Problema para alguns, oportunidade de negócio para outros. A necessidade urgente de qualificação do trabalhador brasileiro tem atraído um grupo farto de empreendedores para o segmento da educação. Nunca se viu tantas universidades, escolas de idiomas e cursos profissionalizantes abrindo as portas no Brasil. Outro indicador de efervescência do setor é o forte movimento de fusões e aquisições registrado nos últimos anos. Só no ano passado foram 27 transações, segundo levantamento da consultoria KPMG.
O campeão é o ensino superior privado, com mais de 200 transações na última década. E tudo indica que foi só o começo. Na edição 2012 da Análise Setorial do Ensino Superior Privado, a consultoria Hoper Educação, responsável pelo estudo, estima que há perspectiva de mais de 100 negócios de fusões e aquisições no setor em 2012 e 2013. “Os 12 consolidadores possuem pouco mais do que 30% do mercado, mas podem e querem chegar a 50%, e dinheiro para isto não falta”, destaca o estudo. Um empecilho nesse caminho é a situação financeira desfavorável de grande parte das universidades privadas, o que torna o custo-benefício de aquisição pouco vantajoso para os investidores.
“O processo de fusões e aquisições poderia ser maior se algumas instituições estivessem mais estruturadas financeiramente. Uma tendência que deve ocorrer mais nos próximos anos são fusões e aquisições entre os principais grupos consolidadores do mercado, ou seja, entre as principais instituições que já se encontram melhor: com boa infraestrutura, sem dívidas trabalhistas, com folha de pagamento dentro dos parâmetros do mercado”, explica Alexandre Nonato, analista de comunicação e de estudos de mercado da Hoper Educação.
O fato é que o Brasil é hoje o país com o maior número de instituições de ensino superior privadas, com fins lucrativos. Um segmento que movimenta quase R$ 29,8 bilhões anuais. São mais de 1 mil universidades em funcionamento. Em 2010, elas concentravam 73,2% dos alunos de graduação presencial do País – mais de 6 milhões de estudantes. No entanto, segundo Nonato, de um modo geral o ritmo de crescimento das matrículas vem diminuindo nos últimos anos. No início dos anos 2000, o crescimento anual era maior do que 10%. Hoje, a média de crescimento é menor que 5%. O número de vagas ociosas chega a 1,5 milhão.
Paralelo a este cenário, o que se vê é que os três maiores grupos do segmento – Estácio Participações, Anhanguera Educacional e Kroton Educacional – têm mantido suas apostas sob a seguinte lógica de mercado: se o País sofre com a escassez de qualificação profissional e as universidades públicas não conseguem atender à demanda de brasileiros ávidos por uma graduação, há espaço para instituições privadas. Segundo estudo da Hoper, os “excluídos” pelo sistema universitário público chegam a 1,8 milhão de jovens por ano.
A Estácio já fez cinco aquisições em 2012, as duas últimas foram anunciadas em agosto: a Faculdades Riograndenses (Fargs), de Porto Alegre, e a Uniuol, de João Pessoa. O grupo, controlado pela GP Investimentos, tem mais de 260 mil alunos e atua em 19 estados com 33 instituições de ensino superior. A Kroton, controlada pelo fundo americano Advent, comprou em 2012 a Unirondon, de Mato Grosso, e a Uniasselvi, de Santa Catarina. A companhia tem mais de 400 mil alunos de ensino superior e pós-graduação em 44 campi e 399 polos de educação a distância. Além disso, atua no ensino básico com 771 escolas associadas e cerca de 280 mil alunos.
Uma das grandes apostas da Kroton é o ensino a distância (EaD), que representa quase 66% da base de alunos do ensino superior. No ano passado, a empresa pagou R$ 1,3 bilhão pela Unopar, do Paraná, precursora e referência nesta modalidade de ensino no Brasil. “O EaD vem crescendo em taxas muito maiores do que o ensino presencial”, afirma Rui Fava, vice-presidente de Educação a Distância da companhia. Para Fava, as principais razões para o crescimento do EaD são a capilaridade, ou seja, vai aonde o presencial não consegue chegar, a flexibilidade de estudar sem “atrapalhar” a agenda profissional e familiar e o custo menor das mensalidades.
“O que falta para que esta ferramenta seja melhor aproveitada é acabar com os falsos mitos de que o EaD tem menor qualidade e é menos exigente quanto à cobrança do desempenho dos estudantes. Pelo crescimento e pela comprovação da qualidade, esses falsos mitos têm diminuído e o EaD, por sua escalabilidade, está contribuindo cada vez mais para a melhoria da qualidade do trabalhador brasileiro”, afirma Fava. Segundo o executivo, o aluno EaD é mais dedicado e isso é verificado no desempenho do Enade, no qual os conceitos dos alunos do EaD são melhores do que dos alunos do ensino presencial.
Franchising
O segmento de educação também vem se destacando no sistema de franquias. De acordo com relatório da Associação Brasileira de Franchising (ABF), o setor faturou R$ 5,9 milhões em 2011, um crescimento de 7,9% em relação a 2010. Outro indicador importante é a evolução do número de redes. Em 2011, 15 novas marcas ingressaram no franchising de educação e treinamento. Todos de olho na necessidade urgente de capacitação de profissionais em função dos eventos esportivos que o País vai sediar e na disposição da classe C em investir na própria qualificação.
“Temos um novo país dentro do Brasil, uma classe emergente formada por 40 milhões de novos consumidores que, depois de alimentação e vestuário, querem investir em educação”, afirma Carlos Wizard Martins, presidente do Grupo Multi Holding (leia-se Wizard Idiomas), que atua no mercado de ensino de idiomas, informática e profissionalizante. Nos últimos três anos, a Multi promoveu uma série de aquisições, provando seu otimismo com o setor. Foram absorvidas as marcas Skill, People, SOS Computadores, Microlins, Bit Company, Quatrum e Yázigi (leia mais na página 28).
O empreendedor David Pinto sentiu na própria pele a dificuldade da escassez de mão de obra qualificada e resolveu fazer do limão uma limonada. Em 2010, ele fundou a Doutor Resolve, rede de franquias especializada em serviços de reparos e reformas em imóveis. O negócio estourou e hoje são mais de 500 unidades franqueadas no Brasil inteiro. O problema é que os franqueados da marca começaram a reclamar da dificuldade em contratar profissionais preparados para atuar em suas unidades, como encanador, eletricista, pedreiro e pintor.
Como bom empreendedor, Pinto decidiu resolver o problema criando outra franquia, o Instituto da Construção (IC), focado na qualificação profissional para o mercado da construção civil. Lançado no mercado em dezembro do ano passado, o IC fechou o primeiro semestre deste ano com 30 franquias vendidas. A meta para o ano é chegar a 60 unidades e faturar R$ 10 milhões. “Logo nos três primeiros meses tivemos 600 alunos matriculados na unidade de São José do Rio Preto (SP), que hoje está com 1 mil alunos”, conta Pinto. “Queremos resolver o problema da falta de mão de obra na construção civil, o setor que mais emprega no Brasil. A meta é 100 mil alunos em cinco anos.”