Presidente da Associação Brasileira das Startups (ABStartups), Ingrid Barth avalia o atual momento de retração desse mercado, mas acredita que novas empresas surgem nas crises e aponta as vertentes mais promissoras
Ingrid Barth assumiu a presidência da entidade no início desse ano, período que até hoje está marcado por uma forte retração de investimentos em startups. Ela é a primeira mulher no comando da Associação que reúne as startups brasileiras. Tem uma experiência de mais de 20 anos no mercado financeiro (passou pelo Santander e J.P. Margan), além do banco digital Neon.
Em 2018 fundou a Linker, um banco digital 100% focado nas startups e nos seus empreendedores. Em 2021, a Linker foi comprada pela empresa de gestão comercial Omie, por R$ 120 milhões, mas ela continua na direção do banco. Antes de assumir a presidência, Ingrid foi vice-presidente da ABStartups.
Ao aliar conhecimento do mercado financeiro com tecnologias disruptivas, Ingrid Barth tem um olhar privilegiado do atual momento e do futuro do mercado das startups no Brasil.
EMPREENDEDOR: No primeiro trimestre deste ano, o capital levantado pelas startups brasileiras caiu 86%. No mundo essa queda teria sido de 53%. Sumiu o dinheiro desse mercado? Qual a perspectiva para fechar esse ano?
INGRID – O ecossistema, de maneira geral, teve um ajuste forte de um ano para cá, principalmente na forma em que enxergamos os modelos de negócio. Os investidores estão mais seletivos, não estão apostando em ideias ainda não validadas de alguma forma. A ordem era: vamos crescer captando clientes primeiro e, depois, podemos buscar as formas de receita. Isso mudou completamente. Agora, antes de qualquer tomada de decisão, é preciso entender qual será a receita. Esse ajuste faz com que as startups busquem o equilíbrio dentro das equipes e no faturamento. O ecossistema está se reajustando nesse sentido para minimizar ao máximo qualquer fragilidade na tese para continuar seu processo de crescimento pela esteira de VC. É preciso ter todas as validações para a sua ideia antes de ir atrás de aportes. No meu ponto de vista, para startups que são efetivamente de tecnologia de ponta ainda há um mercado gigantesco para acontecer aqui no Brasil. Hoje, para captar dinheiro, o empreendedor precisa provar que de fato existe mercado e clientes pagantes para ser mais atrativo para os investidores.
Até que ponto a taxa de juro alta no país, que favorece aplicações em renda fixa, prejudica os investimentos em startups que sempre geram riscos e incertezas?
A taxa de juros alta aumenta o custo de capital para as startups, ainda mais em tempos em que receber aportes de investidores ficou mais sensível. Com a taxa de juros alta, os investidores tendem a exigir retornos mais elevados para justificar o risco associado aos investimentos. Isso posto, leva uma pressão adicional sobre as startups. Além disso, as startups costumam levar um tempo mais longo para gerar retorno, o que pode limitar a disposição dos investidores em alocar capital em startups. Já o caso dos investidores institucionais de capital de risco, os VCs, podem não ser tão influenciados pelas altas taxas de juros. É sempre um desafio para as startups quando há aumento de juros, mas é importante considerar todos os aspectos do ecossistema em que a startup está inserida.
No mercado global poderá ocorrer um enxugamento ainda maior de investimentos em startups, pela alta da inflação, receio de recessão e conflitos entre países principalmente pela guerra entre a Ucrânia e a Rússia?
Os eventos econômicos e geopolíticos podem afetar os investimentos em startups de diversas maneiras, diminuindo o apetite ao risco dos investidores e dificultando o acesso ao capital. Mas, em tempos de crise e recessão, algumas startups podem oferecer soluções inovadoras e eficientes que atendam às necessidades do mercado. Grandes negócios surgiram de crises, como o caso da Nutella, não relacionada ao mercado de startups, mas que foi criada logo após a Segunda Guerra, por conta da escassez do cacau em campos italianos.
Nesse momento, a tendência será de empresas e corporações comprarem parte ou a integridade de startups?
Não diria que é uma tendência de momento. Empresas e corporações adquirem startups em busca de inovação e tecnologia disruptiva, além da possibilidade de escalar o negócio e atingir diferentes públicos, como é o caso da Visa que acabou de adquirir a Pismo. Esse é um caso brilhante, porque essa é uma demanda que surgiu exatamente por esse aumento dos pagamentos digitais.
Quais os segmentos e ou startups têm mais chances de superar esse momento atual de retração do mercado e continuar numa trajetória de crescimento de vendas e resultados?
As fintechs, agritechs, healthtechs e edtechs. Esses segmentos usam a tecnologia para resolver problemas muito específicos da realidade brasileira. É importante dar atenção a tendências como essas porque pode trazer bons insights para quem está buscando um modelo de negócio que seja atrativo. Um ponto que é preciso olhar com atenção: apostar em tecnologia de ponta, como a Inteligência Artificial, que pode lhe gerar dados em busca de padrões e comportamentos, trazendo valor ao seu negócio.
FICHA
INGRID BARTH
Cidade natal: São Paulo (SP)
Idade: 38 anos
Formação: Economia pela Universidade Metodista de São Paulo e MBA em Administração pela FIA Business School
Cargo atual: Cofundadora e atual COO da Linker. Presidente da Associação Brasileira das Startups (ABStartup)