O conhecido e propagado provérbio português – Ele cavou a própria sepultura – na sua origem era destinado para apontar o marido que traía a sua mulher. Tanto traía que depois, na rua da amargura, na desgraça, abandonado, se dizia que “Ele cavou a própria sepultura”.
Nesses últimos anos da pandemia e do governo Bolsonaro, se alguém traía, não uma mulher, mas o resto de inteligência que ainda detinha, a sua própria consciência e o mínimo do bom senso, era o astrólogo, escritor e autointitulado filósofo Olavo de Carvalho. Se traiu alguma mulher não importa. Mas casou três vezes e teve 8 filhos.
Ponto de referência e guizo do próprio presidente Jair Bolsonaro e de uma legião que chegou a ser de fiéis seguidores, Olavo de Carvalho falou e escreveu frases como essa que mostrava bem o seu desatino com a pandemia em curso. “O medo de um suposto vírus mortífero não passa de uma historinha de terror para acovardar a população e fazê-la aceitar a escravidão como um presente de Papai Noel”.
Olavo de Carvalho morreu no dia 24 de janeiro, aos 75 anos, no estado da Virgínia, nos Estados Unidos. Segundo a filha Heloisa Carvalho ele morreu de Covid. A causa da sua morte, no entanto, ainda é um mistério.
O guru morreu mas a sua inócua e superada ideologia será mantida por ferrenhos seguidores que não vão deixar desaparecer o seu legado, embora seja um legado que não faça o mínimo sentido nos dias atuais. Tanto não faz sentido, como mais essa frase dele ao se referir ao então seu amigo Jair Bolsonaro. “Como administrador público, Bolsonaro é o mais honesto e eficiente que já tivemos. Como estadista, na luta contra o comunismo, é um fracasso vivo, rodeado de conselheiros ignorantes”.
Ao tirar do armário o fantasma do comunismo deu vida a um inimigo comum para a sua legião de fanáticos, que por muitos anos até acreditaram que o comunista era capaz de “comer criancinhas”.
Se pode hoje classificar a China e a Rússia como países comunistas? Todos querem gerar riquezas de preferência pela iniciativa privada. A questão é saber como essa riqueza será distribuída, se para pequenos grupos apaniguados ou é para toda a população. Essa riqueza será mesmo destinada para promover a inclusão social, a educação, saúde, segurança para toda a população? Ai que entra as três poderes ( Lelislativo, Judiciário e Executivo), além da impressa livre e atuante, para vigiar a aplicação correta de todos os recursos que no fundo é gerado pela própria população.
Então, qual a explicação, a compreensão de se pregar uma ideologia para assustar e de criar o medo do comunismo? Um comunismo que já está morto, enterrado e coberto pelas cinzas do Muro de Berlim.
Qual a explicação e compreensão de não se dar trégua na negação de uma pandemia, de vacinas e da própria ciência? Incompreensível é no Brasil. Aqui mais de 80% da população já aderiu a vacina e completou todo o ciclo de prevenção.
A única explicação é que o presidente Jair Bolsonaro, que deveria ser o principal artífice de uma negociação para evitar mais de 625 mil mortes de brasileiros e apressar a retomada da economia com a compra de vacina na época e na quantidade certa, não quer mais ser presidente da República. Ele se contenta em voltar a ser o obscuro deputado federal ou senador. Basta ele ter a vacina da imunidade política.
Ao morrer, abandonado e olhado de soslaio pelo próprio Bolsonaro, seus filhos e pela grande legião de seguidores que garantiram a eleição de Bolsonaro para presidente da República, pelo menos teve de consolação um dia de luto oficial decretado pelo próprio presidente. Uma deferência que não tiveram ao morrer os músicos João Gilberto e Elza Soares que deixam para sempre um legado nos corações de milhares de brasileiros.
Que Olavo Carvalho tenha o descanso que todo ser vivo merece. Na lápide da sua sepultura poderá ser gravada a frase com referência ao provérbio português: “aqui jaz quem cavou a própria sepultura”.