por Roberto Adami Tranjan
Acompanhe este diálogo:
– Você sabe em que dia do mês estamos? – pergunta o diretor da empresa ao gerente de vendas.
– Claro! Dia 24. E temos pouquíssimo tempo para encerrar o mês.
– É só isso que tem a dizer? Nenhuma estratégia, nenhuma nova tática de combate, nenhuma rota alternativa, nenhuma bomba-surpresa, nenhum campo minado para os concorrentes?
O gerente financeiro intervém:
– Os estoques estão muito elevados e a fábrica continua operando a 75% da capacidade. Nossos custos financeiros estão subindo. Precisamos aumentar o faturamento até o fim do mês, caso contrário teremos uma queda acentuada na rentabilidade.
– Vamos transformar esses estoques em contas a receber – decide o diretor.
– Ao ataque! Precisamos buscar dinheiro no mercado.
– Penso que devemos criar um sistema de premiação para os vendedores, emergencial, de curtíssimo prazo. Isso vai motivar a equipe a atingir a meta – sugere o gerente de vendas.
– É isso, acene com dinheiro e vai ver como o pessoal é capaz de tirar leite de pedra – reafirma o diretor.
– Mas também vamos cortar a cabeça daqueles que não dão conta do recado. Precisamos gerar caixa, mesmo que haja mortos e feridos.
– Podemos também aumentar os descontos nessa reta final do mês – acrescenta o gerente de vendas.
O gerente financeiro torce o nariz:
– É o que temos feito todos os meses. Talvez seja por isso que nossos clientes 1 7 empreendedor | abril 2013
deixem para comprar nesse período, dificultando nosso fluxo de caixa.
– É que nosso mercado funciona assim – acrescenta, desolado, o gerente de vendas.
– Vamos para cima da concorrência com todas as nossas armas. É matar ou morrer!
E com este brado de guerra, o diretor encerra a reunião, uma cópia perfeita de tantas outras ao final de mês após mês.
Quem está no comando
Diálogos semelhantes são muito comuns. Nessas quase três décadas atuando com líderes e empresas, escuto com muita frequência comentários do tipo: “é que você não conhece meu mercado”, “aqui, a competição é predatória”, “ninguém ajuda ninguém, um quer destruir o outro”, “é um salve-se quem puder”, “os concorrentes estão de olho nos meus clientes e funcionários”, etc., etc., etc.
Ouço essas lamentações em variados ramos de atividade e em diferentes épocas da nossa economia. Não se trata, portanto, de um ramo específico ou das oscilações econômicas, com seus altos e baixos. Tem a ver com quem está no comando. E não estou me referindo ao diretor e seu grupo de gerentes. Quem está no comando tem outro nome. Chama-se medo.
Quando o medo está no comando, não há espaço para a inteligência e a criatividade. Impossível surgir uma ideia brilhante ou uma solução inovadora. Tudo o que se faz é repetir-se, com a mesma tática, a velha e surrada estratégia da recompensa (prêmios e bônus) ou da punição (cabeças vão rolar).
É assim que sobrevivem milhares de empresas: comandadas pelo medo. O máximo que um grupo de líderes consegue – quando se sente acuado diante de desafios aparentemente inatingíveis e com a adrenalina em alta – é produzir pensamentos de chumbo, sob o ímpeto de atacar ou fugir.
Pode-se pensar a estratégia que for, mas nenhuma será mais importante (e eficaz!) do que afugentar o medo e colocar outro comandante em seu lugar.
Aquem entregar a direção
Atente, agora, para o seguinte diálogo entre dois líderes: o diretor de uma empresa controlada pelo medo e o de outra empresa, que soube como se libertar de tão nocivo comandante.
– Você falou sobre seu mercado, a competição, seus produtos, sua fábrica, o novo maquinário, os preços e custos… Mas nem uma palavra sobre os clientes.
– Se não falei foi por descuido. É óbvio que os clientes são importantes. Todos nós sabemos. Sem eles não existe faturamento.
– Todos sabem, mas poucos praticam. Quer ver? Quanto tempo do seu dia você dedica a pensar nas necessidades de seus clientes?
O diretor da empresa controlada pelo medo pensa um pouco e arrisca:
– Falamos todos os dias sobre a carteira de pedidos, quanto tem na produção, na expedição…
– Estou me referindo a gente, não a coisas. Gente com necessidades, problemas a resolver, expectativas a atender, desejos a satisfazer.
O diretor da empresa controlada pelo medo sente-se confuso e arrisca:
– Ora, é para isso que a minha empresa funciona e faz seus produtos. Não estou entendendo aonde você quer chegar.
– Onde está seu interesse e sua atenção? Onde estão os interesses e as atenções em sua empresa? O tempo que vocês dedicam à discussão dos números e problemas internos é o mesmo que investem na discussão das necessidades dos clientes?
Não, não é. O diretor da empresa controlada pelo medo reconhece que as conversas sobre clientes são quase sempre concentradas em tachá-los de aproveitadores, desleais e oportunistas. O medo impede que se desvie a atenção dos próprios interesses e problemas e a dirija para outro lugar.
É o medo que faz com que se enxergue o mercado como uma arena de guerra. Sem trocar o comandante, o mercado não muda. É preciso colocar a curiosidade no lugar do medo. E, para isso, é fundamental interessar-se verdadeiramente pelo cliente. O trabalho é de tamanha magnitude que não haverá tempo de alimentar o medo.
Quando a curiosidade está no comando, a coragem segue à frente, abrindo novos e prósperos caminhos.
* Roberto Adami Tranjan é educador da Cempre Conhecimento & Educação Empresarial (11) 3873-1953/www.cempre.net – roberto.tranjan@cempre.net