*Por Roberto Vilela, consultor empresarial e mentor de negócios
O leitor mais atento com certeza já se deparou, nos últimos meses, com inúmeras pesquisas sobre a mudança de comportamento dos profissionais no mercado de trabalho. Nunca se falou tanto em home office, modelo híbrido e propósito. Questões válidas e importantes, é verdade, mas que muitas vezes apontam para além da primeira impressão.
Em 2021, por exemplo, constatou-se que os pedidos de demissão dos brasileiros foram uma média de 500 mil por mês, segundo levantamento da Lagom Data. O movimento se assemelha ao chamado Great Resignation (grande renúncia, em tradução livre), que ocorre nos Estados Unidos. Enquanto muita gente diz que os números mostram a falta de conformismo com o mais do mesmo ou a busca de propósito, eu acredito que estes dados podem apontar para uma outra tendência nem tão romântica ou positiva assim; a falta de consistência que, em hipótese nenhuma, deveria sobrepujar o talento.
Não é de hoje que acompanho e atuo na formação de lideranças e profissionais – especialmente no setor comercial – e percebo que talento e motivação muitas vezes são vistos, equivocadamente, como o ponto central para a performance profissional.
Talento, para começo de conversa, é algo relativo. Existem muitas pessoas muito boas em determinadas funções – artistas, desenvolvedores, líderes, vendedores, cantores. Elas nascem com a facilidade de performar em determinadas ações e, claro, podem se destacar por isso. Eu jamais alcançaria o sucesso cantando, porque não tenho nenhum talento para isso – mas também sei que existem cantores que fariam jus ao top 10 da Billboard e nem por isso estão próximos de lá. O talento é, portanto, um facilitador, mas por si só não garante o sucesso.
Da mesma forma, motivação é um conceito cada vez mais vago na cabeça dos profissionais e visto como um propulsor essencial para alavancar a carreira. Você até pode nascer com algum talento, mas não nasce motivado. E por mais que aquela palestra ou treinamento te motivou – e, acredite, já vi muita equipe saindo das minhas, pronta para fazer a diferença – nem sempre isso acontece quando a rotina esmagadora chega.
É aí que entra um terceiro fator, que talvez falte para muitos daqueles que compõem a lista dos 500 mil pedidos de demissão mensais: consistência. Não há talento nem motivação no mundo que se sobreponham à consistência. Quando Robert Collier disse que o sucesso é a soma de pequenos esforços repetidos dia sim e no outro também, é sobre consistência que ele fala.
Ninguém é talentoso o suficiente para atingir o sucesso sem esforço: quem confia apenas nesse dom divino que parece lhe agraciar, peca nas pequenas falhas diárias que minam a reputação profissional. O atraso constante nas entregas, a arrogância que aos poucos se instaura, a falta de tato na rotina com clientes e colegas e por aí vai. No fim das contas, um talentoso preguiçoso é só mais um empecilho para o crescimento da empresa.
Outro fator preponderante da consistência é o fato de que será ela que vai te fazer pensar duas vezes antes de ingressar na estatística de demissões. Não se engane: não existe emprego perfeito, e carreira meteórica é para casos raros. Um profissional consistente consegue ver para além dos dias ruins e sabe que conhecimento se leva para a vida. Mesmo sem talento nato, ele pode ser visto naquele empreendedor, líder ou profissional técnico que sempre se esforça para entregar o seu melhor (mesmo que, para o cliente já esteja bom assim, ele sabe que para si ainda não é o suficiente). Melhoria contínua para este perfil é quase um mantra.
E, acredite: é o tipo de pessoa que qualquer líder de sucesso quer ter na empresa. Porque junto com a consistência vem o comprometimento, a clareza sobre a maturidade das etapas (e que não adianta tentar queimar cada uma delas pulando de emprego em emprego) e a certeza de que boas entregas são muito mais sobre suor e trabalho do que sobre talento e sorte.
Você, ao ler este artigo, talvez tenha se lembrado daquele ex-colega, escritor ou empresário de sucesso que admira. Tenha a certeza de que, para cada um deles, os dias foram tão ou mais duros do que o da maioria das pessoas – mudando apenas pela certeza de que seguir no caminho certo exige dedicação diária.