por Mônica Pupo (monica@empreendedor.com.br)
Foi durante a década de 1980 que o sistema de franquias chegou ao Brasil, seguindo o exemplo das redes norte-americanas e europeias. De lá pra cá, muita coisa mudou no panorama mundial e cada vez mais globalizado dos negócios. Na esteira das mudanças, o franchising tem se adaptado para superar desafios e assegurar seu lugar de honra entre os modelos de gestão mais bem-sucedidos da história.
“Antigamente ninguém falava em globalização, geração Y, conselho de franqueados, fundo de propaganda, nada disso que está em pauta hoje em dia”, aponta Melitha Novoa Prado, advogada especializada em relacionamento de redes de franquias. Em seu mais recente livro – “Franchising na Real” (Ed. AG Books) – ela desvenda algumas das questões mais polêmicas que cercam as três décadas de existência do franchising brasileiro.
Na entrevista a seguir, Melitha fala mais sobre a evolução do sistema de franquias no País, além de dar conselhos para quem está pensando em investir no setor. O relacionamento entre franqueador e franqueado é outro ponto ressaltado pela autora. “Franchising significa relacionamento. Daí podemos entender o quão importante é saber se relacionar e possuir habilidade para se relacionar”, relata.
Quais foram as principais mudanças registradas no franchising brasileiro desde seu lançamento na década de 1980?
Melitha – Com o amadurecimento do setor de franchising, pudemos vislumbrar o surgimento e desenvolvimento de franqueadores mais profissionais, com maior conhecimento das regras e realidade do sistema e aptos a expandir a sua marca através de uma rede mais sólida e comprometida. Obviamente que os problemas existem e irão sempre existir, mas o mais importante é poder acompanhar o aprendizado das pessoas e das empresas durante esse tempo. Todos nós tivemos grandes lições no franchising, e nos conscientizamos do grande papel social que ele desempenha. A responsabilidade social do setor é enorme e para isso devemos sempre estar atentos.
E o que mudou no perfil dos franqueados desde então?
Melitha – De modo geral, a franquia deixou de ser um grande sonho e sinônimo de aposentadoria e passou a significar uma oportunidade real de investimento. As ambições e anseios das pessoas também mudaram muito ao longo do tempo. O franqueado de ontem, mais obediente e romântico, deu lugar a um franqueado mais consciente, frio e polêmico.
E o que mudou no perfil das redes?
Melitha – Vários fatores foram se alterando. Atualmente temos redes de franquias brasileiras muito desenvolvidas, com porte e tamanho de gente grande. Redes que apostaram no franchising, aprenderam com seus erros e hoje procuram sempre fazer o melhor. Essa é a evolução do sistema. As redes estão cada vez mais consistentes e sempre abertas para adquirir mais conhecimento e competência.
Qual a maior (ou maiores) crise que já abalou o franchising nacional desde a década de 1980?
Melitha – Fora as inúmeras crises econômicas, o que mais abalou o franchising, e ainda abala, é a péssima qualidade dos processos de seleção. Hoje não existe espaço para alegar a própria torpeza, todo mundo sabe o que deve fazer e o que não se deve fazer. O conflito é como fazer e quando fazer. Muitos ainda padecem desse mal e tentam proporcionar alegrias entregando frustrações. Essa é a grande doença do franchising brasileiro. Tudo começa aí: na profundidade dos processos de seleção que, por vezes, são inócuos, inadequados e incompletos.
Quais os pontos mais delicados da relação entre franqueador e franqueado hoje em dia? Os problemas também evoluíram muito do que eram antigamente?
Melitha – Franchising significa relacionamento. Daí podemos entender o quão importante é saber se relacionar e possuir habilidade para se relacionar. Entender o fator humano, compreender que o franqueado, antes de tudo, é uma pessoa, com emoções, sonhos e limitações fazem parte desse processo. Da mesma forma que entender que o franqueador não é Deus, que pode errar e que também possui suas limitações e deficiências, faz parte. A maioria dos problemas surge por questões subjetivas que se demonstram através de comportamentos inadequados, imaturos e impróprios de ambos os lados. Antigamente, os problemas eram menores até porque tudo era novo e as pessoas entravam no segmento sem muito conhecimento. Agora o papo é diferente.
Como a ascensão das redes sociais e a constante troca de informações sobre consumo têm impactado as redes de franquia que atuam no Brasil?
Melitha – Obviamente que sim, pois se compartilham mais as experiências, inclusive as negativas, em tempo real. O consumidor é mais antenado e o franchising tem que acompanhar a onda.
Quais as principais diferenças entre franqueados que pertencem à geração Y dos mais velhos?
Melitha – Os franqueados pertencentes à geração Y costumam ser mais polêmicos, menos submissos, mais impacientes, menos transigentes e não possuem muito jogo de cintura. Colocam a ambição financeira, autonomia e qualidade de vida acima de tudo. São mais difíceis de lidar pela teimosia e prepotência de serem mais conectados e multidisciplinares.
Do ponto de vista do franqueador: é possível tratar os franqueados de maneira diferente? Ou a gestão precisa ser uniforme?
Melitha – Tratar diferente respeitando a individualidade de cada franqueado faz parte. As regras e padrão estando claros, o franqueado deve conquistar o seu espaço da melhor forma possível. É uma questão de comportamento, dedicação e habilidade.
Com tantas redes novas surgindo a cada dia, o que os empreendedores devem observar antes de investir numa franquia?
Melitha – A forma de relacionamento do franqueador com a rede. Como são resolvidos os problemas? Como o franqueador lida com as adversidades? Como ele trabalha as metas da rede? A parte intangível é a mais importante e deve ser minuciosamente analisada.
Por fim, quais suas recomendações a um empreendedor que deseja abrir seu primeiro negócio e está pensando na possibilidade de adquirir uma franquia?
Melitha – Sugiro que investigue, estude, reflita, se autoanalise muito. Franquia é para todos, mas não é para qualquer um. Invista no processo de seleção e procure obter o maior número de informações possíveis da marca e da rede. Isso será fundamental na tomada da decisão e sucesso da empreitada.