A letalidade do vírus da desarticulação

 

Desde quando começou a circular, no final de dezembro, na cidade de Wuhan, na China, o novo Coronavírus não contava com aliados tão fortes para ampliar o seu alcance e a sua mortalidade em diferentes países: a desarticulação dos principais governantes com a sociedade como um todo.

Onde nasceu, na China, o Coronavírus não contou com o apoio do governo chinês. Neste país, a previsão era que a sua propagação seria muito rápida pelo expressivo número da população. Mas ocorreu o contrário. Com articulação e entendimento, o país passou a fazer teste em massa e aplicou um isolamento total na cidade que foi o epicentro da pandemia mundial. Chegou a proeza de em apenas 10 dias construir um hospital, numa área de 25 mil metros e disponibilizou 1 mil leitos. Desde meados de abril, a China não registra mais nenhum óbito pelo Coronavírus e em todo o ciclo da pandemia não ultrapassou a barreira trágica de 5 mil mortes.

Pelo menos três países, ao perceberam os primeiros sinais da pandemia na China, articularam-se para enfrentar o Coronavírus. Foi o caso de Portugal, Chile e Nova Zelândia. Nesses países, com articulação nacional, logo deram início ao isolamento social, com a liberação somente de serviços essenciais, realizaram testes em massa e ampliaram o número de leitos para receber enfermos. Hoje esses três países programam o retorno à normalidade das atividades econômicas, embora ainda por etapas. Ao contrário, os Estados Unidos, a Espanha e a Itália, cujas populações não foram convencidas e não levaram a sério as restrições, até hoje registram números elevados de mortes.

O Brasil se alinhou ao Coronavírus desde o início. O próprio presidente da República considerou-o apenas uma “gripezinha”. Hoje o país, ainda numa curva crescente de contágio, já registra mais de 10 mil mortes e neste final de semana bateu o dobro de óbitos registrados em toda  a imensa China.

O vírus da desarticulação se propaga por todo o Brasil. O presidente desde o início briga com os principais governadores, o do Rio de Janeiro e o de São Paulo, e com os do Nordeste, justamente as áreas mais afetadas e que registram números devastadores de mortes, pela falta de leitos, equipamentos e até de falta de espaços e caixões para enterrarem os mortos.

O vírus da desarticulação também atingiu os políticos, entrincheirados no Senado e na Câmera dos Deputados. Na última semana, esse mesmo vírus bateu também na porta do STF (Supremo Tribunal Federal) quando o presidente e uma legião de homens de ternos escuros invadiram a repartição pública, que tem de ser independente do presidente da República, num verdadeiro coroamento do vírus da desarticulação.

Sem liderança no momento, o combate ao vírus “coronadesarticulação”, fica a cada dia mais difícil. Só uma vacina ou um medicamento capaz de criar uma coordenação central do país, que passe por todos os governadores e chegue em cada prefeito, será capaz de frear o número de mortes no Brasil. No final, é cada prefeito que sabe como está a sua cidade, em todos os sentidos, inclusive sobre a pandemia. É ele que tem de determinar, seguindo a orientação do seu governador e do presidente da república, se fecha toda a cidade, se abre em partes ou libera todas as atividades econômicas. O prefeito pode fazer avanços e retornar ao ponto inicial, se achar necessário.

Até o início desse ano, a queda de um Boeing, com capacidade de 396 passageiros, chocava o mundo inteiro. Só no Brasil, neste mês, está caindo dois Boeing, por dia. Isso não choca mais ninguém?

Será que temos de contar apenas que Deus é brasileiro, que vai nos estender uma mão divina, ou seria muito pedir uma articulação nacional para frear uma avalanche de mortes por todo o país?

EM TEMPO: Neste final de semana, o presidente Jair Bolsonaro prometeu, pela televisão, de viva voz, realizar um churrasco para 150 ou mais pessoas. Depois disse que era brincadeira, uma fake. Aproveitou o sábado, que registrou mais de 10 mil mortes pelo Coronavírus, para passear de moto aquática pelo Lago Paranoá, em Brasília. Alguém precisa internar esse paciente. O vice-presidente precisa com urgência assumir uma articulação nacional para enfrentar com mais seriedade essa pandemia e conter uma avalanche ainda maior de mortes por todo o país.

Acari Amorim é editor do portal, da revista e da TV Empreendedor.

 

 

 

 

 

 

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