Empreendedor precisa buscar ajuda adequada e confiar nas instituições

Uma verdadeira rede de apoio está disponível para auxiliar a todo tipo de empreendedor. Porém, é preciso buscar a ajuda adequada e confiar nas instituições apoiadoras

por Raquel Rezende

Apesar da sensação de solidão que a maioria dos empreendedores brasileiros sente – conforme demonstrou o último levantamento do Global Entrepreneurship Monitor (GEM) Brasil, em 2012, que procurou saber o número de empresários que buscam auxílio nos órgãos de apoio –, na prática, esse sentimento pode ser uma ilusão. Inúmeras instituições, entre elas Sebrae, Senai, Senac, Instituto Brasileiro de Qualidade e Produtividade (IBQP), Associação Brasileira de Franchising (ABF) e Endeavor, possuem programas destinados a ajudar os microempresários, desde auxiliar na elaboração do plano de negócios da empresa até ajudar a executar uma proposta para obtenção de recursos com o propósito de colocar no mercado determinado produto ou serviço.

De acordo com a pesquisa sobre o perfil do empreendedor brasileiro apurado pelo GEM Brasil, a grande maioria – 82,2% – não procura nenhum tipo de ajuda para seu negócio. Os percentuais variam de região para região, sendo que no Sul e Sudeste o percentual é mais baixo, mas ainda assim fica entre 77% e 81%. Em relação aos órgãos de apoio pesquisados, o Sebrae se destaca, sendo citado por 13% dos entrevistados. O GEM, de abrangência mundial, avalia anualmente o nível nacional da atividade empreendedora. A pesquisa é executada no Brasil desde o ano 2000 pelo IBQP.

Para Marcos Mueller, coordenador da Endeavor em Santa Catarina – organização internacional que promove a cultura empreendedora por meio do suporte a empreendedores de alto impacto –, os números apresentados pela pesquisa GEM podem ser explicados avaliando-se duas facetas da situação: de um lado os próprios órgãos de apoio, que criaram fama de ser burocratas e atrasados; e, de outro lado, o próprio empreendedor que, historicamente, é muito cheio de si e acha que consegue sozinho fazer tudo. “Esse sentimento de autossuficiência do microempresário é muito bom, porém faz com que ele deixe de enxergar um braço amigo, um fundo de investimento, um apoio que possa auxiliá-lo no crescimento da empresa”, afirma Mueller.

O coordenador da Endeavor catarinense cita como um exemplo de apoio ao mi croempresário o governo de Santa Catarina que, segundo ele, está oferecendo novas maneiras de acelerar os processos de aberturas de empresas junto a programas especiais que incentivam a criação de novos negócios. “O programa Sinapse da Inovação é um deles. O conceito do projeto se baseia em gerar conteúdos e tecnologias através da transformação da ciência em protótipo e depois produto. E os recursos para desenvolver a proposta vêm da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina (Fapesc) e da Fundação Certi”, conta Mueller. Para ele, essas atitudes mostram que o governo também está pronto para ajudar.

Mueller acredita que o ganho de confiança do empreendedor nos órgãos especializados para ajudá-lo vai acontecer com o tempo. “As agências apoiadoras pagam pelo ranço histórico e o empreendedor, por sua vez, acha que ele não pode dividir o negócio com ninguém. O microempresário pensa: ‘Não vou vender um pedaço da minha empresa para um fundo de investimento para receber esse aporte’. Mas, nos últimos três ou quatro anos, percebemos que as empresas não conseguem mais crescer sozinhas”, avalia Mueller.

E para contribuir com a expansão dos negócios das empresas, a Endeavor atua em sete estados e ajuda corporações que crescem mais de 20% ao ano e por isso são consideradas de alto impacto. Mueller explica que o número de empresas de alto impacto no Brasil é de apenas 1%, correspondendo a cerca de 30 mil empresas, porém elas são responsáveis por criar 50% dos novos postos de trabalho. Para ele, os altos impostos e a grande burocratização existentes no Brasil são fatores que impedem o crescimento. “Estamos aqui para aumentar esse número para 2%, 3%, 4%. Lembro que essa estatística é global e muito influenciada pelo contexto histórico e econômico dos países”, enfatiza Mueller.

Segundo o coordenador, a estratégia de trabalho da organização para dinamizar a economia e elevar o número de empresas de alto impacto se concentra em três importantes ações. Primeiro, busca-se entender a região onde as empresas com potencial estão instaladas, depois são identificados os negócios que possuem destaque e, para terminar, essas empresas passam por uma avaliação. “Aqui em Santa Catarina avaliamos 3 mil empresas que, após passarem por uma série de bancas, selecionamos 17. E foi nosso recorde. Geralmente selecionamos 10. E uma vez que o empreendedor passa por isso ele vira uma empresa Endeavor”, afirma.

Ser uma empresa Endeavor significa ter os principais líderes empresariais e executivos à disposição para ajudá-las a crescer. “Coaching, networking, espaço para discutir atalhos e pontos de virada, enfim, ter à disposição a experiência de outros empresários é vital. Assim, essas empresas novas não precisam errar, baseadas nas experiências desses empresários”, comenta Mueller. Além disso, ele acrescenta que a Endeavor tem parceria com as maiores universidades do mundo e coloca os melhores talentos dessas instituições na empresa por três meses. Para completar, corporações que desenvolvem softwares disponibilizam subsídios agressivos para apoiar o crescimento das empresas Endeavor. Com todo esse movimento incentivando a expansão, o portfólio dessas empresas cresce em média 40% ao ano. “No Brasil, 57 empresas são empreendedoras Endeavor e os números de crescimento ficam nesse patamar”, destaca Mueller.

Para uma empresa crescer e ser referência em seu segmento, na avaliação de Mueller, a figura do empreendedor deve ser muito marcante. “A Endeavor entendeu que nos países com dificuldades econômicas faltavam exemplos de empreendedores para seguir.” De acordo com ele, o fato de a empresa ter uma pessoa inspiradora que outras possam ver nela a figura de um líder, somado a diferenciais competitivos como produto inovador, marca forte e presença de mercado, fazem de qualquer negócio um sucesso. Por isso, ele defende que é preciso pensar na pessoa que inspira o negócio. “Assim, outras pessoas terão um exemplo parecido e próximo que estava na mesma situação e conseguiu empreender, crescer.”

Da casa para o mundo

Em 2012, a Uatt? faturou R$ 102 mi, 60% a mais do que no ano anterior e hoje possui 70 franquias espalhadas pelo país

Os sócios Rafael Biasotto e Ivan Oliveira são exemplo de microempresários que conseguiram crescer começando com uma ideia e colocando em prática na sala de casa. Com espírito empreendedor e criativo, Rafael Biasotto começou a criar e fabricar, em uma sala da família, em Florianópolis, objetos confeccionados em polipropileno, como luminárias e porta-retratos. Depois, uniu-se a um colega de faculdade, Ivan Oliveira. E à medida que o negócio foi dando certo tiveram que se mudar para um local mais amplo. Diversificando os materiais, como tecidos, papel e metal, a empresa passou a fabricar e revender seus presentes para todo o mercado brasileiro, tornando-se, mais tarde, a conhecida Uatt?.

O nome “Uatt?” surgiu em 2008 e vem do inglês “what?”, que significa “o quê?,” e foi modificado para esta forma para se adaptar ao “manezinho” – linguagem típica dos florianopolitanos. Com a abertura de duas lojas próprias, a empresa começou a traçar um novo posicionamento de marca, apostando no gesto de presentear com emoções, cores e alegria. Em julho de 2010, após um estudo de mercado, a marca foi remodelada desde sua identidade visual até o ponto de venda para ir ao encontro, cada vez mais, deste novo posicionamento. “Hoje, com 11 anos de mercado, a Uatt? conta com uma equipe criativa e disposta a levar o slogan da empresa realmente ao pé da letra: espalhar coisas boas por aí! O objetivo é colaborar com o mundo e promover a alegria a todas as pessoas que interagirem de alguma forma com a marca”, afirma Biasotto.

Em 2012, a Uatt? faturou R$ 102 milhões, 60% a mais do que no ano anterior. A marca está em ampla expansão e, em apenas três anos como franquia, já possui 70 unidades espalhadas pelo Brasil. Com esses resultados, chamou a atenção da Endeavor. Assim, os sócios Rafael Biasotto e Ivan Oliveira tiveram que enfrentar uma série de aprovações para mostrar que a Uatt? tem amplo potencial de crescimento e de desenvolvimento, é inovadora, ética, e tem, em suas raízes, empreendedores com grandes sonhos, apaixonados pelo que fazem e que acreditam no próprio negócio. “Ser o Empreendedor Endeavor é também uma grande responsabilidade. A proposta é que seu crescimento seja refletido no desenvolvimento de toda a região, contribuindo para a geração de emprego e renda. A história dos empreendedores deve ser, principalmente, um grande exemplo para a sociedade e uma inspiração para outros empresários”, explica Juliano Seabra, diretor-geral da Endeavor no Brasil.

Antes de se tornar uma empresa Endeavor, a Uatt? foi avaliada por outros grandes nomes como Marcelo Alecrim, dos Postos Ale, e Mario Chady, do Spoleto, durante um Painel Nacional, realizado no Rio de Janeiro. Por fim, os sócios da marca participaram do 46º Painel Internacional, em Miami, que contou com empreendedores de 10 países, representando 28 empresas, sendo sete delas brasileiras. “A Uatt? foi aprovada por unanimidade por seis avaliadores internacionais. E, pela primeira vez, uma empresa de Florianópolis foi escolhida. Esse reconhecimento é emocionante e prova que todo o trabalho que realizamos valeu a pena”, acrescenta Oliveira. Na avaliação de Marcos Mueller, a Uatt? é uma empresa única que, além de possuir diversos diferenciais competitivos, atua em um mercado em franca expansão e conta com dois empreendedores cheios de experiência e vontade de fazer acontecer. “Esta é a fórmula do sucesso”, afirma Mueller.

Desde que se tornou uma empresa Endeavor, a Uatt? passa a ter um gestor da Endeavor que vai participar de reuniões de planejamento, estratégias, dar orientações sobre auditorias, implantar uma governança corporativa, entre outros benefícios com o propósito de fazer a Uatt? crescer cada vez mais. Para o sócio-diretor da Uatt?, Rafael Biasotto, com o apoio da organização novas formas de atuação serão utilizadas para a condução desse crescimento. “Vamos transformar desafios em oportunidades, pois com a troca de experiências que a rede oferece teremos melhores gestores no mercado, o que lhes permite visualizar melhores resultados. Isso é um sonho. E pensar que comecei a Uatt? há 11 anos, nos fundos de casa, com R$ 18 mil apenas”, conta Biasotto.

O empreendedor é formado em administração de empresas pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e desde muito cedo começou a empreender, mas confessa que buscou o apoio do Sebrae somente anos antes de fundar a empresa. “Queria entender e ver o que eles podiam oferecer, mas, infelizmente, não consegui sentir neles um ponto de apoio seguro para desafios reais que passei como empreendedor, por isso fui buscar no mercado e em outras experiências apoio para trazer as soluções que precisava”, relata.

Na opinião do sócio-diretor da Uatt?, os órgãos de apoio deveriam oferecer mais treinamento inicial a novos empreendedores, como criar turmas e conteúdos específicos para quem está abrindo seu negócio. “Apenas livros e manuais não são o ideal, pois quem está no início não consegue ter uma visão como um todo do que realmente é empreender”, observa. Para ele, as instituições apoiadoras orientam principalmente pessoas que têm um sonho, mas que não têm base nenhuma para compreender as reais demandas e desafios de empreender, ou seja, trabalham os aspectos da base para que o futuro empresário possa dar os primeiros passos. “Acredito que esses órgãos têm que fortalecer ainda mais o processo de informação e formação de empreendedores. Cursos presenciais e digitais serão muito bem-vindos. Os empreendedores têm que sentir segurança e apoio real neles. Os órgãos de apoio devem ser um lugar para conhecimento e compartilhamento de desafios”, destaca.

Por outro lado, Biasotto avalia que o Sebrae tem evoluído muito a interface com o mercado, porém acredita que falta ainda trazer exemplos, cases e práticas de empreendedores de sucesso que já trilharam caminhos e que podem compartilhar com o mercado e com novos empreendedores – assim, mais pessoas ficariam interessadas em procurar auxílio dos órgãos de apoio. “Falo isso, pois os empreendedores têm que admirar e buscar pessoas com experiência, referência e que eles admiram, por isso gosto do modelo da Endeavor, pois traz os melhores para trocar experiências e visões”, conclui.

 

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