Não é incomum as pessoas sentarem a minha frente e desabafarem: vim aqui porque desta vez eu quero fazer da maneira certa. Foi o caso do Carlos, um empresário do ramo de óticas, que estava há três meses tocando o seu terceiro empreendimento. Os dois primeiros tinham quebrado.
Tecnicamente, pode-se definir o enquadramento de uma empresa, se ela é micro, ou empresa de pequeno porte, ou média ou ainda empreendedor individual, pelo seu faturamento, ou número de empregados. Mas, podemos perceber de maneira inconfundível a qual segmento o empresário pertence pelas suas características pessoais. Se a pessoa é do tipo “tudo eu”, que mesmo tendo empregados, centraliza todas as responsabilidades; tem prazer de fazer sempre de seu jeito; está sempre com pressa e nunca tem tempo para nada; mistura lado pessoal com lado profissional e, especialmente, sente orgulho de ser um empresário que bota a “mão na massa”, então certamente estamos diante de um microempresário.
Era o caso do Carlos, 40 anos de idade, calça jeans, camisa fora das calças. O jeans de um azul tradicional, a camisa na cor amarela com listas largas pretas e florais brancos. Usava óculos comuns, de aro fino, na cor preta.
Para dar continuidade a nossa conversa perguntei se tinha assistido ao filme “Avatar”. Com o semblante intrigado, de quem não tinha entendido a razão da pergunta, e piscando rapidamente três vezes respondeu que sim, que tinha assistido.
Disse a ele que as pessoas que investem em filmes cinematográficos sabem perfeitamente que estão participando de um jogo, cujo único objetivo é a bilheteria. O jogo é muito simples. Se a bilheteria alcança vendas suficientes para cobrir todos os custos realizados e obtém um saldo financeiro vultoso, então os investidores permanecem no jogo e estão aptos a fazerem um novo filme. Se, ao contrário, as vendas são fracas e eles ficam endividados, então estão fora do jogo, isto é, não mais conseguirão produzir uma nova película. A menos, claro, que consigam um dinheiro novo para uma nova rodada, o que não será uma tarefa fácil por causa do fracasso anterior.
O jogo funciona da seguinte maneira: cada aposta é como atirar uma flecha que tem que passar por dentro de uma série de argolas em movimento para atingir o alvo (a bilheteria). Isto significa que, num dado momento, todas as argolas têm que ficar alinhadas para que a flecha não se desvie e atinja o alvo. O Carlos se remexeu na cadeira, piscou rápido três vezes e expressou em seu olhar a pergunta não falada: mas de que argolas você está falando? Sem ele perguntar, eu respondi: as argolas na verdade são os itens necessários ao sucesso do filme. Tem que ter uma história surpreendente, tem que estar de acordo com a tendência do mercado (ação, desastre, ficção, romance, etc.), atores talentosos, um diretor experiente com mão firme, um roteirista competente, personagens marcantes, uma distribuição garantida e um promotor de vendas excepcional.
Sem que desse tempo do Carlos piscar rápido novamente me apressei e informei a ele que na microempresa é a mesma coisa. O empresário, conscientemente ou não, está participando de um jogo. O jogo empresarial igualmente é muito simples. Também tem um único objetivo: as vendas (a bilheteria). Se as vendas forem suficientes e com lucro, a empresa gera saldo financeiro e o empresário continua no jogo (pode pagar todas as despesas e comprar novas mercadorias/insumo para continuar vendendo). Caso contrário, acumula dívidas e, se não conseguir dinheiro novo, está fora do jogo. Na essência, o jogo empresarial tem três variáveis: vendas, reservas financeiras e dívidas.
Agora o Carlos voltou a piscar rápido, três vezes. Com olhar desesperado e fixo em mim, perguntava: quais são as benditas argolas da microempresa que têm que ser alinhadas? Novamente sem que ele perguntasse verbalmente eu respondi. Você já sabe quais são as argolas que tem que ser alinhadas para o seu cinema lotar todos os dias: um produto surpreendente, inovador, de qualidade, que as pessoas precisem e desejem comprar, um atendimento impecável, preços justos, uma propaganda superbacana, administração dos custos, planejamento, mapeamento de processos e padronização de procedimentos. Esta é a maneira certa de se tocar uma microempresa. Mas isto você já sabia. Você veio aqui em busca de algo mais.
Algo mais – você veio em busca de uma solução para a confusão do dia a dia de toda a microempresa, onde há uma mistura total dos diversos papéis que todo empresário enfrenta. Ele é um faz tudo: é diretor, roteirista, ator, personagens e promotor de vendas. É ele quem abre o cinema, cuida da bilheteria, toca o filme, representa os per
lução nem para um nem para o outro jogo, mas tinha três encaminhamentos para fazer.
Para vencer o jogo empresarial (1) precisava imediatamente buscar consultoria, pois ninguém consegue ser bom em tudo (diretor, ator, roteirista, etc.). Para vencer o jogo da vida tinha que (2) se tornar um avatar de si próprio e, como no filme de mesmo nome, ser capaz de se observar como se estivesse fora de seu corpo e transformar cada momento de estresse em calma, de medo em coragem, de raiva em compaixão, de pessimista em otimista. E, finalmente, tinha que (3) deixar de ser um “tudo eu” e achar um jeito de compartilhar suas responsabilidades com sua equipe. Isto certamente vai afetar positivamente os dois tipos de jogos.
Diante de seu olhar de espanto, acrescentei: sei que é fácil para eu falar e difícil para você realizar, mas tentar é preciso. Afinal, você, como milhões de outros microempresários, é a aposta de um Brasil mais próspero. Portanto, aprenda a buscar a sorte no jogo empresarial e no jogo da vida. Torne-se um vencedor, você consegue.
Diante do sorriso largo que o Carlos finalmente abriu, agora já relaxado e antes que se levantasse e fosse embora, ainda recomendei: aprenda a respirar lento, buscar conhecimento e pôr a mão na massa com mais talento. Em outras palavras, aprenda o jogo da microempresa, pare de correr e comece a lucrar.