Empresas têm à disposição várias opções para otimizar o uso das fontes de energia

por Mônica Pupo

Motivo de preocupação em todo o mundo, temas como aquecimento global e mudanças climáticas exigem atitudes urgentes por parte das empresas. E não é por menos: segundo dados da Organização das Nações Unidas (ONU), quase 90% da energia consumida no mundo ainda é proveniente de fontes fósseis e não-renováveis, o que gera altas emissões de dióxido de carbono (CO2), um dos maiores responsáveis pelo temido efeito estufa. Para lidar com esta questão é fundamental investir na gestão energética com o objetivo de minimizar os impactos ambientais e, de quebra, diminuir os custos organizacionais. Tendo à disposição uma ampla gama de produtos, serviços e tecnologias que permitem otimizar o uso das fontes de energia, empresas de todos os tamanhos e segmentos podem – e devem – incluir a eficiência energética em seus planos de negócio.

Pousada Praia do Portinho, em Ilhabela (SP), espera reduzir em 30% o consumo de energia elétrica com a adesão ao PPH

Cada vez mais relevante, a gestão energética já possui normas técnicas estabelecidas pela ISO 50001. Lançada em 2011, ela estabelece um sistema para a gestão energética que pode ser usado por plantas industriais, instalações comerciais ou mesmo para empresas inteiras. Criada com base em elementos comuns encontrados em outras ISO, como a 9001 ou a 14001, a norma objetiva uma ampla aplicação para organizações de qualquer segmento, com a expectativa de influenciar diretamente mais de 60% de toda a energia em uso no mundo. “Podemos dizer que estamos seguindo um caminho sem volta e o futuro será das energias renováveis (eólica, solar, cinética), além do crescimento de novas tecnologias como iluminação a LED, veículos híbridos e unidades habitacionais sustentáveis”, reflete Guilherme de Oliveira Camargo, consultor e coordenador do Núcleo de Eficiência Energética do Senai/SC.

De olho nessa tendência, as grandes empresas brasileiras não poupam investimentos na área. É o caso da Tigre, multinacional especializada na fabricação de tubos e conexões, que decidiu aplicar R$ 5,9 milhões num projeto que visa reduzir o consumo de energia elétrica da unidade fabril instalada em Joinville (SC). A intenção é economizar pelo menos 5 mil MWh ao ano, o equivalente a 10,54% do consumo anual, além de melhorar a performance da produção como um todo. “A partir de agora daremos continuidade e até fortaleceremos nossos programas de redução de consumo de energia, já iniciados em 2011. Com esse projeto, uma das metas é diminuir a demanda em cerca de 600 kW no horário de pico do uso da energia”, afirma Rogério Kohntopp, diretor corporativo de Tecnologia e Qualidade da Tigre.

Na prática, o projeto consiste na substituição de quatro equipamentos de grande porte, além de outras 80 máquinas que passarão por alterações tecnológicas. A empresa também se comprometeu a encaminhar todas as peças desativadas para reciclagem. “Essas mudanças não vão interferir no volume de entrega do processo de produção. Transformamos cerca de 50 mil toneladas/ano nessa unidade e, com essa renovação, conseguiremos diminuir nossos custos e aumentar a competitividade”, completa Kohntopp.

Laboratório Médico Santa Luzia, de Florianópolis, reduziu o consumo de energia em 10%

Esta não foi a primeira atitude da Tigre em relação à eficiência energética projeto envolvendo a alteração do sistema de resfriamento do processo produtivo de injeção. A ocasião também permitiu a instalação de torres de resfriamento secas no lugar de antigos chillers, diminuindo também o consumo de água. A economia anual dimensionada é de 1,5 milhão de quilowatts e 38.880 metros cúbicos de água.

Estimulada pelos bons resultados, no ano passado a companhia estabeleceu um plano geral de renovação tecnológica com a meta de reduzir o consumo de energia em suas plantas no Brasil. Um dos projetos foi desenvolvido em parceria com a WEG, fabricante de equipamentos eletroeletrônicos, para substituir 318 motores convencionais pelos de alto rendimento (W22 Premium). Com isso, a empresa reduziu em média 5,8% do consumo de energia em cada máquina modificada. Esse trabalho foi concluído em 2013, com a expectativa de economizar aproximadamente R$ 450 mil por ano.

O projeto da companhia foi aprovado e financiado pela Celesc (Centrais Elétricas de Santa Catarina), que no final de 2012 lançou a ação “Indústria + Eficiente”. A ideia é incentivar a melhoria da eficiência energética na indústria catarinense, que responde por 42,5% de toda a energia consumida no Estado. Além da Tigre, foram contempladas iniciativas propostas pela Sadia, Concórdia e Tupy, totalizando R$ 20 milhões em financiamento. A verba será repassada para as empresas mediante a apresentação de notas, execução das obras e fiscalização. A recuperação do investimento será parcelada, com número de parcelas limitado ao valor da economia verificada, que deverá ser atestada através de processos de medição e verificação ao final das mudanças.

Mas as indústrias não são o único alvo dos programas de incentivo à eficiência energética. O setor de serviços também está na mira. Um exemplo é o Programa Pró-Hotéis (PPH), lançado em 2012 para promover a redução dos custos com energia em estabelecimentos de hospedagem. Mantido pela empresa de consultoria Energia Eficiente, com apoio do Banco Mundial, Desenvolve São Paulo e de entidades do setor, incluindo a Federação Brasileira de Hospedagem e Alimentação e a Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (Abih), o PPH oferece aos empreendimentos uma avaliação completa do consumo de água e energia, apontando o potencial de redução e os meios para implantar as soluções propostas.

Estima-se que, atualmente, a energia responda por algo entre 15% e 35% dos custos de um hotel, exigindo que os hoteleiros trabalhem de 35 a 80 dias por ano apenas para bancar as contas de água e luz. Segunda maior despesa dos empresários da área – atrás apenas dos salários –, a conta de luz pode comprometer o desempenho dos hotéis se não for mantida sob controle.

Entre os mais de 100 meios de hospedagem que já aderiram ao PPH está a Pousada Praia do Portinho, localizada em Ilhabela, no litoral norte de São Paulo. Inaugurada há três anos, a pousada já havia incluído alguns modernos conceitos de economia de energia em suas instalações, tais como fiação de qualidade, aquecimento solar e tratamento de esgoto. “Mesmo assim, sentíamos que a conta de energia elétrica era alta demais, pois ainda havia perda”, conta Leopoldo Pedalini Neto, proprietário da pousada.

Após a visita técnica, a equipe de consultoria elaborou um diagnóstico energético da pousada, mostrando alguns aspectos que precisam ser modificados. O primeiro deles foi com relação ao restaurante. Inicialmente projetado para atender somente hóspedes, o espaço expandiu para receber o público em geral, o que exigiu a colocação de mais freezers – que, atualmente, somam oito máquinas ligadas em tempo integral. “A sugestão foi criar uma câmara fria de congelados”, explica o proprietário.

Outro problema considerado grave pelo empresário estava no consumo de energia elétrica nos 20 apartamentos. Buscando economizar energia, foi instalado um sistema de habilitar a energia elétrica no apartamento quando os hóspedes estivessem no apartamento, através da inserção da chave da porta em local específico. Muitas pessoas burlam o sistema, inserindo um cartão qualquer, e deixam o ar-condicionado ligado o tempo todo. Ou ainda usam o equipamento com as janelas e portas abertas. “No diagnóstico foi sugerido que colocássemos um sensor de calor e presença de pessoas, janelas e portas que só permite que os equipamentos sejam ligados quando o hóspede estiver no apartamento e todas as condições de bom uso contempladas. Considero que isso vai ser fundamental para a redução dos gastos”, detalha Pedalini.

Motores de alto desempenho da WEG ajudaram a Tigre a reduzir em média 5,8% do consumo de energia em cada máquina

O projeto de eficiência energética vai ajudar a pousada a economizar mensalmente cerca de 30% do valor gasto com energia elétrica. O investimento capaz de proporcionar a redução dos gastos será de aproximadamente R$ 60 mil, a ser pago em 60 meses, com uma linha de crédito especial. O plano prevê ainda a instalação de um gerenciador na entrada de energia elétrica da pousada para medir e apresentar, através de gráficos, diversos dados via internet, inclusive a existência de um consumo acima do padrão. “Vamos pagar o financiamento facilmente com o valor economizado a cada mês”, ressalta Leopoldo Pedalini Neto. Para ele, não é só a economia que vale a pena. “Dessa forma estaremos preparados para situações de escassez de energia e principalmente ajudando o planeta.”

Segundo Guilherme de Oliveira Camargo, a gestão energética também está ao alcance dos pequenos e médios empresários. “Todos devem evitar o desperdício. Levando-se em conta que o kW de menor custo não é o kW produzido e, sim, aquele economizado, as ações com resultado mais rápido são as de gerenciamento, educação e atualização tecnológica de equipamentos”, aponta Camargo.

Com 40 unidades em Santa Catarina, o Laboratório Médico Santa Luzia decidiu procurar a ajuda do Senai para investir na melhoria da eficiência energética há dois anos. Para evitar o desperdício de energia elétrica, foram adotadas medidas de acompanhamento de faturas, recontratação de demandas, instalação de gerenciadores e medições setorizadas. “Com estas ações foi possível reduzir o consumo em aproximadamente 10%”, informa Camargo.

Entre os maiores vilões, no caso do laboratório, estava o ar-condicionado, que passou a ser desligado automaticamente. “Os empregados do laboratório absorveram com facilidade a conscientização e, já no mês seguinte, a economia gerada cobriu os gastos que tivemos na implementação do plano de eficiência energética”, atesta João Soares, responsável pela manutenção técnica da empresa.

E para quem continua achando que eficiência energética é papo de empresa grande, vale lembrar que o Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES) anunciou em fevereiro que passará a financiar Diagnósticos de Eficiência Energética para Micro, Pequenas e Médias Empresas através do cartão BNDES. O objetivo é ampliar a oferta desse serviço especializado às organizações deste porte e aumentar a demanda por financiamentos para implantação de projetos de eficiência energética no País. O diagnóstico é o primeiro passo para quem deseja investir na gestão energética e pode apontar caminhos para que os pequenos economizem até 30% de energia, percentual médio de desperdício do segmento apontado pelo Plano Nacional de Eficiência Energética publicado em 2011 pelo Ministério de Minas e Energia.

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