João Kepler, o homem de 1.000 startups

Escolhido como Investidor Anjo do ano, João Kepler aposta em empresas nascentes, na maioria comandadas por jovens empreendedores

Quando o mercado conheceu a grande vencedora do prêmio Startup Awards deste ano na categoria Venture Capital, ninguém pôde se dizer surpreso. A Bossa Nova Investimentos e seus diretores, capitaneados pelo investidor anjo João Kepler, foram os agraciados em uma categoria que pela primeira vez constou da premiação, graças também a um exitoso trabalho desenvolvido pela empresa entre as startups brasileiras.  Mesmo em um ano atípico para o mercado mundial, a Bossa Nova conseguiu consolidar um trabalho minucioso, voltado ao impulso de startups nacionais dos mais variados segmentos.

No primeiro semestre, a empresa aumentou em 80% o número de investimentos em comparação ao mesmo período do ano anterior e deve fechar o ano com aportes da ordem de R$ 10 milhões em startups nos estágios seed e pré-seed. Com um notável portfólio de 500 startups investidas, a Bossa Nova recebeu um reconhecimento que confirmou a atuação de João Kepler como Investidor Anjo do Ano, Rafael Ribeiro, Head de operação como Mentor do Ano e a Transfeera, startup aportada pela empresa como Revelação.

Por trás do reconhecimento do mercado, o que sobressai é uma política instigante da Bossa Nova em priorizar investimentos em Seed e Pré-Seed, que são estágios iniciais e ainda muito carentes de investimentos. Só em 2020, a empresa avaliou criteriosamente mais de 900 startups em todas as regiões do país, furando a bolha reducionista dos mercados centrais. Isso consolida ainda mais uma situação de real crescimento no mercado de venture capital no país, que triplicou de tamanho entre 2017 e 2019. Se antes as startups tinham que buscar dinheiro no exterior, hoje a realidade é distinta e o amadurecimento do ecossistema é evidente. Pelo menos metade das empresas mais inovadoras do país já possuem parcerias com uma incubadora ou aceleradora e a participação de grandes corporações no aporte às startups já rendeu algumas boas histórias de sucesso.

ERROS E ACERTOS

Por trás da emergente atuação da Bossa Nova e a prospecção de uma série de novas empresas que prometem fazer história estão as ideias defendidas por João Kepler, o investidor anjo que se notabilizou em palestras e livros focados no crescimento do ecossistema brasileiro de inovação. Iconoclasta, ele costuma dizer que sua experiência à frente desse mercado não veio sozinha, mas como resultado de 39 anos de erros, fracassos e aprendizados.

Depois de muita busca por um negócio disruptivo, Kepler deu início a um site de vendas que respondesse às necessidades de uma empresa de eventos que possuía. Em busca de investimentos para alavancar o negócio, contactou um fundo norte-americano e partiu para uma primeira entrevista no Silicon Valley. “Não sabia o que era startup e fui para os Estados Unidos munido de um PowerPoint que mostrava o que eu tinha na época, três escritórios, 48 colaboradores e um estacionamento lotado de carros. Mas o que o investidor queria ver eram outras coisas, como métricas, indicadores de desempenho, taxa de cancelamento, etc. Recebi um sonoro “não”, recorda.

Só que para João Kepler, aquele “não” foi extremamente importante e educador. “Voltei para o Brasil e pivotei o meu negócio. Transformei em um site B2B, voltado à solução de problemas de outras empresas”. E a guinada não poderia ter sido mais radical, pois Kepler encarou de frente a ideia de construir sua plataforma de e-commerce, reduzindo drasticamente custos e voltando para um modelo do tipo “uma sala e três colaboradores”.

Com o aprendizado e a imersão gradual no mundo das startups, sobrou tempo para começar a trabalhar com mentoria e investimento anjo. Em 2014, já contabilizava cerca de 40 negócios investidos, entre empresas e mentorias. Em 2015, foi a vez de juntar-se a Pierre Schurmann para criar a Bossa Nova Investimentos, que se transformou na maior empresa de micro venture capital da América Latina.

O objetivo, assegura Kepler, é chegar aos mil investimentos em startups nos próximos anos. “Não podemos esquecer de que startups são modelos de negócio com base digital e escaláveis, isto é, precisam crescer o faturamento sem crescer a infraestrutura proporcional, ou seja, a receita deve crescer mais que a despesa”, define.

 Felizmente, ao que tudo indica, mesmo os negócios que ainda transitam por um modelo tradicional já aprenderam que parta crescer é preciso se relacionar de algumamaneira com uma startup. “Não é mais uma moda, qualquer um que tenha um telefone na mão tem relação com uma startup. O negócio acontece através do capital intangível, intelectual, fazer muito com muito pouco e saber que amanhã esse negócio pode vir a ser gigantesco”, define.

Na busca por aportes, as startups devem passar por um processo de Fundraising, similar a uma escada de investimentos, onde o investidor avalia o estágio que irá priorizar, se o negócio está na fase inicial da ideia, validando, operando ou tracionando. Para cada estágio há um tipo de investimento, que vai da incubação, aceleração, investimento anjo, pré-seed, seed, série A, B, C, D até o IPO.

De acordo com João Kepler, o grande negócio é o empreendedor descobrir em que estágio está e saber que investimento precisa. “Nós buscamos os que já estão operando, que precisam crescer para atingir um ponto de equilíbrio e se estruturar para crescer de forma consistente”, enfatiza.

Autor do livro Smart Money – a arte de atrair investidores e dinheiro, Kepler aconselha a procura por investimentos dentro da tese de cada negócio. As startups ligadas à área da Saúde, por exemplo, devem procurar o investimento específico e ampliar a busca por características que associem grupos de anjos profissionais, perfis do linkedin, etc.

Com a experiência acumulada de quem errou e soube buscar saídas, ele aconselha: “Você tem de escolher o investidor e não o contrário, mas é preciso entender o que você tem e onde quer chegar. Quando for se apresentar ao investidor mostre primeiro o problema e depois a solução. Uma dica: entenda o problema e se mostre humilde, porque investidor gosta mais de quem sabe ouvir do que só falar”.

De acordo com o Kepler, atuando nas condições difíceis que o mercado nacional oferece, o empreendedor deve se adaptar a uma condição de resiliência similar ao mundo animal: primeiro precisa ser barata, que não morre tão facilmente, para depois ser a cabra que sobre a montanha de 90 graus. Só então é que poderá sonhar com o unicórnio.

De qualquer maneira, a trajetória a ser percorrida pelas startups brasileiras nos próximos anos ainda estará repleta de desafios como a busca por investidores. Uma pesquisa recente divulgada pelo Sebrae e a Associação Brasileira de Startups (Abstartups) mostra que pelo menos 73,2% das startups nacionais nunca receberam investimentos, em 26,3% não há mulheres na equipe e 51,1% sentiram maior impacto da pandemia na venda e na atração de clientes.

Entre as empresas pesquisadas, 59,1% são compostas por uma a cinco pessoas na equipe. Para 2021, a Bossa Nova, que foi reconhecida pelo CBInsights como o fundo de micro venture capital mais ativo da América Latina, pretende ampliar a atuação através da ampliação de sete novas iniciativas de captação verticalizadas, com comitês especializados para avaliar e apoiar as startups, lançadas neste ano.

JOÃO KLEPER

Cidade natal: Belém do Pará

Idade: 50 anos

Empresa: Bossa Nova Investimentos

Atuação: escritor, palestrante, mentor, investidor anjo, cotista em aceleradoras de empresas, entre outras atividades

5 principais características dos fundos

  • A grande maioria dos fundos é pré-série A (semente). Eles podem investir em nome de parceiros limitados e terceiros.
  • Investem no máximo R$ 800 mil por startup.
  • São liderados por empresários bem-sucedidos que realizam ou já realizaram gestão de outras empresas.
  • Esperam uma rentabilidade de um mínimo de três vezes sobre o valor investido.
  • O ciclo médio de angariação de fundos é de 13 meses (com muitos chegando a 18 meses).

(fonte: João Kepler/Abstartups)

8 dicas para quem quer investir em empresas

  • Um contrato amarrado com a startup não significa que você estará livre de problemas judiciais futuros.
  • Seja criterioso e realista, não existem centenas de ótimos projetos a nossa disposição todos os dias.
  • Não se iluda acreditando que a startup vai saber vender e faturar sozinha e que o mercado é enorme e promissor.
  • Outro equívoco comum é achar que quanto menos sócios-investidores no projeto, melhor.
  • O empreendedor vai querer mais que sua mentoria.
  • Infelizmente uma startups aceleradanão significa necessariamente que o risco seja menor.
  • Não ache que se você  não tiver o dinheiro na hora do aporte os sócios entenderão. Negócio é negócio.
  • Sem dúvida, vai precisar de assessoria jurídica especializada no começo.

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