Um novo empreendedorismo exige uma nova cultura

por Joel Fernandes

A força da trajetória de cada cultura e de cada um dentro da cultura induz as pessoas a fazerem sempre as mesmas ações com base nas mesmas crenças. O empreendedorismo praticado no Brasil confirma este conceito, pois repete há mais de 40 anos um empreendedorismo velho e ultrapassado que não leva as empresas à prosperidade contínua até o limite da riqueza. Isso não é de se admirar, pois faz parte de nossa cultura o encantamento da pobreza e a repugnância da riqueza.

Impotência cultural adquirida

Vejamos alguns exemplos óbvios. Nas novelas das televisões brasileiras a lavagem cerebral em favor da fé na pobreza é absolutamente colossal. Não tem comparação com a mais fervorosa das religiões que apregoa o inferno para os ricos. Entra novela, sai novela e o enredo é monotonamente martelado na cabeça de milhões de brasileiros que as assistem.

É sempre assim, invariavelmente: as pessoas pobres são calorosas, solidárias, de bom caráter e totalmente felizes. Os ricos são ricos, mas infelizes. Também são ricos, não por virtudes empreendedoras, mas devido, claro, às falcatruas.

E o incrível disso e que dá mais poder à lavagem cerebral em favor da fé na pobreza é que isso é colocado não na forma de um discurso explícito, o qual carece de convencimento. Mas é apresentado de maneira implícita, ingênua, como se aquilo já fizesse parte da natureza humana, desde que existiu o primeiro homem.

O senso comum, ao ler isso, deve estar se perguntando: mas não é assim?

Outro exemplo óbvio. Manchete de jornal de TV nacional informa: pobre que achou mala cheia de dinheiro em banheiro de aeroporto devolve intacta ao seu dono. Esta tela de TV é o complemento perfeito do quadro anterior e também de todos os demais exemplos possíveis. É o apogeu de toda a convicção nacional. “Somos sim um país de muitos pobres e graças a Deus todos honestos.” Esse minúsculo ato, honesto, claro, transformado numa gigantesca cena de TV, revelou à nação o que todo mundo já sabia: pobre é gente solidária, calorosa, feliz e acima de tudo honesta. Quanto aos ricos… já não se pode dizer a mesma coisa! Após séculos de lavagem cerebral, vem à tona, vivazmente, ao Brasil da superfície, a consagração da suprema fé do Brasil das profundezas: pobre vai para o céu!

O empreendedorismo atualmente praticado no Brasil é ultrapassado, pois não leva em conta este pano de fundo do brasileiro que ao longo da vida sempre foi exposto ao encantamento da pobreza e à repugnância da riqueza e que por força dessa inércia cultural cria uma impotência colossal que o impede de pensar grande e querer prosperar continuamente até se tornar rico. Ainda hoje a palavra lucro no Brasil é sinônimo de palavrão.

Essa impotência revela que a pessoa, mesmo tendo manifestado a esperança de se tornar rica, não tem a liberdade necessária para mudar o curso próprio de sua história. Ou, antes disso, mostra que ela se permitiu ser mudada e arrastada pela história do “outro”. A impotência ante o outro e o mundo reduz a possibilidade do uso da liberdade para se realizar e a ausência do uso da liberdade propicia o advento da impotência adquirida. Cria-se aqui um círculo vicioso que o empreendedorismo atual perpetua.

O Novo Empreendedorismo supera essa condição com a filosofia de que a liberdade se conquista quando temos a intenção de sermos livres e ela se manifesta em nossas ações por meio da lembrança, da intuição espontânea e da intenção.

Vamos ilustrar o que estamos afirmando, didaticamente, num contexto bem familiar dos brasileiros: o futebol.

1. Lembrança

Para uma pessoa acumular, por exemplo, sua pequena primeira fortuna tem que se lembrar disso. Contudo, esse ato não está ligado ao intelecto e sim a uma outra coisa. Ela tem que se lembrar feito um craque de futebol como os ‘Ronaldos’, Zico, Pelé e Rivelino ‘lembravam-se’ de jogar bola, treinando de manhã, de tarde e de noite e ainda por cima ‘lembravam-se’ de com ela dormir. Este “lembrar-se” é fruto do “hábito espontâneo” de jogar bola, e o “hábito” é reforçado pela excitação da “lembrança”. Cria-se aqui um círculo virtuoso.

2. Intuições espontâneas

Para acumular dinheiro a pessoa precisa ter as seguintes intuições próprias de um espírito investidor: acumular, especular, arriscar e investir. A facilidade e habilidade naturais para lidar com essas características fazem a pessoa ‘lembrar-se espontaneamente’ de usá-las, praticá-las e treiná-las, com dinheiro, como o craque de futebol ‘lembra-se’ de jogar bola. “Lembra-se” porque tem “intuição espontânea” para tal, a qual é acolhida e correspondida pelo ato de “lembrar-se”. Cria-se aqui, igualmente, um círculo virtuoso.

3. Intenção

Entretanto, a pessoa precisa antes ter a intenção de ganhar dinheiro. Essa intencionalidade também não está ligada ao intelecto. Ela provém de um encantamento. Que cria uma necessidade. A mesma necessidade imperiosa que o craque tem de se expressar no campo de futebol. Ele jogaria bola mesmo que para isso não ganhasse um único centavo. E continuará jogando mesmo depois do encerramento de sua carreira profissional. O encantamento excita a intencionalidade, e a intencionalidade se deixa seduzir pelo encantamento. Cria-se o círculo virtuoso da “intenção espontânea” a qual necessita realizar-se.

A combinação desses três elementos cria na pessoa uma ‘potência espontânea’ que se transforma em atos que vão na direção do propósito intencionado: tornar-se próspera continuamente. O craque “lembra-se” de jogar bola porque gosta de jogar, tem habilidade para tal, um corpo físico adequado e um conjunto singular de intuições que, tudo somado, lhe deu um “estilo próprio de ser”. Ter sido fiel a esse estilo, a esse “curso próprio”, proporcionou-lhe uma trajetória que o conduziu à situação de craque.

A liberdade de se permitir ser fiel a si propicia a manifestação dos movimentos livres e espontâneos da intencionalidade primordial, o que faz aumentar a possibilidade de nossas realizações no mundo. Isso, por sua vez, gera uma “potência espontânea” que “lembra” a possibilidade do uso da liberdade. Fecha-se aqui o círculo virtuoso.

O Novo Empreendedorismo, como temos defendido nesta coluna, exige uma nova cultura com ideias diferentes e novos instrumentos como o Método do Presidente. Apregoamos abertamente a ideia de que ficar rico é bom e afirmamos com todas as letras que a única responsabilidade de um empresário por conta própria, da qual derivam todas as outras, é saber montar e manter uma operação lucrativa e o seu mantra é, ou deveria ser: eu quero ser um empresário rico e feliz.

Joel Fernandes é autor, entre outros, do livro “Os segredos do Método do Presidente” e do site www.metododopresidente.com.br

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