O que é capaz um simples box

Beto Box 32 Mercado Público

Beto Box 32 Mercado Público

– Um cafezinho, por favor
O pedido foi feito minutos depois das 6 horas da manhã pelo bancário
aposentado Harry Correa, que por muitos anos trabalhou no Banco do
Brasil, em Florianópolis, e morreu no ano passado aos 95 anos. Ele veio no
Mercado Público para comprar peixe e aproveitou para tomar um
cafezinho por ali mesmo. Se encostou num box, sem saber que, naquele
momento, naquele dia, 3 de março de 1984, esse espaço abria as portas
pela primeira vez. O local ficou conhecido como o Box 32 e o dono do box
ficou conhecido como o Beto do Box 32, um empreendedor manezinho da
Ilha e verdadeiro “influencer” da arte de bem servir, já perto de completar
40 anos nessa jornada.
Depois do Harry, passou e passa até hoje pelo Box 32 presidentes da
República, vencedores de Nobel, escritores, jornalistas, artistas, atletas,
famosos, sempre lado a lado com os menos ilustres. Mas todos são
atendidos com a mesma mesura, dedicação e eficiência. Para beber, da
popular cachaça de Luiz Alves até a legítima champagne francesa. Para
comer, do salmão e bacalhau, até o mais pedido pastel de camarão. “O
melhor do mundo”, diz a lenda.
Para comprar o Box 32, Beto passou vendeu um posto de gasolina, na
época ainda uma verdadeira mina de ganhar dinheiro. Foi chamado de
louco. Rótulo que foi reforçado quando decidiu usar esse dinheiro, veja só,
para comprar um mísero box no Mercado Público, um negócio que tinha
tudo para ser marginal, fadado ao insucesso.
Desde o primeiro dia, para aumentar a fila puxada pelo Harry Correa, Beto
foi engenhoso e inovador. Se um cliente pedia, por exemplo, Vinho do
Porto e o Box 32 não tinha naquele dia, Beto reconhecia a falta e na
mesma hora dizia que não tinha naquele dia, mas na próxima vinda dele,
ia ter. O Beto anotava o telefone desse cliente e quando chegava o Vinho
do Porto chamava ele que assim passava a aumentar a fila no balcão do
box.

Com maestria Beto sempre plantou pequenas notas com fotos nos jornais
locais. Entre essas fotos as que mais repercutiam eram de damas finas da
sociedade no balcão do Box, se achando todas, mais ainda com uma taça
de champagne. Na época uma nota dessa tinha mais força do que todas as
redes sociais de hoje, juntas.
O sucesso do Beto no Box nesses anos todos pode ser medido por uma
figura imaginária. Se for juntar, lado a lado, todos os copos de chopinho e
taças de champagne/espumantes daria para completar 4 voltas no planeta
terra.
Para o Beto, servir é uma vocação. “Todo dia, a partir do momento que
você abre as portas, você tem que estar disposto a atender bem, com
toda atenção, todos os clientes que chegam no seu balcão”, sentencia.
O reconhecimento do valor das pessoas sempre foi uma marca dele. Do
amigo pessoal, assíduo frequentador e confidente, Túlio Carpes, Beto
chegou a fazer um cálculo. Se fosse considerado em todo o tempo do Box
32 os cafezinhos e chopinhos que ele tomou no balcão, que não cobrou
dele, daria para comprar um apartamento na Beira Mar. Do poeta Zininho,
autor do hino de amor a Ilha, Beto também nunca cobrou pelo cafezinho e
nem pelo chopinho, pela consideração que tinha por ele. Mas um dia o
Beto não estava Box e o Zininho pediu para fechar a conta. Uma
atendente passou a comanda com o valor do que consumiu: um cafezinho
e um chopp. Zininho pagou mas saiu dali esbravejando: “Não venho mais
aqui. Isso aqui é uma roubalheira”.
Sobre o pagamento de cliente, Beto nunca esquece o primeiro cafezinho
que serviu para o Harry Correa. Disse que por ele ser o primeiro cliente
não cobraria o cafezinho. Harry retrucou na hora.
– Faço questão de pagar para você ter muita sorte, sempre.

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