Santa Catarina e Amazonas, um modelo e uma tragédia humana

O momento é de olhar com atenção por um aparelho de microscópio dois estados do Brasil – Santa Catarina e o Amazonas – para analisar e entender o que ocorre no sistema de saúde e os efeitos diferentes da pandemia do Coronavírus sobre essas duas regiões.

Para ampliar essas constatações é preciso recorrer a dados levantados pela LifesHUB, uma empresa de big data que detém a mais ampla radiografia sobre o sistema de saúde em todo país.

No dia 30 de março o portal www.empreendedor.com.br publicou um post com dados da LifesHUB que mostrava que Santa Catarina detém no país, entre todos os estados brasileiros, a melhor relação entre o número de habitantes e estabelecimentos de saúde ( hospitais públicos e privados, clínicas, unidades de atendimento e laboratórios médicos). Enquanto essa relação em Santa Catarina é de 2,50, Amazonas é de 0,59, a pior do país.

A primeira morte no Amazonas pelo Coronavírus ocorreu no dia 24 de março, de um homem com apenas 49 anos.  Já em Santa Catarina a primeira morte ocorreu no dia 26 de março, de uma senhora com 86 anos.

Dessas primeiras mortes até a primeira semana de maio, o Amazonas vai registrar mais de 500 vítimas fatais pelo Coronavírus, 10 vezes mais que Santa Catarina que assinalou um total de 52 mortes pela pandemia até este final de semana.

É preciso ressaltar que a população de Santa Catarina, que alcança 8 milhões, é o dobro da população do Amazonas de cerca de 4 milhões de habitantes. Por ter bem mais habitantes, a incidência de infectados e de mortes teria que ser maior em Santa Catarina se comparado com Amazonas e outros estados brasileiros.

A forma como enfrenta e o resultado da luta de Santa Catarina contra o Coronavírus é fruto da construção por décadas de um estado diversificado economicamente e desconcentrado por diferentes cidades, muitas delas completamente independentes. Ao contrário do estado do Amazonas que tem uma forte concentração populacional e de serviços na cidade de Manaus.

Em Santa Catarina as cidades se espalham por todo o estado e crescem economicamente. No litoral se projeta o turismo e o polo de inovação tecnológica.Em Santa Catarina as cidades se espalham e crescem economicamente. No litoral se projeta o turismo e o pólo de inovação tecnológica”.  Aí coloca o seguinte: “Em toda a serra cresce o turismo como um todo, montanhas, as pousadas, os vinhos de altitude e a produção de diferentes frutas, com destaque para a maçã. No Vale do Itajaí, as confecções, indústrias têxteis, empresas de base tecnológica. No Norte a indústria de mecânica, malharias e empresas de tecnologia e inovação. No Oeste, as indústrias de alimentos e no Sul as cerâmicas e o pólo de confecções. Uma cultura também muito forte entre as empresas catarinenses é o de oferecer planos de saúde e de educação aos seus empregados, resultados que ficam evidentes neste momento de pandemia.

Também é preciso considerar que logo aos primeiros sinais da pandemia, Santa Catarina definiu um programa de testes e de isolamento social, com a liberação de funcionamento apenas dos serviços de saúde, produção agrícola e transporte de carga. Já a população do Amazonas demorou para perceber os perigos da pandemia, para testar e isolar, e até hoje, em especial no transporte fluvial, muito utilizado na região, parece que o perigo do Coronavírus não existe na região.

Na verdade, o Amazonas vive no momento uma tragédia humana, anunciada, devido a realidade da sua estrutura de saúde. Todos os hospitais, públicos ou privados, hoje não conseguem recebe mais nenhum paciente. Os mortos, amontoados em sacos plásticos nos próprios hospitais, são apenas cifras, números. O estado já não tem nem mais capacidade de comprar caixões de madeira (a matéria prima abundante na região) e enterrar seus mortos.

Enquanto isso ocorre no Amazonas, Santa Cataria com os dados e análises de big data, monitora diariamente o número de pacientes e a oferta de leitos nos hospitais em todo o Estado. Antes da virada do mês de março para abril, Santa Catarina registrava uma média de apenas 15% (hoje pelo acompanhamento da LifesHUB está em torno de 20%) dos leitos ocupados por doentes com o Coronavírus. Assim, o governo estadual autorizou a reabertura de grande parte do comércio, sendo o primeiro estado brasileiro a tomar essa decisão em maior escala. Mas com um aviso: caso volte a ocorrer um crescimento do número de infectados, o fechamento do comercio em geral será novamente decretado.

Mesmo numa tragédia nacional, o resultado de Santa Catarina pode servir de exemplo para diferentes regiões do país, de como planejar o crescimento econômico, a desconcentração populacional e executar um sistema eficiente de saúde e ao mesmo tempo de educação, que sempre se interligam de forma positiva. O estado em evidência no momento pelo Coronavírus é o Amazonas. Mas a equipe técnica da LifesHUB alerta que pelo menos outros três estados podem em breve seguir o mesmo caminho do Amazonas: Ceara, Pernambuco e Alagoas. A LifesHub defende um tratamento e um controle diferenciado por município, em todo o Brasil. Cada cidade tem que decidir se fecha tudo, em partes e quando abre tudo, com base no número de pessoas infectadas.  O governo catarinense permitiu a orientação e a definição de cada prefeito em relação a forma de enfrentar o Coronavírus e manter a economia local.

Na verdade, já no segundo mês da pandemia, Santa Catarina mostra que para enfrentar e superar o vírus é preciso ao mesmo tempo conjugar, com planejamento e eficiência, cinco verbos diferentes: testar, isolar, atender, salvar e voltar a trabalhar.

Em tempo:  no saudável sistema de saúde de Santa Catarina apareceu no final de março uma mancha grave:  a suspeita autorização da compra de 200 respiradores pulmonares, cada um por R$ 165 mil, no valor total de R$ 33 milhões. Esses valores estão bem acima do mercado. O mais grave é que essa compra teve pagamento adiantado e o governo estadual até hoje não recebeu os equipamentos. A juíza Ana Luisa Schmidt Ramos bloqueou o valor dessa compra na conta da empresa que intermediou a operação.  O secretário da Saúde do estado, Helton Pedroso, pediu demissão na quinta-feira passada. Hoje Assembléia Legislativa abre uma CPI para apurar esse caso.

*Acari Amorim é editor do portal e da revista Empreendedor.

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