Alfredo Soares sempre foi apaixonado por esporte. Começou na natação e jogou polo aquático por vários anos pelo time do Fluminense. Até que decidiu largar a carreira de atleta para apostar em um jogo mais arriscado: o de empreender. Hoje, lidera a Xtech Commerce, plataforma carioca de e-commerce e hospedagem de lojas virtuais, que já atendeu mais de 30 mil pequenos empreendedores e chega a transacionar 15 milhões de reais todo mês. No caminho de preparação, do atleta ao empreendedor, foram anos de muito suor, alguns placares zero a zero, competições mais acirradas, mas, principalmente, uma energia inesgotável.
Foco no jogo e pés no chão
O pai de Alfredo foi sua principal referência antiempreendedora. Ele trabalhou a vida inteira em empresas grandes, com cargo executivo e liderando equipes, mas sempre com os pés no chão. Apesar desse jeito mais pragmático, tinha um mantra: “Não precisa me prometer nada, vai lá e faz.”. Era assim em casa e também no trabalho. E foi essa personalidade de quem valoriza a atitude e não o discurso que sempre guiou os passos de Alfredo.
“EU VIA O JEITO COMO MEU PAI LIDAVA COM O PRÓPRIO TIME, A PERSISTÊNCIA DE FAZER TUDO PARA QUE AS COISAS SAÍSSEM CERTO…POR CAUSA DELE, EU SEMPRE QUIS SER UM LÍDER!”
A liderança, o espírito de equipe e a competitividade foram competências que Alfredo foi desenvolvendo dentro e fora da piscina, a cada nova partida. Além de encontrar boas referências nos técnicos de pólo aquático com quem conviveu, a faculdade de publicidade apresentou a ele uma figura, que ele passou a acompanhar a vida toda: Nizan Guanaes.
“O Nizan era um publicitário empreendedor. Sempre envolvido em evento, projeto….Ele sempre encarou a agência de publicidade de uma maneira diferente. Eu vejo que pessoas como ele são grandes artistas do mundo, incentivam milhares de pessoas, sem nem mesmo saber.”
O cartão de visitas que nasceu antes da empresa
Aos 17 anos, Alfredo foi fazer um curso prático de Photoshop e Corel Draw. Na primeira aula, quando aprendeu a fazer um logo, desceu na gráfica do prédio e imprimiu o primeiro cartão de visitas: nascia ali a Ideias Cariocas.
“Foi tão legal a ideia de fazer um cartão de visitas, que eu passei a fazer pra todo mundo: pra minha mãe, pro meu pai, até pra minha avó….E eu comecei a convencer todo mundo de que eles precisavam de um cartão.”
Até então, a vida de atleta e empreendedor caminhava bem, até chegar a faculdade. Lá, Alfredo foi convidado por um professor a trabalhar na agência experimental do curso. Dentro da agência, via um jogo mais interessante acontecendo. A cada cliente que atendia, se apaixonava mais pela ideia de empreender.
“EU SABIA QUE NÃO CONSEGUIRIA IMPACTAR TANTAS PESSOAS SE CONTINUASSE NO POLO AQUÁTICO.”
Em busca de novos esportes
Foi, então, que ele decidiu encerrar a carreira no esporte e partir para outras competições. Criou uma agência própria ainda na faculdade, que chegou a ter 12 funcionários, mas percebeu que ali era um jogo que ele não tinha prazer em jogar: “Eu via que na agência não importava a sua performance, mas sim os relacionamentos que você tinha.”
Para piorar, em 2001, a crise levou todos os seus clientes embora, deixando Alfredo sozinho sem time nenhum, apenas com um sócio. Aos poucos, conseguiu virar o jogo, voltou a ter clientes, mas manteve a estrutura enxuta. A agência já estava ficando pequena demais, era hora de partir para outra.
Nesse meio tempo, ele começou a diversificar os investimentos, a arriscar mais e buscar novos negócios. Entrou como sócio especialista em marketing em um comércio, abriu uma loja de barcos em um shopping no Rio de Janeiro e até chegou a montar, em 2007, uma ilha de entretenimento em Angra dos Reis que recebeu mais de 500 mil turistas. De todas essas jogadas, a primeira foi a que quase tirou Alfredo de campo: ele chegou a perder R$ 100 mil com o negócio. Mesmo com tantos placares 0×0 até então, nunca tinha vivido um 7×1 tão duro.
A reviravolta levou o empreendedor a depressão, se afastando do campo e passando a refletir mais sobre o que faria a seguir. O jogo ficava cada dia mais sério e, quanto mais arriscado era, mais ele poderia colocar tudo a perder.
De volta às quadras!
Um dia, dormindo, Alfredo conta que sonhou com o nome para um novo negócio: Marketing Shop. A ideia era criar um shopping online com soluções de marketing, uma espécie de marketplace que reunisse agências para oferecer serviços como gestão de redes sociais, criação de sites e anúncios no Google, por exemplo. O empreendedor mostrou o projeto para duas amigas, que entraram como sócias. Foi essa virada que tirou Alfredo da depressão.
De volta às quadras, Alfredo logo encontrou um problema de escala no novo negócio: cada vez que a empresa crescia um pouco, tinha que contratar mais gente e alugar uma nova sala, o que tornava a operação insustentável e pouco lucrativa. As duas amigas sócias decidiram sair do negócio e Alfredo começou a se perguntar o que seria preciso para criar uma empresa escalável, de grande impacto.
O sócio de TI na época, Ricardo Oliveira, comentou: “Eu tenho um produto de criação de sites, o que acha de tentarmos fazer disso nosso negócio?”
“Nós víamos que nesse mundo digital não tinha um grande vendedor. Então, poderíamos ser um canal de vendas, revendendo a solução de outras pessoas, por meio de uma plataforma de e-commerce.”
Foi aí que nasceu a Xtech Commerce.
“CHEGAMOS A VENDER 35 PROJETOS DE PORTA EM PORTA, SEM TER O PRODUTO PRONTO.”
E, a partir daí, começou a corrida maluca! Era preciso cumprir os prazos combinados, sem ter a certeza de que seria possível entregar a plataforma prometida.
Depois de adiar o lançamento algumas vezes, um dia antes da nova data combinada para a entrega, Alfredo recebe uma ligação às três da manhã do seu sócio Ricardo dizendo:
– A deadline é amanhã para entregar as lojas e eu não estou conseguindo de jeito nenhum fazer a parada funcionar. Acho melhor a gente começar a revender a solução de alguém.
Alfredo respondeu:
– Calma, estou saindo de casa agora e a gente vai tomar essa decisão juntos.
O empreendedor conta que chegou à empresa no meio da madrugada, passou um tempo conversando com o sócio, pegou o carro e foi comer em um quiosque, enquanto conversavam sobre o futuro da empresa. Quando voltaram para a empresa, o dia ainda nascendo e a deadline se aproximando, Ricardo, em menos de 10 minutos, conseguiu achar a solução.
“A gente virou o jogo no mesmo dia, nos 45 do segundo tempo. Liguei para todos os clientes, falei que estava reagendando todas as entregas porque tínhamos repensado a solução e ela ficaria ainda melhor.”
APESAR DO PRORROGAÇÃO, UMA COISA ERA CERTA: ELES AINDA ESTAVAM NO JOGO.
Tempos depois, o time de sócios logo ganhou reforço. Jordão Bevilaqua apostou na ideia e entrou como COO para contribuir com seus conhecimentos de marketing digital e e-commerce, uma entrada que foi fundamental para os próximos passos que a empresa daria.
Uma série de Day1s
Quando a história é contada de trás para frente, parece que todos os pontos se conectam, e o final só pode ser mesmo um só. Mas na prática, quando a bola está em campo, e o jogo está rolando, não há certeza nenhuma de que as coisas vão dar certo no final.
“Eu não fazia ideia de que um dia seria dono de uma plataforma de e-commerce. Trabalhando é que você encontra realmente o que precisa fazer.”
E, nesse caminho, é inevitável viver uma série de Day1′s.
Um dia, por exemplo, uma pessoa — que eles nunca descobriram quem é — publicou a resenha do produto da Xtech em um fórum online, dizendo que eles eram o Shopify brasileiro. A partir daquele dia, a média de lojas que entravam na plataforma saltou de 3 para 30. tamanha a repercussão do post.
Tempos depois, Alfredo se deparou com a solução de um aluno, que conheceu após dar uma palestra na faculdade onde ele estudava. Ele tinha um produto que se propunha a gerenciar perfis comerciais do Instagram — e tinha potencial de se tornar parceiro da Xtech. Mesmo deixando o projeto de lado por um tempo, Alfredo retomou em janeiro de 2016, com a ideia de focar por apenas um mês no produto e ver no que dava. O empreendedor conta que, se não fosse esse investimento de tempo, hoje, a Xtech Commerce não teria capital para reinvestir no próprio negócio sozinha sem a necessidade de um investidor.
O dia que o jogo quase acabou
De todos esses momentos marcantes, existe um que não dá para esquecer: o dia em que a plataforma caiu. Poderia ser só mais um problema no sistema, uma crise simples de contornar se esse dia não fosse a Black Friday. O ano era 2015, a Xtech já atendia mais de 1.500 clientes e o site caiu às 10 da manhã. O desespero foi enorme, foram mais de 900 reclamações no Facebook, mais de 200 ameaças de saída da plataforma, além de memes e todo o time desestabilizado.
“NAQUELE DIA, A GENTE ACHOU QUE TINHA QUEBRADO.”
Na hora, Alfredo cancelou os compromissos do dia, largou tudo e sentou na frente do computador para atender as reclamações.
“Não foi premeditado, eu nunca imaginei que algo assim aconteceria. Então, criei um grupo no Facebook com todos os clientes e passei a responder um a um, deixando meu telefone, colocando a cara a tapa e mostrando que estávamos ali ao lado deles.”
O resultado é que, mesmo depois de 4 horas fora do ar, a plataforma registrou poucas migrações de clientes para players concorrentes. O susto serviu não só como alerta sobre as mudanças que precisavam ser feitas, mas também sobre a responsabilidade que estava nas mãos dos empreendedores e do time de impactar a vida e o negócio de seus clientes.
“Sabe aquele momento em que você sente que está muito bem, e aí você precisa meio que voltar para o chão? Foi o que trouxe a gente de volta para a realidade: começamos a replanejar o investimento em Marketing, olhar mais para o produto…Definitivamente, aquele dia terminou de um jeito diferente do que começou.“
Resultado: a empresa mudou de escritório, investiu em uma equipe de TI e desenhou uma estratégia comercial mais pé no chão.
No ano passado, por exemplo, com o dobro de clientes, foram mais de 20 mil pedidos e 5 milhões de reais transacionados. O mais importante: sem deixar o site cair.
Jogada mais profissional
Hoje, a Xtech tem uma estrutura de grupo, como se fosse uma pequena incubadora de soluções B2B, ajudando pequenas empresas a crescerem e oferecerem outros serviços aos clientes da plataforma. São quatro lojas rodando nos Estados Unidos, com projeto para Portugal e a intenção de começar a explorar o mercado da América Latina em 2017.
O grande desafio é que, até hoje, todo dinheiro investido no negócio, partiu dos empreendedores e de capital próprio da empresa, sem investidores — estratégia conhecida como boostrapping. Porém, apesar do espírito de realizar e fazer dos empreendedores, eles sentem que é a hora de profissionalizar a gestão. Foi assim que os caminhos deles e da Endeavor se cruzaram no início de 2016.
Os empreendedores participaram do Scale-up Rio, um programa de aceleração correalizado pela Endeavor, SEBRAE e o Babson Entrepreneurship Ecosystem Project, que ajuda pequenas empresas com potencial de crescimento a removerem as barreiras que as impedem de crescer. Com as mentorias e os encontros de capacitação, Alfredo conta que eles passaram de um negócio praticamente familiar para uma gestão mais profissionalizada, com um Conselho que ajuda na tomada de decisão.
O futuro da empresa e as partidas que estão por vir
“Hoje, eu penso que se eu ajudar os empreendedores que atendo a crescer, e o meu time a se realizar profissionalmente; se a gente conseguir levar essa empresa a cada canto do Brasil em que existe um comércio, essa é a história que eu quero contar daqui a alguns anos.”
Porém, esse crescimento sempre chega respeitando as regras do jogo. “Na parede do escritório, nós temos adesivado: ‘A grande empresa é a pequena que fez a coisa certa.’”. E com o sonho grande claro para todo mundo, não é preciso dar saltos, mas sim, fazer uma jogada de cada vez.
“Eu digo para o meu time: me entreguem 1% a mais por dia, é isso que esperamos de vocês. A gente tem 100 clientes, vamos fechar o dia com 101. Vamos crescer 1% por dia e a gente vai crescer muito no fim do ano. Crescer juntos!”
Ter um DNA empreendedor, com resiliência e capacidade de dar a volta por cima é, na visão de Alfredo, o que vai levar o negócio a ter mais impacto.
“Jogar um jogo já ganho é fácil, mas virar o jogo é a melhor sensação do mundo para quem é empreendedor.”
“Nós somos uma empresa feita de energia. Sem energia, só com teoria ou dados, você não cresce. É preciso chacoalhar o mercado, ter uma força que te leve para frente!”
Originalmente publicado em Endeavor