Estudo realizado pela aceleradora Be. Labs aponta que, apesar de ter escolaridade alta, a maior parte delas ganha até três salários mínimos
Marisqueiras, agricultoras, cozinheiras, esteticistas, artesãs — essas mulheres e tantas outras em todo o Brasil, principalmente as da região Nordeste, sentem o peso das mil e uma tarefas executadas no dia a dia e da desigualdade de gênero quando o assunto é empreender. Muitas delas, o equivalente a 78,14% das entrevistadas, relatam que seus empreendimentos surgiram pelo desejo de independência e ter seu próprio negócio.
Este dado faz parte da pesquisa Perfil das Mulheres Empreendedoras do Nordeste, relatório inédito divulgado pela Be. Labs no final de abril, uma aceleradora de negócios e mentoria de empreendimentos femininos do Nordeste, e primeira no Brasil exclusivamente para mulheres.
Das 600 mulheres ouvidas pela pesquisa, 92% afirmam que não deixariam de empreender para aceitar uma vaga de trabalho no regime CLT, isto é, dentro das regras da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) inserida na legislação brasileira.
A fundadora da Be. Labs, Marcela Fujiy, afirma que o relatório revela dados invisibilizados pelos principais institutos de pesquisa do país. “A maior dor do empreendedorismo feminino é ser mulher. Muitas de nós acabam sendo engolidas pelo mar de responsabilidades e tarefas relacionadas principalmente à sua vida doméstica e familiar, e não recebem o apoio necessário para seguir com suas realizações pessoais e profissionais. Muitas delas encaram seus negócios tendo pelo menos um filho que exige cuidados e que as leva à exaustão. O que queremos propor com este levantamento é o resgate dessas mulheres por meio da valorização de seus talentos, do perfil empreendedor e, principalmente, da sua importância na economia”.
Ao analisar o cenário formado por receios e principais dificuldades das empreendedoras nordestinas, a pesquisa aponta que 52,77% das mulheres disseram ter medo constante de fracassar em seus negócios, e que 33,16% encontram dificuldades em conciliar trabalho, estudo, família e vida pessoal. Há ainda um percentual de 18% de mulheres que dizem não ser reconhecidas em seus trabalhos.
Para dar o pontapé inicial nos empreendimentos, 71,70% das usaram recursos de fonte própria como capital, sendo que 47,49% delas ainda possuem dívidas no cartão de crédito. Esse dado corrobora uma pesquisa do Sebrae, segundo a qual o valor médio de empréstimos bancários concedidos às mulheres empreendedoras é cerca de R$13 mil inferior à média dada aos homens, o que significa mais uma barreira impedindo o avanço de mulheres no projeto de ter negócio próprio e uma possível fonte de renda. Outro dado que diz muito sobre o empreendedorismo produzido por essas mulheres é sobre a monetização do negócio. A maioria das mulheres ouvidas, o correspondente a 84,24%, informou que trabalha com venda direta.
Sobre as áreas de atuação das empreendedoras participantes, se sobressaem os negócios relacionados à produção dos mais variados tipos de artesanato, confeitaria e alimentícios, com o equivalente a 41,56% dos negócios listados. E a maior parte desses negócios (82,9%) fatura na faixa de R$ 1 mil a R$ 50 mil ao ano.
Destaca-se no perfil das empreendedoras nordestinas o fato que 26,22% são mulheres pós-graduadas, o que não garante a elas maior retorno financeiro. Mais da metade das entrevistadas (56,11%) relatou receber de um a três salários mínimos (de R$ 1.212 a R$ 3.636 mensais de acordo com o mínimo vigente à época da pesquisa), e 28,05% delas recebem, por mês, menos até que o piso legal. Quando questionadas sobre o negócio ser sua única fonte de renda, quase 72% das mulheres responderam que não.
Esses dados reforçam a precariedade em que se encontra a estrutura financeira dessas empreendedoras, fato que compromete a longevidade de muitas iniciativas e explica a maioria dos negócios femininos ter entre um e três anos de operação, o equivalente a 36,08%. Outra informação relevante aponta que 34% dos negócios femininos não ultrapassam 12 meses.
Sobre a pesquisa
Realizada entre setembro e outubro de 2022, a pesquisa se desenvolveu em seis etapas: estruturação e planejamento, elaboração do instrumento de pesquisa (questionário), pré-teste do instrumento, aplicação do questionário, validação dos dados e redação do relatório.
Foram entrevistadas 600 mulheres empreendedoras nas áreas de comércio, serviços e produção em cinco estados da região Nordeste que apresentaram representatividade de amostra. São eles: Ceará, Paraíba, Pernambuco, Bahia e Alagoas. Foram consideradas mulheres empreendedoras aquelas que gerem algum negócio.
Os resultados da amostragem foram obtidos por meio da aplicação de um questionário online com perguntas baseadas na literatura acerca da temática do empreendedorismo feminino.