”, diz. E, para ele, essa evolução das marcas vai contribuir para o amadurecimento delas e consequen­te expansão no exterior.

Com experiência de oito anos atuando fora do Brasil, a marca Ornare – especializa­da em criar produtos únicos e sofisticados, por meio de parcerias com arquitetos e designers – tem dois showrooms nos EUA, um em Miami e outro em Dallas e planeja expandir. Entretanto, o CEO da Ornare, Mu­rillo Schattan, conta que o começo da loja no exterior não foi fácil. Ele relembra que a Ornare começou em Miami, pois parecia um lugar mais confortável para começar um ne­gócio fora do Brasil. Mas depois de um ano da loja aberta, aconteceu a crise internacio­nal da construção civil e a empresa passou por três anos de crise. “Depois dos tombos da primeira loja e do início bem difícil, con­seguimos vencer várias barreiras, como en­tender melhor o país e os costumes e depois começou a melhorar”, relata. Pela experiên­cia vivida, Schattan observa também que, no Brasil, ainda existem muitas barreiras cultu­rais fortes para abrir empresas fora do País e não existe uma política governamental que ajude as empresas a expandir para o exterior.

Apesar disso, Schattan explica que a empresa trabalha com três planos de expan­são para atingir os mercados do Brasil, EUA e América Latina e aconselha que antes de internacionalizar é muito importante fazer pesquisa de mercado para ver se o produto é viável em relação a vários itens, entre eles, desing, qualidade e preço. O CEO da Ornare fala também que a marca deve ter excelen­te estrutura de imagem com site e mídias sociais bem coordenados. “Deve-se ter em mente que é preciso ter qualidade e diferen­ciais, pois a marca vai disputar espaço a nível internacional”, destaca Schattan.

Foto: O americano ainda é reticente em conhecer novas marcas, além disso a concorrência é acirrada, com ofertas e preços competitivos”, diz Rodrigo Perri, da Vivenda do Camarão

Inserida em um mercado que apresenta alta demanda, a rede Depyl Action, especia­lizada em depilação, internacionalizou-se de uma maneira diferente. Em vez de traçar um plano de expansão internacional e escolher o país para empreender, foi escolhida por uma empreendedora brasileira que quis le­var a marca para a Venezuela. A proprietária da Depyl Action, que também é diretora da Associação Brasileira de Franchising de Mi­nas Gerais (ABF Minas), Danyelle Van Stra­ten, relata que a franqueada na Venezuela é gaúcha, casada com um mineiro e foi morar em Boa Vista (RR). Lá, pela proximidade com o país vizinho levou o negócio para a Venezuela. “A internacionalização aconteceu de forma natural, pois encontramos a parcei­ra ideal”, analisa Danyelle.

Mesmo assim, a rede mapeou o país e fez pesquisa de mercado para entrar com a marca na Venezuela. “Descobrimos que nos­sos serviços tinham demanda lá. Pois, prati­camente, não existia esse mercado. Além dis­so, a depilação brasileira é famosa no mundo inteiro e já é chancela de qualidade”, afirma Danyelle. Porém, as adversidades para o ne­gócio funcionar bem ocorreram em outras questões, como no processo de legalização e exportação dos produtos, que foi lento.

Outra marca que começou a atuar fora do País há pouco tempo com a primeira abertura de uma loja nos EUA, em novembro de 2013, é a Vivenda do Camarão, rede espe­cializada em frutos do mar. A franquia, que acaba de inaugurar a segunda loja em Miami, pretende terminar o ano de 2014 com oito restaurantes no país. E, para o próximo ano, o plano é conquistar 25 unidades em funcio­namento.

O investimento nas duas primeiras unidades foi de US$ 1,5 milhão e estas, jun­tas, devem atender cerca de 20 mil pessoas soas por mês. Rodrigo Perri, sócio-diretor da Vivenda do Camarão, revela que a ideia de internacionalizar a marca surgiu há muitos anos. Em busca de concretizá-la, participou de diversas feiras de franquias internacio­nais no México, Espanha, Portugal e Estados Unidos para conhecer as particularidades de mercado de cada país e suas demandas.

Conforme Perri, antes de iniciar a inter­nacionalização, a Vivenda do Camarão inves­tiu na qualidade do produtos. Apenas com uma indústria moderna, com equipamentos e processos que garantissem o maior padrão de qualidade possível aos produtos, a em­presa poderia pleitear as certificações inter­nacionais necessárias para atuar fora do Bra­sil. “Felizmente, as certificações mais rígidas foram concedidas à Vivenda do Camarão, como a do FDA Americano (Food and Drug Administration) e a Carta de Bruxelas para a Comunidade Econômica Europeia”, conta Perri. Com esta etapa concluída, a marca co­meçou a realizar pesquisas e levantamentos necessários para minimizar os riscos e otimi­zar o resultado, buscando entender os costu­mes dos clientes de cada localidade.

Perri esclarece que todo esse cuidado é extremamente necessário e que o começo é complicado, principalmente por ser uma marca ainda desconhecida no mercado ame­ricano. “O americano ainda é um pouco reti­cente em conhecer novas marcas, novos pro­dutos que fujam do day by day deles. Além disso, a concorrência é acirrada, com uma variedade de ofertas e preços extremamente competitivos”, avalia. Por isso mesmo que a franquia resolveu escolher a região da Flóri­da, onde tem muitos brasileiros e latinos fre­quentando os shoppings. “Somos muito mais abertos para conhecer novidades”, opina

Na visão do sócio diretor da Vivenda do Camarão, antes da crise americana era muito difícil encontrar espaço para entrar nos EUA. De acordo com ele, os shoppin­gs não tinham espaço disponível, estavam com ocupação máxima e, exatamente por isso, os preços também estavam altíssimos. Com a crise americana, o cenário mudou muito. Para ocupar espaços, os empreen­dedores americanos abriram as portas para novas redes e os preços baixaram. Diante disso, Perri conta que foi possível viabilizar uma parceria com o maior grupo de shop­ping centers dos Estados Unidos, conquis­tando um contrato de oito lojas até o início do próximo ano.

Na contramão da boa fase americana, Perri considera que o mercado brasileiro mostra sinais de retração, apon­tando a diminuição do ritmo de crescimen­to mantido nos últimos anos pela Vivenda do Camarão. “Já o mercado americano está permitindo que o ritmo de expansão da Vivenda do Camarão seja forte”, enfa­tiza. Embora o otimismo esteja mais alto para expandir, Perri aconselha, para quem pensa em se internacionalizar, a buscar um bom parceiro local que tenha todo o conhecimento necessário sobre o merca­do regional, fazer pesquisas de mercado sobre o público a ser atingido, entender o geomarketing e estudar o comportamento do consumidor daquele país.

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