Por Daniel Prianti, cofundador e CSO da BPool*
Abandonar o “greenwashing” e adotar uma nova postura é essencial para posicionar os negócios para o futuro
O alinhamento das empresas a questões ambientais, sociais e de governança (ESG, na sigla em inglês) é um dos grandes desafios do mundo dos negócios nesta década. Para que esse desafio seja superado, é preciso que as empresas mudem a perspectiva sobre o Marketing e passem a utilizar essa área dos negócios de uma forma positiva.
Infelizmente, hoje a associação entre Marketing e ESG tem um forte componente negativo. O greenwashing (a prática de “embalar” práticas como ambiental ou socialmente corretas quando, na realidade, esse rótulo somente encobre os mesmos erros de sempre) é uma tentativa, por enquanto de razoável sucesso, para manter tudo como está. Enquanto isso acontece, porém, o Marketing vai sendo desgastado, fazendo com que o ESG deixe de agregar valor aos negócios.
E é possível agregar muito valor por meio das práticas ESG – desde que os gestores entendam que melhorar os aspectos ambientais, sociais e de governança das empresas deve ser um propósito do negócio, e não uma tentativa de encobrir práticas que têm sido questionadas pela sociedade. Quando abraçadas como parte da personalidade da empresa, os critérios ESG se tornam guias de conduta, antecipando possíveis dificuldades, criando goodwill com os diversos stakeholders e mostrando que a empresa tem em seu DNA o compromisso de contribuir para um mundo melhor.
E essa contribuição gera valor econômico para os negócios. Segundo a consultoria McKinsey, existem pelo menos 5 formas pelas quais uma estratégia ESG bem desenvolvida cria valor para as empresas:
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Crescimento do faturamento: produtos mais sustentáveis tendem a atrair mais clientes, tanto no B2C quanto no B2B, além de desenvolver melhores relações com fornecedores e com governos.
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Redução de custos: a redução no consumo de energia e o menor desperdício de materiais leva, no médio/longo prazo, a uma diminuição das despesas operacionais.
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Intervenções legais e regulatórias: negócios com boas práticas ESG têm mais possibilidade de obter apoio governamental e subsídios, além de atuar em mercados com menos regulação.
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Aumento de produtividade: a busca por melhores práticas ESG aumenta a motivação das equipes e atrai talentos que querem atuar em empresas com as quais compartilhem seu propósito.
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Otimização de ativos e investimentos: a melhor alocação de recursos de longo prazo em equipamentos mais sustentáveis faz com que as empresas evitem investimentos ruins, que não se paguem ao longo do tempo.
Em um ambiente mais instável, em que crises se econômicas, políticas e climáticas se sucedem (e muitas vezes ocorrem ao mesmo tempo), ter uma estratégia ESG sólida, bem estruturada e bem comunicada reforça a “licença social” para o negócio operar. E é aqui que o Marketing pode deixar de ser parte do problema e se tornar parte da solução.
O novo papel do Marketing no ESG
Em empresas que não incorporaram ESG ao propósito do negócio, ocorre um fenômeno que pode ser identificado claramente. Nesses casos, a área de Marketing das empresas é chamada a “dourar a pílula”, posicionando a companhia de uma forma mais favorável junto aos stakeholders.
Isso é particularmente (e infelizmente) real em negócios com um histórico ESG complicado. São empresas que, ao longo do tempo, deram pouca ou nenhuma atenção a casos de racismo, problemas com fornecedores, má qualidade de produtos, processos produtivos altamente tóxicos e práticas contábeis questionáveis. Tradicionalmente, essas empresas utilizam as práticas de Marketing como uma forma de encobrir problemas ou fazer com que eles pareçam menos graves do que realmente são.
Esse tipo de postura é aceito cada vez menos – felizmente. Seja pelas manifestações nas redes sociais ou pelo boicote à compra de produtos da marca, os negócios têm percebido mais claramente os efeitos negativos de não dar atenção aos aspectos ESG do negócio.
Com isso, abre-se uma oportunidade para reposicionar o Marketing e fazer com que ele contribua para disseminar boas práticas ESG, dentro e fora das empresas. Internamente, o endomarketing pode ajudar a comunicar o propósito e o DNA do negócio aos colaboradores. Externamente, a comunicação tempestiva com o mercado, com a imprensa e com os consumidores, e a transparência na divulgação de metas, processos e práticas criam um ciclo virtuoso que leva a empresa a acumular “capital social” para ultrapassar períodos mais delicados.
Veja que o Marketing aliado ao ESG não se dispõe a jogar os problemas para debaixo do tapete, como acontecia antes. O objetivo é criar um loop de comunicação constante, transparência e informação para que os problemas sejam identificados rapidamente – e corrigidos assim que possível.
Um bom exemplo de como o Marketing pode ajudar uma empresa a construir capital ESG de forma sincera é uma companhia que divulgue suas metas socioambientais para o mercado e crie um canal de comunicação para receber feedback – um feedback que seja efetivamente ouvido e aplicado em melhorias. Nesse caso, o ciclo se fecha com a comunicação do que a sociedade cobrou ou sugeriu do negócio, e o que está sendo feito para atender essas demandas.
É preciso superar barreiras culturais para que isso aconteça. Os negócios não podem ser mais vistos como donos de si mesmos: eles são plataformas para que os consumidores expressem suas personalidades e visão de mundo. Dessa forma, as marcas precisam buscar melhorias constantes em processos, práticas e comunicação para continuar a estar alinhadas aos consumidores.
E esse alinhamento gera resultado: os clientes tendem a interagir mais com a marca, ir mais às lojas, comprar mais do seu produto, ter mais tolerância a eventuais erros (e todo mundo erra de vez em quando). E é função do Marketing fazer essa conexão entre as práticas ESG da empresa e a sociedade – em prol do bem de todos, sim, mas também gerando resultados crescimento para os negócios.
* Daniel Prianti é cofundador e CSO na BPool, plataforma líder de serviços de marketing EGM (Enterprise Gateway Marketplace) que transforma a maneira como grandes empresas contratam e gerenciam serviços de marketing nas Américas. Antes disso, liderou por 12 anos estratégias de marketing digital para marcas multinacionais na Router Group, empresa que co-fundou e depois foi vendida à Iris-Worldwide. Após a aquisição, liderou a empresa por mais 4 anos até encerrar o período de earn-out. Daniel é apaixonado por esporte, empreendedorismo, tecnologia e investimentos de impacto: tem um portfólio com mais de 15 investimentos diretos em startups. É também um forte adepto da educação contínua (Berlin School of Creative Leadership, Hyper Island, FGV) e mentor nas aceleradoras da Artemisia, ESPM e no Programa de Empreendedorismo do Sebrae.