por Mariana Rosa (mariana@empreendedor.com.br)
Há cerca de 20 anos, abrir o próprio negócio era um passo para poucos. De lá para cá, o empreendedorismo vem se difundindo cada vez mais, negócios inovadores surgem a todo instante – e, em alguns casos, desaparecem com a mesma rapidez. José Dornelas é um dos maiores especialistas da área no Brasil e escreveu obras que se tornaram referência para a orientação daqueles que querem se tornar empreendedores. Entre as publicadas recentemente, estão a quinta edição do best-seller Empreendedorismo: transformando ideias em negócios, e a inédita Empreendedorismo para visionários. No blog, www.josedornelas.com.br, diversos materiais complementares às suas obras estão disponíveis para download gratuito.
José Dornelas é doutor pela Universidade de São Paulo (USP) com pós-doutorado pela Babson College, nos Estados Unidos, onde atua como professor visitante. O professor também preside a Empreende, consultoria especializada em planejamento de negócios, captação de recursos e treinamento de empreendedores. Nesta entrevista, Dornelas comenta sobre a importância do planejamento e dá algumas orientações para que a travessia de uma boa ideia a um bom negócio seja realizada com sucesso.
A partir do momento que identifica uma oportunidade, quais são as medidas que um empreendedor pode tomar para prever os riscos e as condições de implantação do seu futuro negócio?
José Dornelas – Quando identifica uma oportunidade, sugerimos que o empreendedor diferencie a oportunidade da ideia. É preciso que o empreendedor evolua da oportunidade para um planejamento de negócio. O planejamento define se a ideia tem viabilidade. Para que não aconteça de o empreendedor dar um tiro no escuro.
No livro Empreendedorismo: transformando ideias em negócios, você comenta que apesar de o empreendedor brasileiro ter características positivas como criatividade e persistência, ele não tem cultura de planejamento, o que muitas vezes causa o fracasso de uma empresa. A falta de planejamento é um problema exclusivo do brasileiro?
Dornelas – Não é. No mundo todo isso acontece, em muitos casos. Inclusive nos Estados Unidos. A diferença dos países mais desenvolvidos é que se tem mais informação. A dificuldade do empreendedor é a impaciência, geralmente ele não quer perder tempo com o planejamento. Mas isso está mudando com a atuação de órgãos como o Sebrae e a difusão do tema na mídia. Outro indicativo é o uso dos livros, que são adotados nas universidades, como o Empreendedorismo e o Empreendedorismo para visionários.
Como se muda esta realidade?
Dornelas – Se não faz por iniciativa ou vontade, vai na dor. Isso está acontecendo no Brasil, muitos empreendedores estão aprendendo a importância do planejamento na prática ao observarem que conseguem ter mais resultado quando se prepararam para o futuro.
O aumento da taxa de sobrevivência das pequenas empresas brasileiras nos primeiros anos de atividade, de uma taxa histórica de menos de 50% para 76% em 2013 (Sebrae, julho), pode ser um indicativo de que os empreendedores estão se dedicando mais ao planejamento?
Dornelas – Sem dúvidas, porém há outros fatores, como facilidade de acesso à informação, melhoria no desenvolvimento econômico do País nos últimos anos, crescimento do mercado interno (classes C e D consumindo mais e criando novos mercados para os empreendedores que fornecem a esse público). Além disso, há mais livros sobre empreendedorismo, o ensino do tema tem se difundido nas universidades, escolas técnicas e ensino médio, ou seja, o tema hoje faz parte da cultura do brasileiro, que tem entre os seus principais sonhos criar e manter o próprio negócio. Como os exemplos de sucesso mostram que há um trabalho árduo pela frente e que planejar traz mais resultados que não planejar, os iniciantes acabam por começar suas empresas mais bem preparados que aqueles que agiam mais no feeling e que foram a maioria do passado.
De que forma a falta de planejamento pode afetar um empreendimento que ainda está sendo idealizado?
Dornelas – O primeiro deles é quebrar antes da hora. Na verdade, não deveria haver uma hora para quebrar, mas a morte prematura de uma empresa ocorre principalmente por falta de planejamento. Se não se organizar, a chance de fracasso é absurda. Os três primeiros anos de um negócio são críticos.
E após este período crítico dos três primeiros anos?
Dornelas – É preciso sempre pensar no futuro da empresa. Ela nunca para. Quando se define o futuro, necessariamente se planeja, pois há objetivos que são definidos e para atingi-los deve-se criar uma estratégia. Tudo isso é feito com o planejamento.
Cada vez mais o jovem recém-formado aposta na inovação para abrir seu próprio negócio. Como você avalia a formação oferecida pelas universidades atualmente, especialmente em relação à questão da cultura de planejamento?
Dornelas – O empreendedorismo atingiu um nível de divulgação grande, o estudante tem acesso à informação que precisa. O que poderia se fazer para melhorar é montar disciplinas específicas. Tem havido demanda pelo uso dos livros nas disciplinas. Veja o caso dos livros Empreendedorismo e Empreendedorismo para visionários. Ambos são adotados amplamente nas universidades em todo o Brasil como livro-texto base das disciplinas.
Quais são os principais aspectos que o empreendedor deve considerar para a elaboração de um bom plano de negócios voltado à obtenção de recursos junto a investidores?
Dornelas – A primeira coisa a se mostrar é o projeto e a equipe. Depois, o negócio, a ideia inovadora. O mercado em si, se ele tem potencial. Finalmente, a viabilidade, se ela existe ou está longe no horizonte.
Uma vez conseguido o recurso, como o plano de negócios pode se tornar uma ferramenta de gerenciamento?
Dornelas – O plano de negócios é a base do planejamento estratégico. A partir do plano de negócios, definem-se métricas que podem ser usadas como metas inclusive para executar as ações da empresa. Se essas metas não são atingidas ou o plano foi mal elaborado ou a execução não ocorreu a contento. Em qualquer dos casos, há que se fazer uma correção no plano ou na maneira que a empresa tem executado seus processos de negócio. Usando essa premissa como base, o plano de negócios pode e deve ser usado em qualquer estágio do ciclo de vida de uma empresa.
Em quais situações é indicado o uso do Modelo de negócios Canvas, que reúne as principais informações sobre a empresa em uma única folha, citado por você no livro Empreendedorismo para visionários?
Dornelas – Sempre pode ser usado, mas na fase de avaliação de oportunidades. Essa fase ocorre antes do desenvolvimento do plano de negócios (vide texto e figuras nas pág. 63 e pág. 69 do livro Visionários). De qualquer maneira, todo projeto que necessite de informações estruturadas e análise de viabilidade financeira deve necessariamente ter um plano de negócios. O modelo de negócio Canvas e o plano de negócios são complementares (vide meu artigo no blog http://www.josedornelas.com.br/artigos/modelo-de-negocio-canvas-ou-plano-de-negocios/), sendo um mais para auxiliar na estruturação da ideia e em pensar como a empresa vai fazer dinheiro (Canvas) e o outro como a empresa precisa se estruturar para ganhar dinheiro (plano de negócios).