Startups incentivam colocar em prática sonho empreendedor

por Raquel Rezende (raquel@empreendedor.com.br)

Um movimento que se intensificou há cerca de cinco anos no Brasil vem transfor­mando o ambiente de negócios. As chama­das start-ups – empresas em geral de base tecnológica, que nascem com uma ideia inovadora e buscam um modelo de negócio escalável – estão inspirando pessoas que atuam em diferentes áreas para colocar em prática seu sonho empreendedor.

Atualmen­te, no Brasil, existem mais de 10 mil start-ups, segundo dados da Associação Brasileira de Start-ups (Abstart-ups), e algumas delas, como Instagram, Samba Tech, Boo-Box e Buscapé, apresentam negócios representa­tivos no mercado internacional. Entretanto, para uma start-up atingir um alto desempe­nho e ser referência em seu segmento, existe um longo caminho a ser trilhado, tanto ou mais difícil que começar uma empresa tradi­cional. Antes de apostar toda a energia nesse formato empresarial, é preciso entender que ter uma ideia que parece fantástica não é ga­rantia para o êxito do negócio.

Para Felipe Matos, diretor operacional do Start-Up Brasil, programa federal de ace­leração de start-ups, o ecossistema de start-ups no Brasil tem evoluído muito, especial­mente nos últimos três anos, na quantidade e qualidade de projetos.

Matos explica que o chamado ecossistema diz respeito aos vá­rios agentes que trabalham para construir um ambiente propício para o desenvolvi­mento das start-ups no País. “Atuam, em conjunto, governo, investidores, investidor anjo (o primeiro investidor que aposta no negócio), universidades que fomentam o empreendedorismo, aceleradoras, escolas de desenvolvimento de negócios e comuni­dades locais. Todos têm criado um ambien­te propício para quem quer empreender no Brasil”, analisa.

Outro sinal é o aumento no número de aceleradoras, hoje são mais de 50. “Visualizamos um número cada vez maior de aporte de capital nas start-ups, permitindo que soluções sejam geradas para movimentar diversos setores no País com competitividade”, avalia.

Na visão de Matos, as start-ups têm sido uma das principais fontes de inovação, crian­do novas tecnologias no País e, por isso, as esferas federal, estadual e municipal devem apoiar o movimento. No âmbito federal, o programa Start-Up Brasil (start-upbrasil.mcti.gov.br) vai realizar duas seleções anuais de start-ups para que recebam aportes finan­ceiros de até R$ 200 mil. E para os empre­endedores que pensam em começar uma start-up, Matos alerta que não basta ter uma ideia, é preciso implementá-la. “Essa ilusão de se ter uma ideia fantástica e, muitas vezes, não querer mostrá-la com medo de alguém roubá-la não passa de mito. Ideia vale pou­co, pois geralmente não é exclusiva. O que vale mesmo é a capacidade de executá-la”, destaca.

Um dos grandes diferenciais do modelo de negócio das start-ups, citado por Matos, é a possibilidade de validar o produto ou ser­viço oferecido pela start-up antes de ser co­locado no mercado. Matos comenta que em vez de fazer um plano de negócio detalhado, é possível criar ciclos menores, desenvol­vendo um produto mínimo viável e, a partir disso, demonstrá-lo em busca de feedbacks reais e, assim, o produto ou serviço é adapta­do ao longo do processo.

Com a proposta de oferecer uma mento­ria para empresas na era da cultura start-up, o livro “O Empreendedor Viável” do publici­tário curitibano André Telles e do jornalista paulista Carlos Matos promete desmistificar a cultura start-up para empreendedores. Na visão dos autores, a ideia que se tem de start-up está mistificada em várias frentes. Primei­ramente, a impressão que se tem é de que start-up se refere apenas a negócios de tec­nologia relacionados à web e empresas que produzem apps. “Trata-se, entretanto, de uma metodologia de condução de modelos de negócio e se aplica a qualquer segmen­to – exemplo disso são empresas europeias e americanas que criam modelos start-up a partir de produtos simples e corriqueiros, como vegetais orgânicos (http://www.farms­tandapp.com) e componentes para reparos (www.sugru.com)”, definem.

Eles comple­mentam que, nesses casos, a internet entra apenas como ferramenta de marketing ou canal de distribuição e vendas. Em empresas tradicionais, apontam Telles e Matos, a me­todologia start-up é mistificada como algo apenas aplicável a negócios inovadores e empresas em formação, mas diversas meto­dologias da chamada cultura start-up podem ser aplicadas ao processo de desenvolvimen­to de qualquer produto ou serviço.

Atualmente, o Brasil conta com cerca de 7,4 milhões de micro e pequenas empresas. Cerca de 80% dessas companhias não so­brevivem ao primeiro ano de vida, segundo estimativas do Sebrae. De acordo com os au­tores do livro, as start-ups estão sujeitas basi­camente ao mesmo cenário de risco avaliado pelo Sebrae. “A diferença é que, sob a meto­dologia de start-ups, a necessidade de capital intensivo para formulação de protótipos ou início de operações são muito menos inten­sos do que sob a metodologia tradicional de formação de empresas.” E devido à agilidade para oferecer soluções, ganham um cenário cada vez mais otimista, especialmente com o fomento dos governos federal e estaduais, além da iniciativa privada.

A obra “O Empreendedor Viável” tam­bém apresenta o conceito do MVE – Empre­endedor Mínimo Viável, que se refere àquele que possui características de liderança, di­namismo e autossuficiência para enfrentar situações de decisão e dilemas do dia a dia de uma empresa em formação.

Telles e Ma­tos explicam que esta é a visão que mercado e investidores têm desse indivíduo – a au­sência de dados concretos de desempenho faz com que as apostas de investidores e do mercado residam no próprio empreendedor e em sua capacidade de execução do mode­lo. “Consideramos que há um perfil mínimo de empreendedor capaz de despertar inte­resse ou atenção em players de mercado e entidades que financiam esses empreendi­mentos”, destacam.

A concentração na execução e preparo multidisciplinar para enfrentar o status de empresário, segundo os autores, reduzem significativamente as probabilidades de fra­casso.  Eles defendem que ignorar a concorrência ou lidar com o cliente apenas de forma remota levam mui­tas empresas ao insucesso. “Para contornar as adversidades, é preciso estar ciente do mercado e seus pontos positivos e negati­vos e conhecer seu público de perto, em seu dia a dia, sempre que possível da forma mais física e pessoal possível”, aconselham.

Além disso, os autores destacam que o empreendedor não pode ser inocente e deve fazer com que sua ideia tenha consis­tência do ponto de vista do faturamento e do lucro. “Um produto que atenda a uma necessidade é bom, mas um produto que atenda a uma necessidade gerando lucros é infinitamente melhor.”

No mundo das start-ups, existem ins­tituições e empresas que tem a missão de orientar e apoiar os negócios. Uma delas é o Angels Club. Com o propósito de auxiliar pessoas que têm o poder de movimentar a sociedade, gerar empregos e fortalecer a economia, o Angels Club é um clube privado de investidores dispostos a fomentar novos projetos, ideias ou start-ups cadastrados em sua plataforma. O vice-presidente de negó­cios e relacionamento da instituição, Junior Borneli, conta que o clube surgiu a partir das experiências pessoais dos fundadores.

De­pois de muitos anos criando negócios que, apesar de serem boas ideias, nunca conse­guiram prosperar por falta de investimento, relacionamento ou alguém que pudesse abrir as portas para a expansão, finalmente conseguiram encontrar um investidor que acreditou em uma de suas ideias. A partir daí, criaram alguns negócios juntos e se tor­naram grandes amigos. “Olhando para esse passado, e para o diferencial que foi encon­trar esse investidor para os nossos projetos, pensamos em criar uma empresa que fizesse a conexão entre empreendedores e investi­dores, que funcionasse como um facilitador, um realizador de sonhos e, sobretudo, um propulsor para o surgimento de novas em­presas e, com isso, a geração de mais empre­gos e renda”, explica Borneli.

Pela ótica do investidor que acredita nos projetos, segundo Borneli, existe uma lacu­na a ser preenchida, pois o investidor possui recursos, recebe propostas constantemente, porém não encontra um ambiente onde tudo isso esteja organizado de forma ágil, facilitada e com seriedade. “O Angels Club existe, de forma organizada, há seis meses, porém os investidores atuam há bastante tempo e têm muita experiência”, diz Borneli.

Nos últimos quatro anos, foram gerados mais de R$ 200 milhões em negócios por meio do Angels Club. Para atingir esse desempenho, Borneli conta que o clube busca empre­endedores que têm boas ideias em todo o País. “Visitamos as principais universidades que possuem incubadoras de empresas e firmamos parcerias com as aceleradoras de empresas”, afirma. O objetivo disso é per­mitir que qualquer pessoa possa colocar seu projeto ou sua ideia na mesa de negociação de centenas de investidores.

A partir da rede de relacionamento criada, o Angels Club reúne investidores de todo o País que partilham dos mesmos princípios do clube: oferecer oportuni­dades, realizar sonhos e construir bons negócios. Para isso é disponibilizada uma plataforma on-line para que os investidores conheçam os projetos publicados pelos empreendedores, iniciem as negociações e troquem mensagens até que o contato avance para um encontro presencial, que é intermediado pelo Angels Club.

Borneli comenta ainda que os investi­dores têm enxergado que colocar dinheiro em empresas, projetos e ideias inovadoras é uma maneira de fugir dos investimentos tradicionais que são bastante influenciáveis pelas crises internacionais. “Além disso, os investidores do Angels Club investem em pessoas e não em papéis, como acontece, por exemplo, na Bolsa de Valores. E como há muitos bons empreendedores, bem preparados e informados, este movimento torna-se ainda mais sólido.”

Acompanhan­do este cenário, as universidades começam a formar mais empreendedores. Isso, de acordo com Borneli, faz toda a diferença para um país em desenvolvimento, que busca crescer mais e se tornar mais com­petitivo, forma um conjunto de fatores que tornam este momento muito favorável para empreender no Brasil. “Cenário este que se manterá pelos próximos anos, impulsiona­do pelos grandes eventos internacionais que serão realizados aqui e pela crescente busca pelo novo”, acredita.

E foi justamente a vontade de querer inovar que impulsionou o designer gráfico Dan Strougo, hoje diretor geral da 99designs no Brasil, a fundar a LogoChef, start-up es­pecializada em entregar trabalhos pontuais de design. Ele conta que identificou a neces­sidade de alguns clientes que não podiam contratar um profissional em tempo integral ou contar com as agências tradicionais por causa do alto custo, então, como já conhe­cia o modelo de marketplace da 99designs – maior agência on-line de design gráfico do mundo – o adaptou para o mercado brasilei­ro. “Fundei a empresa junto com meu colega Davi Goldwasser e começamos a trabalhar na formatação do negócio, aquisição de clientes e aporte de investidores”, relata.

Atualmente, a LogoChef integra a família da 99designs. “A infraestrutura que contamos agora é bem maior. Temos equipes especia­lizadas ao redor do mundo que nos ajudam a concentrar os esforços nas coisas mais importantes para o nosso mercado”, afirma Strougo. A área de tecnologia da 99designs fica na Austrália, o marketing nos Estados Unidos e Strougo fica no Brasil, trabalhando na busca por parcerias estratégicas, aquisi­ção de clientes e atendimento.

A 99designs atua no Brasil há seis meses e o objetivo da empresa, segundo Strougo, é crescer 100% em um ano. A empresa está diversificando os produtos, como os projetos “one-to-one” e os serviços rápidos, além de firmar novas parcerias. Para quem está começando uma start-up, Strougo orienta a criar o modelo e testar assim que possível, e, não se apegar tanto ao plano de negócio e sim testar a proposta. “Enquanto você não fecha o seu primeiro contrato, sua empresa ainda não existe de verdade.”

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