A arte de evitar a guerra

Você recebe, de um candidato a cliente, o pedido de uma cotação de preços. “Oba! Finalmente esse cobiçado cliente caiu em nossas mãos! Um a mais em nossa carteira, um a menos na do concorrente.” – logo pensa.

A animação inicial representada pelo “oba” requer, no entanto, discernimento. Um novo cliente pode mudar o rumo da história, principalmente quando a tática para conquistá-lo está centrada no preço. O preço é e sempre será um componente importante de toda estratégia de negócios. Então não se trata apenas de tirar o pedido e acrescentar cifras às metas de faturamento. É preciso um olhar mais sistêmico.

Única munição

Ouço, com frequência, empresários se queixarem de que o mercado é uma arena de guerra. Principalmente daqueles que estão focados nos pedidos de cotação de preços, limitando assim a relação com os clientes à mera e simplória transação comercial. Diante dessa fria visão mercantil, geralmente o que prevalece é o preço, e que seja o menor. Para muitas empresas, muitas vezes, o preço é a única munição.

Vale a pena conquistar um cliente com base no preço baixo?

Sei que a resposta para essa pergunta não é direta, depende de outras variáveis e interesses. Suponha que a sua estratégia de negócios sempre tenha sido conquistar o cliente com base na tática do barateamento, na intenção de ganhar dinheiro nas próximas vendas a preços mais justos. Tem sido uma boa estratégia? Clientes que compram atraídos só pelo menor preço são pouco fiéis. Não há a me­nor garantia de que possam ser fidelizados. Mais provável é que migrem para o concor­rente por causa de uma cotação 2% menor. Reduzir a margem ao máximo, resvalando até para a negativa, não é, portanto, uma boa tática.

Na hora da cotação, é bom saber por que o atual fornecedor está deixando o cliente ir embora. Talvez por inadimplência. Ou, quem sabe, costume fazer exigências indecorosas. É melhor pensar bem, antes de herdar um “abacaxi” que o concorrente não se esforça em conservar. É “ufa!” para ele, quando você exclama “oba!”. Ao final, quem sai ganhando?

É claro que são conjecturas. Quem sabe o cliente tenha deixado o concorrente por mau atendimento… Mas, nesse caso, não há motivo para conquistá-lo por barateamento. Mesmo assim, ainda existe a probabilidade de um contra-ataque.

Luta inglória

Conquistar o cliente não é o fim da bata­lha. Pode ser o início de uma nova guerra. Se for um mau cliente, o esforço é para livrar-se dele. Se for um bom cliente, o concorrente virá com tudo, na intenção de recuperá-lo. Na disputa, poderá levar outro dos seus clientes. É capaz, até, de forçar você a baixar ainda mais o preço e, por consequência, a margem, para não perder o outro cliente. Assim, aumenta bastante seu risco de que esse problema se alastre, contaminando um terreno antes profícuo.

Essa guerra de preços na disputa por clientes é uma luta inglória: só serve para evi­denciar quem ficará mais pobre antes. E mes­mo que o concorrente não leve o seu cliente na primeira investida, continuará tentando. Dessa forma, desviará sua atenção para um combate nocivo.

Rastilho de pólvora

O maior segredo nesse mercado inter­conectado é que não há mais segredos. O preço baixo que você ofereceu para conquistar o cliente do seu concorrente logo será conhe­cido por seus demais clien­tes. E estes se sentirão menosprezados ao constatar a existên­cia de condições comerciais privilegiadas destinadas a quem acaba de chegar. Provavelmente, eles exigi­rão regalia semelhante! Alguns, mais ressa­biados, podem até forçar um rebaixamento máximo e que isso conste em cláusulas con­tratuais.

Preço baixo é como açúcar para as for­migas. Atrai as que constituem a tropa de batedoras, sempre seguidas por uma legião inteira. Não faltará quem bata à sua porta pleiteando iguais condições. O preço baixo torna-se um novo parâmetro para as próxi­mas negociações e uma expectativa tanto para todos os que compõem sua carteira, como para os que pretenda conquistar e até os concorrentes. Funciona como um rastilho de pólvora.

Concorrente bom é concorrente morto

Ouvi isso certa vez de um empresário. E disse sem pestanejar. Faz mesmo parte do seu conjunto de crenças, dentre outras mais bélicas. Mas fazer com que o concorrente perca ou morra não é inteligente. A ideia de que você ganha quando o seu concorrente perde é uma falácia. Quanto mais ameaçar, acuando seu concorrente e forçando-o a baixar os preços, menos ele terá a perder na guerra de mercado e poderá se tornar agres­sivo a ponto de adotar estratégias kamikazes.

O contra-ataque

Uma nova cotação de preços é solicitada. Dessa vez, quem recebe o pedido é o seu concorrente e você, o fornecedor atual.

“Oba!” – pensa o seu concorrente. – “Es­perava por isso há anos!”

O seu cliente contumaz não se sente mais fidelizado. A tática do menor preço faz com que ele saia em busca de condições mais vantajosas. Incentivado pelo canto de cisne do menor preço, agora está por conta do seu concorrente. E você terá de decidir: conceder o desconto e manter o cliente com baixas margens sabe-se lá até quando ou perdê-lo para o concorrente.

Essa história pode ser real, mas também pode ser fictícia. No mercado de guerra vale tudo. Certos clientes chegam a inventar ofer­tas mirabolantes para obrigar fornecedores a baixarem os preços. Colocam o fornecedor em situação de perda, seja qual for sua de­cisão. Cobrir uma cotação fictícia é jogar di­nheiro fora, mas denunciar a artimanha tam­bém não traz vantagens, podendo romper o elo de confiança entre cliente e fornecedor. A situação é delicada. O que fazer?

O fim da odisseia

Nesse caso, é melhor admitir que o cliente esteja falando a verdade. Mas tentar manter os preços, argumentando a favor dos muitos anos de bons serviços prestados (su­pondo que tenham sido mesmo bons). Se você investiu muito tempo no relacionamen­to, é possível que isso conte a seu favor ou ao menos relativize as diferenças de preços.

Se nada adiantar, melhor um triste fim do que uma tristeza sem fim. Talvez você te­nha de abrir mão do cliente. Sei que isso não soa bem, mas às vezes é melhor um “ufa!” definitivo do que aquele “oba!” precipitado.

Preparar uma cotação de preços exige trabalho concentrado, provavelmente ex­traído do tempo e do esforço a dedicar aos clientes efetivos. E aí está o ponto inicial de uma história que pode ter um enredo feliz: empenhar o coração com lealdade aos clien­tes fidelizados.

Dedicação e lealdade são munições no­bres e constituem arsenais mais poderosos do que os preços e a melhor estratégia para livrar você do risco de entrar na depauperan­te arena de guerra. Para que se volte à busca e conquista de mercados mais avançados.

Roberto Adami Tranjan é escritor e educador da Metanoia Educação nos negócios (www.robertotranjan.com.br / www.facebook.com/RobertoTranjan)

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