Dicas de especialista em startup para captar investimentos

Co-fundador e presidente da Sami, healthtech que opera planos de saúde, Vitor Asseituno é médico formado pela UNIFESP e com MBA em finanças pela FGV. Criou sua primeira empresa no setor de feiras de negócios (Live Healthcare) e vendeu em 2018 para o grupo Informa, líder de mercado global com capital aberto na Bolsa de Valores de Londres.
Por venderem planos de saúde a empresários, ele e os sócios estão em contato direto com milhares de empreendedores diariamente. Em consequência disso, conhecem e compreendem mais a fundo as necessidades e preocupações deles, não só as relacionadas a médicos e hospitais, mas também quanto a estratégias que possam impulsionar o crescimento de seus negócios. Um dos temas que é dúvida recorrente nessas interações é o de investimentos.
Como captaram o maior aporte série A de uma startup de saúde no Brasil e na América Latina até o momento – e um dos principais investimentos de 2020 de todos os setores -, muitas pessoas pedem dicas sobre esse universo.
Confira nesta entrevista os tópicos mais importantes para captar investimentos:
• Experiência – O fato de meu sócio e eu termos experiência empreendendo foi crucial para conseguirmos investimento. A primeira venda, o primeiro funcionário, a primeira dívida, a primeira demissão, negociação com fornecedor, a décima, a vigésima e a centésima vez neste ciclo, na prática, trazem um conhecimento que quem fica só na teoria não vivencia. E os melhores fundos percebem isso. Por tal motivo, é tão comum vermos empreendedores que já quebraram levantando capital dos melhores fundos. É na dor que o aprendizado se fixa mais em nossa memória.

• Conhecimento e credibilidade – Procuramos desde o começo nos cercar de pessoas melhores que nós em diferentes áreas. Logo no começo, trouxemos um dos principais executivos de planos de saúde no Brasil, como sócio e conselheiro. A vinda dele, quase junto com o nosso seed ajudou a dar mais credibilidade e confiança para o que estávamos construindo. Quando começamos a perceber e receber feedback dos fundos de que precisaríamos conhecer mais de tecnologia, fomos atrás de pessoas para nos ajudarem e conseguimos trazer o Paulo Veras, fundador da 99, primeiro unicórnio de tecnologia do Brasil, e o Alan Warren, ex-CTO da Oscar Health, e ex-Vice-Presidente do Google que liderou o time que criou o Google Drive, Google Sheets etc. E assim fizemos muitas e muitas vezes na Sami. Toda vez que percebemos que não temos – ou aparentamos não ter – um conhecimento ou credibilidade necessários para uma tarefa ou para a próxima etapa da companhia, buscamos como construir isso.
• Relacionamento – Acreditamos muito que é necessário uma vila para construir uma empresa – “it takes a village to build a company” -, para alavancar um projeto ou para vencer um grande desafio, e essa vila pode investir, ensinar, apresentar pessoas, ajudar em problemas, dar ideias ou, simplesmente torcer por aquela companhia. Se aliar a pessoas – do seu time, clientes, imprensa, amigos e pessoas que possam te levar a investidores – é crucial para viabilizar seus próximos passos rumo ao crescimento. Há uma frase do fundo Andreessen Horowitz à qual me apego que diz: “a maioria das startups falha porque ninguém se importa”. Quanto mais gente você tiver que se importa com o que você está fazendo, mais chances você tem. Na prática, o empreendedor tem que estar sempre trazendo coisas novas para o negócio – idéias, pessoas, clientes. Se durante seis meses de relacionamento com um empreendedor, nada mudou, provavelmente esse investidor não vai escolher essa empresa.

• Pipeline, Processo e Materiais – A experiência me mostrou que três coisas fundamentais para uma empresa dar certo: Vendas, Contratações e Investimento, obedecem a mesma regra, Pipeline – ou quantidade. É simples e a comprovação é estatística. Se eu falar com 10 pessoas interessadas no meu produto, a chance de fechar um pelo menos é de talvez de 10%. Se eu falar com 50 pessoas, a chance de eu fechar com 1 pelo menos é muito maior, talvez de 50% (considerando que 1 em cada 10 pessoas possa comprar). É como jogar uma roleta várias vezes até ganhar pelo menos uma única vez (quem joga uma vez só tem menos chances de ganhar). A mesma regra vale para investidores. E ao considerarmos essa quantidade de fundos, o processo de acompanhamento de reuniões, e-mails, documentos etc é extremamente importante, principalmente quando se trata de relacionamento com 40 – 100 ou 200 – empresas/investidores durante seis meses. É muito fácil se perder entre tantas mensagens e ainda tocar o dia-a-dia da empresa. Montar materiais talvez seja a parte mais trabalhosa e estratégica. Para o seed utilizamos uma apresentação de 36 slides e uma planilha financeira. No série A, usamos uma apresentação de 46 slides e uma planilha financeira que chegou até a versão 36 depois de tantos feedbacks/ajustes. Nossa apresentação atual tem 27 slides. Talvez o aprendizado mais importante aqui é “ser ousado na medida” e ser confiável nas premissas. Passamos muito tempo estudando mercado, discutindo com pessoas sobre preço, vendas, custos, como essas coisas evoluem quando a empresa cresce etc, então quando alguém questiona nossas projeções de crescimento ou custo, temos bastante argumentação, mesmo que não tenhamos qualquer certeza ou garantia daquele resultado acontecer.

• Propósito – É inegável que uma das maiores razões de termos levantado uma rodada de investimento recorde como essa foi o tamanho do nosso sonho. Competir com os maiores planos de saúde do país, que existem há décadas, tem bilhões em faturamento, dezenas de milhares de funcionários e milhões de clientes, não é um objetivo pequeno nem consumiria pouco dinheiro. Ao mesmo tempo, o fato dos mesmos planos de saúde darem reajustes de 20% ao ano para seus clientes todos os anos (o aumento médio foi de 158% entre 2013 e 2018), mostrou para os fundos que o tamanho do problema a ser resolvido era enorme e crescente. Para as pequenas empresas, que não tem voz ou poder de negociação com os planos de saúde, mais ainda. Assim, o capital nos permitiu trazer o melhor time que pudemos encontrar, garantir hospitais, médicos e laboratórios de excelência para nossos clientes, e ainda ter milhões de reais guardados (reserva técnica que é uma obrigação regulatória) para se qualquer dos nossos clientes ficasse doente conseguíssemos cobrir o custo com tranquilidade. Além disso, nos tornarmos uma empresa que oferece as melhores tecnologias para garantir a saúde de qualidade a um custo baixo para seus clientes.
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