O capataz protege e resiste demitir o outro menino da porteira de Brasília

No início da década de 50, o Brasil era um imenso país rural.  Nada menos de 63 por cento da população vivia nos campos, em grande parte na lida com o gado e no plantio de alimentos, numa vida  de subsistência. Brasília não existia, nem nos riscados de Oscar Niemeyer,  e só começou a ser erguida na década de 1960. Nessa época, só quem tinha um rádio conseguia ouvir notícias e músicas, quase sempre músicas sertanejas.

Foi em 1955 que a dupla Teddy Vieira e Luiz Raimundo criou e gravou pela primeira vez a música “O menino da porteira”. Desde que foi lançada e até hoje, essa música sertaneja ganha os ouvidos e os corações de todo o Brasil. A música narra, em primeira pessoa, a vida do boiadeiro que sempre que passava pelos campos de Ouro Fino e avistava a figura de um menino, que abria a porteira para o gado passar, em troca de algumas moedas. Um dia, o boiadeiro chegou diante da porteira e não viu o menino. Entrou numa casa e viu uma mulher que chorava e perguntou a ela o que aconteceu. “Seu moço, um boi matou o menino”.

Em plena pandemia,  um outro menino ficou na espreita para abrir uma grande porteira, desta vez no vasto campo chamado Brasília. “Vamos aproveitar esse momento de calmaria na imprensa, que só fala do coronavírus,  para passar  a boiada”. Esse menino tem nome e é bem conhecido : Ricardo Salles. Tem também um cargo de máxima importância para o país:  é o ministro e responsável  pelas políticas de meio ambiente do Brasil.

Jovem ainda, um menino perto de outros velhos ministros, Ricardo Salles anunciou essas suas palavras na pandemônica reunião do dia 22 de abril de 2020, em Brasília, com a presença do presidente Jair Bolsonaro.  O menino da porteira de Brasília, no entanto, não esperava que vinha para cima dele diferentes bois e ferozes, não mais as mansas ONGs,  freiras ou comunistas.

O primeiro boi que veio para cima dele foi o presidente da França, Emmanuel Macron,  que ameaçou não assinar o Tratado da Comunidade Econômica Europeia e o Mercosul, caso o Brasil não trate com mais seriedade as questões relacionadas à preservação da Amazônia.  O segundo boi feroz veio na forma de uma carta assinada pelos maiores investidores internacionais no Brasil que condicionam a liberação de recursos só para projetos sustentáveis em todo o país. Por último, e ainda mais feroz veio, um boi representando os principais empresários do agronegócio e  banqueiros do Brasil que exigem uma atitude firme do país em relação às queimadas e preservação do meio ambiente.

Acuado, o capataz da fazenda, que numa  tacada mexeu em seis ministérios, resiste a tirar  esse menino da porteira de Brasília ou dar a ele uma nova orientação. A história  desse novo menino não vai gerar uma canção imortalizada na voz de Sergio Reis e por último pela do cantor Daniel. Tanto Sergio Reis como o cantor Daniel protagonizaram filmes que contaram a história do verdadeiro menino da porteira.

A história do menino da porteira de Brasília, no entanto, será contada em mais de um filme, mas numa categoria triste e preocupante: a do drama e da agonia, do meio ambiente brasileiro.

Para um menino da porteira recolher umas moedas jogadas no chão de gratidão pelo boiadeiro, tudo bem.  Mas para um país inteiro, como o Brasil, é inaceitável que alguns governantes inescrupulosos, muitos empresários gananciosos e grilheiros impiedosos  destruam as florestas e  todo o equilíbrio do meio ambiente em troca de algumas moedas  deixadas no chão da porteira do menino de Brasília.

 

 

 

Facebook
Twitter
LinkedIn