Síndrome do impostor: porque é importante reconhecer e se livrar dela

Marcelo Furtado empreendedor

Por Marcelo Furtado, CEO da Convenia*

Existe um obstáculo traiçoeiro em nossas carreiras, uma espécie de sabotador que busca desmerecer nosso trabalho e atribuir o sucesso ao acaso, à sorte, à intervenção divina ou à atuação de outras pessoas. É a “síndrome do impostor”, um sentimento de que seus méritos não pertencem a você e que, bem pelo contrário, na realidade você está na posição errada, aguardando o momento em que será desmascarado como uma fraude.

Em primeiro lugar, isso é muito mais comum do que se imagina. Estima-se que 70% dos profissionais já tenham vivido essa situação em algum ponto da carreira. Albert Einstein passou por isso quando disse, certa vez, que era um “trapaceiro involuntário” que não merecia a atenção que recebeu.

Mas não é porque acontece com frequência que isso deve ser minimizado. A síndrome do impostor é uma questão psicológica importante, que precisa ser trabalhada para não impedir seu crescimento profissional. Este vídeo do Ted-Ed fala sobre o assunto e vale cada um de seus 240 segundos.

A síndrome do impostor faz com que as pessoas não reconheçam suas realizações pessoais e profissionais como fruto de sua capacidade e do seu próprio esforço. Envolve insegurança, baixa autoestima, perfeccionismo, apreensão e o medo de ser identificado como uma fraude. A consequência dele é um sentimento constante de não merecimento dos elogios e conquistas, e uma sensação de inadequação. Em casos sérios, pode se transformar em ansiedade ou depressão.

Seis sinais de que é preciso procurar ajuda

A síndrome do impostor se baseia em uma percepção equivocada do seu próprio valor, que faz com que as recompensas recebidas sejam consideradas exageradas. Há pelo menos 6 formas de agir que funcionam como sinais de alerta:

Esforço exagerado

Aqui não se trata de dedicação às atividades (o que é essencial para o sucesso), mas a uma obsessão por mostrar resultados para justificar o sucesso e eliminar toda dúvida real ou imaginária sobre a capacidade da pessoa em ocupar uma posição ou realizar determinada tarefa.

Autodepreciação

Pessoas com a síndrome do impostor tendem a ser intolerantes em relação às próprias falhas, se cobram demais e buscam agradar outras pessoas em tudo o que fazem. Não deixa de ser uma consequência do esforço exagerado do item anterior: estar sempre certo e não errar nunca é uma forma de se provar constantemente. Além de ser um imenso fardo.

Medo de ser descoberto

O terror de ser descoberto, avaliado e desmascarado como uma fraude, faz com que o profissional com síndrome do impostor tente passar despercebido, evitando se expor e atuando de forma discreta. O lado ruim da discrição é que elas raramente dividem seus medos e angústias, sofrendo sozinhas e realimentando constantemente esse medo de serem descobertas.

Procrastinação

Por medo de serem desmascaradas, as pessoas com síndrome do impostor querem estar sempre 100% corretas. Isso cria o hábito de adiamento de tarefas para que não sejam entregues de forma insatisfatória e sujeita a críticas.

Autossabotagem

O medo do questionamento leva a um exagero na autocobrança. Como para o “impostor” o fracasso inevitavelmente virá, ele se torna cada vez mais ansioso e começa a agir de forma a minar suas próprias conquistas.

Comparação constante

Não basta não se considerar suficiente ou merecedor, a pessoa com síndrome do impostor passa a acreditar que qualquer outro colaborador seria melhor naquela posição. Como sempre compara a visão idealizada que tem de alguém com os seus próprios defeitos, essa é uma comparação extremamente injusta.

Cuide por dentro e por fora

Individualmente, é preciso estar atento para evitar cair na armadilha da síndrome do impostor. Ao mesmo tempo, as empresas precisam criar uma cultura e processos que sejam saudáveis e desarmem esse problema.

Olhando primeiro para cada profissional, é preciso buscar o autoconhecimento e ter inteligência emocional. Saber suas forças e fraquezas é essencial para entender onde é preciso melhorar, quais cobranças são reais e o que é imaginário. Buscar a excelência é ótimo, desde que a pessoa não se destrua. Para não ver fantasmas onde eles não existem, saiba quem você é.

A inteligência emocional caminha junto com esse processo. É ela que ajuda o profissional a entender a diferença entre realidade e percepção, e também a compreender que haverá bons e maus momentos.

Para fortalecer seu autoconhecimento, uma boa dica é compreender os 4 Estágios da Competência, também chamados de 4 Estágios do Aprendizado:

Incompetência inconsciente: é quando não reconhecemos a existência de um gap em nossas competências, pois é algo fora do nosso radar. É impossível aprender algo que nem sabemos que desconhecemos.

Incompetência consciente: acontece quando passamos a reconhecer que existe uma lacuna a ser preenchida no nosso conhecimento ou habilidade. Quando tomamos consciência disso, podemos começar a aprender algo.

Competência consciente: acontece com treinamento, raciocínio e trabalho duro. É quando o profissional se qualifica e muda seus comportamentos para adquirir novas habilidades.

Competência inconsciente: é aquele estágio em que o profissional realiza uma tarefa tão facilmente que a faz sem nem perceber.

Quando entendemos esses estágios, podemos perceber como e para onde evoluir. Isso permite balizar nossas expectativas e compreender que tudo na vida é um processo. Evidentemente, o treinamento nas empresas deve levar esses passos em consideração, já que quem não reconhece que tem um gap precisa ser trabalhado de uma forma diferente de quem já tem competência no assunto.

Mas a empresa pode evoluir em outros pontos para reduzir a síndrome do impostor nas empresas:

1. Tenha uma cultura que aceite o erro

As startups nascem e crescem aceitando que o erro é parte do crescimento. Empresas que são bebês naturalmente caem quando tentam andar. E isso não significa um fracasso. Entretanto, corporações já constituídas, com processos muito bem definidos, tendem a expulsar o erro. Se não se pode errar, não se inova, não se constrói algo diferente, não se cresce.

Para ter uma cultura que aceite o erro como parte da evolução, os líderes da empresa precisam estimular os “bons erros”, que são aqueles que empurram para a frente. Para isso, use técnicas como “two-way doors”, que permitem reverter uma mudança para o estado anterior. Dessa forma, erros catastróficos podem ser apagados rapidamente. Estimule novas ideias, mas dê tempo para que elas amadureçam e entenda que o processo pode ser meio caótico.

2. Adote novas métricas

A forma como a empresa mede o desempenho molda o comportamento das pessoas. Se o seu time é cobrado para executar rapidamente uma tarefa, ele seguirá o que já está definido. Se é preciso inovar, abra espaço para novas medidas, como o faturamento gerado por novas ideias, ou a quantidade de melhorias geradas.

3. Abra espaço para o acolhimento

O ambiente competitivo é duro, e somos todos seres humanos falíveis. Empresas com a mentalidade de 100% de sucesso ignoram as dúvidas e dilemas dos profissionais. Precisamos ser mais acolhedores, tanto nos processos de trabalho quanto na construção das equipes.

Crie oportunidades para que ideias diferentes sejam compartilhadas sem julgamento, conte com profissionais especializados para cuidar da saúde mental dos times, reconheça que não somos máquinas. A pandemia ajudou a deixar claro que cada ser humano reage de uma maneira diferente aos problemas. Acolha essas diferentes visões e crie mecanismos para que a empresa ajude o time a se autoconhecer e evitar a autossabotagem.

A síndrome do impostor atinge todos os níveis profissionais, do CEO ao faxineiro. Ignorar sua existência pode minar a capacidade criativa, intelectual e inovadora dos profissionais, criando pessoas, empresas e negócios incapazes de alcançar todo o seu potencial.

*Marcelo Furtado é administrador de empresas com pós-graduação em engenharia financeira pela Poli-USP. Iniciou sua carreira na Pepsico e posteriormente trabalhou 8 anos com gestão de ativos em hedge funds. É cofundador e CEO da Convenia, primeiro software na nuvem de gestão de departamento pessoal voltado para pequenas e médias empresas no Brasil. Marcelo também atua como professor de Inbound Marketing na ESPM-SP.

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