Deram-me a tarefa de escrever um artigo sobre equilíbrio emocional voltado para empreendedores, considerando todo o contexto da pandemia da Covid-19. Estamos vivendo a maior tragédia sanitária dos últimos 100 anos. Isolados em nossas casas, longe das pessoas que amamos, estamos administrando remotamente nossos negócios, em meio a incertezas e dificuldades extremas, nunca experimentadas por nenhum de nós. Pois bem. Como seria a descrição de uma pessoa equilibrada emocionalmente nesse contexto?
Alternativa A: Alegre, tranquila, jubilosa, sem qualquer traço de ansiedade, cheia de entusiasmo, segura do que deve fazer e confiante.
Alternativa B: Intranquila, vivendo alguns momentos de tristeza, uma certa ansiedade em relação ao futuro, insegura, preocupada e com algum nível de estresse. Por óbvio, no contexto atual, a descrição da alternativa B está mais próxima do que seria equilíbrio emocional do que a descrição da alternativa A, que, na verdade, sugere uma atitude de negação da realidade.
E qual o problema da negação? Nenhum, se ela não trouxesse consigo a inação. A questão é que quando, de fato, o problema existe, a inação só faz agravá-lo. A neurociência nos ajuda a compreender o fenômeno natural e humano da negação. Para fins apenas didáticos – a realidade é bem mais complexa do que isso – nosso cérebro funciona a partir de 2 sistemas (aqui vale citar o livro Rápido e Devagar – Duas formas de Pensar, de Daniel Kahneman).
O sistema 1 é rápido, intuitivo e inconsciente. O sistema 2 é lento, deliberado e consciente. Para economizar energia, nosso cérebro está treinado para operar predominantemente por meio do sistema 1. Quando negamos uma evidência, um risco estamos operando nesse sistema 1. Não refletimos, não ponderamos. Nosso cérebro só ”pensa” em economizar energia e “finge” que nada está acontecendo.
Aliás, vale dizer, que a predominância desse sistema foi o que nos trouxe até aqui, do ponto de vista evolutivo. Nossos antepassados não tinham muito tempo para refletir se lutavam ou fugiam dos predadores. A decisão tinha que ser rápida e intuitiva.
Hoje, não temos mais predadores, pelo menos como os de outrora, e, portanto, podemos refletir mais, desenvolver mais consciência da realidade – características do funcionamento do sistema 2 – para tomarmos melhores decisões.
Fica aqui, então, a primeira dica para o enfrentamento do momento atual: RESILIÊNCIA, que é a capacidade de primeiro reconhecer situações adversas, sem negá-las e, na sequência, adotar atitude de busca de soluções, sempre com o olhar voltado para o futuro. Ainda que seja necessário viver aquelas situações por algum tempo no presente.
A dica nº 2 é procurar manter um MINDSET POSITIVO E DE CRESCIMENTO. Significa compreender que por mais penosas que sejam as experiências emocionais que possamos estar vivendo nesse momento, elas não nos definem. Podemos ESTAR ansiosos, intranquilos, inseguros, mas NÃO SOMOS ansiosos, intranquilos e inseguros. Essa compreensão é libertadora porque nos dá a certeza de que somos capazes de influenciar consciente e positivamente nossas emoções e sentimentos.
A Psicologia Cognitivo-Comportamental, em linha com a neurociência nesse aspecto, nos ensina que nossas emoções, sentimentos e comportamentos não são determinados pelas situações em si, mas são influenciados pelas percepções e interpretações que temos dessas situações. Sendo assim, podemos escolher as interpretações que nos beneficiam e afastar as que nos prejudicam. Como diz Alain de Bottom, escritor e filósofo, “Não está em nossas mãos a chance de evitar a crise, mas depende muito de nós determinar o que a crise pode significar”.
Daí advém a 3ª dica: AUTOCONTROLE. A partir do momento que podemos interpretar tanto as situações como nossas emoções e sentimentos, adquirimos controle sobre nós mesmos, como vamos nos comportar e reagir aos estímulos. Para isso, só precisamos criar espaço para nosso cérebro funcionar no sistema 2, lembra?, com mais consciência e racionalidade, possibilitando mais acertos nas decisões, o que irá impactar favoravelmente nossa autoestima.
A 4ª dica é, portanto, manter a AUTOESTIMA ELEVADA. Do ponto de vista da psicologia, a autoestima consiste numa avaliação subjetiva que fazemos de nós mesmos e é importante que ela seja realisticamente positiva, para que possamos estar mais confiantes na nossa capacidade de desenvolver ou acessar internamente soluções para as situações que se apresentam.
Por último, a 5ª dica é FOCO – fundamental para sermos mais resilientes, adotarmos um mindset positivo, termos autocontrole e mantermos nossa autoestima elevada. Trata-se da nossa capacidade de desenvolver uma atenção seletiva sobre o que realmente importa numa determinada situação, evitando o mar de distrações, internas e externas, que competem pela nossa atenção.
De acordo com Daniel Goleman – autor do livro Foco – A atenção e seu papel fundamental para o sucesso – “ o foco interno nos põe em sintonia com nossas intuições, nossos valores principais e nossas melhores decisões”. Foco está estreitamente relacionado ao que chamamos de força de vontade que, por sua vez, tem papel determinante no curso de nossas vidas.
Nesse momento em que somos bombardeados diariamente por enorme quantidade de informações, muitas úteis e outras nem tanto, é um desafio ficarmos focados no que verdadeiramente nos é benéfico. É, sem dúvida, um esforço necessário para criarmos em torno de nós uma certa blindagem a fim de que possamos resistir às distrações, enfrentando as dificuldades do presente e mantendo o foco no futuro.
Rogério Gama é Psicólogo, Mestre em Administração de Empresas pela PUC Rio, Master Coach pela SLAC – Sociedade Latino Americana de Coaching e especialista em Psicologia do Trabalho pela FGV RJ e diretor da Associação Brasileira de Franchising Rio de Janeiro (ABF Rio). Autor do livro “Franchising em 101 Perguntas” (a ser lançado oportunamente) e coautor dos livros “Franchising – Aprenda com os Especialistas” e “Franchising nas Linhas e Entrelinhas”