Na minha trajetória de mais de quatro décadas como jornalista focado no empreendedorismo, só lembro de uma entrevista que tive muita vontade de fazer e não consegui até hoje. Logo com o maior empreendedor brasileiro das últimas décadas, por quem tenho o maior respeito e admiração: Jorge Paulo Lemann.
Neste Dia do Empreendedor (5 de outubro) puxo da memória a primeira vez que estive com ele, frente a frente. Foi no Clube dos Caiçaras, na Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro. Na época, metade dos anos 80, eu era editor executivo de economia no jornal O Globo. Sabia que ali no clube Lemann treinava tênis com amigos todas as segundas-feiras.
Fiquei na arquibancada a espera de terminar o treino para me aproximar dele e solicitar uma entrevista, no melhor local e horário para ele. Quando terminou o treino desci a arquibancada e fiquei no caminho que ele iria passar para chegar no vestuário. Quando se aproximou, cumprimentei e me apresentei. Ele pegou a tolha da mão, passou no rosto e com um sorriso falou bem calmo.
– Desculpe, não dou entrevista para ninguém.
Nessa época Lemann já era uma referência no mercado brasileiro. Transformou deste o jeito de trabalhar até o capitalismo brasileiro como um todo. Foi o primeiro executivo que derrubou todas as paredes do escritório. Ele e os diretores ficavam no meio de um salão, aberto, as voltas de todos que trabalhavam na empresa, na época o Garantia, uma espécie de banco de investimentos.
Era muito aplicado no tênis (disputou e ganhou títulos em campeonatos nacionais e internacionais. Passou esse espírito para os negócios. Sempre acompanhei seus lances, dele e dos fiéis sócios e companheiros até hoje, Marcel Telles e Beto Sucupira. Sempre foram muito atuantes no mercado financeiro, mas sempre também com muita descrição.
Na época que procurei ele no clube carioca, Lemann e seus sócios compravam aos poucos, no pegão a viva voz da Bolsa de Valores do Rio de Janeiro, ações da maior cervejaria brasileira, a Brahma. O lance deles era comprar no primeiro momento uma quantidade suficiente que dava o direito de indicar um diretor no conselho de administração para influir numa gestão eficiente da empresa. Quando conseguiam isso compravam uma quantidade maior com o direito de indicar a diretoria da empresa. O passo seguinte era comprar a empresa. Assim assumiram a Brahma. Tudo de forma transparente, legal.
Depois da Brahma a mira foi a Cervejaria Antarctica. Compraram a Antarctica e partiram para os Estados Unidos e América Latina. Hoje são donos da maior cadeia de cervejas do mundo, a AbinBev.
Lemann se aproximou do maior investidor da história, o americano Warren Buffet e juntos compraram a Kraft-Heinz a maior indústria de extratos de tomate do mundo. Hoje também detém a maior rede de lances do mundo, a Burger king e a maior fabricante de persianas do mundo, a Hunter Douglas, última compra, por U$ 7,1 bilhões.
Depois do sequestro dos seus dois filhos no Rio de Janeiro, Lemann que completou 83 anos no dia 26 de agosto, vive com a família na Suíça, de onde comanda todos os negócios.
Fora dos negócios, dedica um bom tempo para a educação no Brasil, em todos os níveis. Criou a Fundação Lemann com uma preocupação especial: formar novos e mais preparados gestores de política econômica e social.
Lemann aceita a classificação dele como um sonhador. Mas para ele sonhar grande ou pequeno dá o mesmo trabalho. Por isso busca sempre o sonho grande.