A democracia brasileira nasceu na rua e ganhou o último grande fôlego com o Diretas Já. Esse movimento popular que conquistou a volta da eleição direta para presidente da República, começou em maio de 1983 e foi até 1984. Mobilizou milhões de brasileiros em comícios e passeatas pelas ruas de todo o Brasil. Um período de medição de poder, de grande risco de destruição e que teve o bom resultado da purificação. O país foi colocado a prova, nada fazia sentido, ficar por mais de 20 anos num regime militar, sem eleições diretas. A democracia brasileira passou pelos ciclos do poder, destruição e purificação. Foi um batismo de fogo.
Se nasceu na pia batismal a céu aberto das ruas, o movimento da década de 80 teve a certidão ratificada pela Constituição de 1988 que vale até hoje. Nos dias atuais, que antecede o limite de 7 de setembro, quando nada mais faz sentido, o Brasil vai passar por um novo batismo de fogo.
De um lado, uma pandemia que é confrontada por negacionistas da ciência, das vacinas e da própria pandemia, já deixou para trás mais de 580 mil pacientes no país. A economia travada e a inflação perde controle. O fechamento de empresas é crescente e o desemprego já alcança 14milhões de brasileiros.
De outro lado os três poderes do país (Executivo, Legislativo e Judiciário) acirram um confronto sem precedente na história brasileira. Os partidos se enfrentam e reforçam suas armaduras para a batalha da eleição presidencial, marcada para o próximo ano.
Nas últimas décadas os brasileiros foram para ruas para protestar contra a inflação, para pedir por uma saúde e uma educação “padrão Fifa” e para reforçar o combate a corrupção que na maioria das vezes passa pelas tubulações públicas.
Agora o brasileiro vai para as ruas com as cores políticas. Num lado da cidade vai estar a cor vermelha que busca retornar seu brilho. Num outro canto da cidade vai estar a cor verde amarela dos fiéis seguidores de Bolsonaro. Ainda não se perfilou o bloco que vem pela terceira via, que não quer nem Lula e nem Bolsonaro.
Nesse atual batismo de fogo, mais do que das outras vezes, o fogo será predominante. Poderá ocorrer confrontos pelas ruas entre os diferentes grupos. É preciso lembrar que antes de tudo o fogo queima e pode causar muita destruição, a mais grave dela é a ceifa de vidas humanas. Mas o fogo também emite calor, luz, a luz da atual constituição, que abre espaço para a discussão e o entendimento.
Desde o início das civilizações o fogo foi utilizado para refinar metais. A queima elimina as impurezas e torna o metal puro. Assim é no país que consegue conviver com as divergências de visão e opinião, que atende em especial as necessidades básicas da população, a democracia fica cada vez mais pura.
Neste momento, diante desse novo batismo de fogo, pela passagem cíclicas do poder, destruição e purificação, é oportuno lembrar de uma das frases do político e jurista que entrou para a história do Brasil, Rui Barbosa: “A pior democracia é preferível a melhor das ditaduras”.