Por Beto Sirotsky, cofundador da BPool*
Em vários segmentos do mercado, existem ciclos em que conceitos se tornam predominantes e são depois substituídos por outros modelos de comportamento ou de negócio – só para voltarem a se tornar relevantes algum tempo depois. É o que estamos vendo acontecer na publicidade brasileira.
Vale contar um pouco de história para deixar isso mais claro. A publicidade brasileira cresceu e prosperou a partir de publicitários que não eram somente grandes empreendedores, mas também pessoas capazes de liderar equipes altamente criativas. Em uma espécie de “caos criativo”, grandes ideias eram exploradas, a ousadia era incentivada e o resultado foram campanhas inesquecíveis que até hoje estão em nossa memória afetiva.
Esse pulsante mercado, evidentemente, atraiu a atenção do mundo – até mesmo pela nossa presença constante no pódio dos grandes festivais mundiais. Com o tempo, grandes grupos internacionais decidiram fazer parte desse nosso ecossistema, adquirindo agências, consolidando o mercado e colocando ordem na “boa bagunça” que é típica do jeito brasileiro de trabalhar: muita flexibilidade, muito improviso, pouco processo.
Entretanto, como costuma acontecer em todo segmento, com os controles surge um pensamento mais defensivo. Aos poucos, a cultura foi mudando da ousadia até inconsequente para processos, controles, linhas longas de aprovação e hierarquização.
E então veio a revolução digital.
Com a fragmentação das mídias e uma “supernova” de possibilidades que vão de microblogs e vídeos curtos a formatos de documentários com engajamento em série e streaming, as possibilidades de comunicação com o público parecem infinitas. Cada influencer e cada marca se transformou em uma mídia própria, com alta capacidade de engajamento e fidelização – e identificar quem são os influenciadores em cada micromercado passou a ter que fazer parte do portfólio das agências.
E esse é um ciclo que se acelera cada vez mais. O “caos criativo” está de volta, pois um meme ou uma tendência do outro lado do mundo rapidamente se alastra e ganha popularidade por aqui – para rapidamente ser substituída pela próxima novidade. É muito raro que uma marca consiga desenvolver campanhas de “tiro de canhão” e obter o impacto que tinha no passado. E é muito improvável que estruturas tradicionais tenham, internamente, todo o conhecimento, flexibilidade e agilidade para navegar em um ambiente cada vez mais desestruturado e fragmentado.
Um novo tempo
Além disso, há o zeitgeist que influencia comportamentos. O trabalho remoto, que já era muito presente na publicidade por meio de trabalhadores freelancers, ganhou força durante a pandemia e agora, muita gente não quer voltar ao modelo anterior. Em muitos casos, nem mesmo a um formato híbrido. É um imenso desafio desenvolver uma cultura corporativa quando as pessoas se vêem raramente – e esse desafio é ainda maior em grandes estruturas.
Pequenos times funcionam melhor no dia a dia do ambiente digital, em que a fragmentação é a regra e a agilidade é uma necessidade. Como se não bastasse, ainda há um tempero extra: as gerações mais novas, especialmente, têm se mostrado pouco dispostas a encarar os modelos tradicionais de trabalho. O espírito empreendedor está de novo em alta, impulsionado pelas oportunidades que se abrem nessa explosão de meios de comunicação digitais. Em um ambiente efervescente, muitos bons profissionais têm preferido atuar de projeto em projeto, sem ligações fortes com nenhuma empresa.
Esse mesmo cenário tem impulsionado a criação de agências independentes – normalmente por profissionais que deixam grandes estruturas em busca de um equilíbrio diferente de vida pessoal e trabalho. Nesse caso, as agências têm abraçado o estilo de vida digital e entendido que, sem amarras, é possível propor novas ideias, métodos e projetos criativos.
Clientes em busca de novas ideias para atuar em mídias ainda pouco exploradas (ou que pretendem trazer uma nova abordagem para meios já conhecidos) têm aproveitado a oportunidade para oxigenar sua linguagem. Muitas agências mais consolidadas têm se beneficiado desse ambiente, a partir de parcerias com agências independentes para desenvolver novas habilidades e conhecimentos.
Com isso, cria-se um ecossistema de negócios baseado na economia digital, com características muito benéficas para todos os participantes:
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Flexibilidade: equipes montadas on demand, de acordo com cada projeto, para aproveitar ao máximo a capacidade técnica dos profissionais e o fit com cada cliente.
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Agilidade: atuando remotamente e em grupos pequenos, utilizando metodologias ágeis, essas equipes propõem ideias rapidamente e geram interações dos projetos que trazem um grande aprendizado para as marcas, as agências e os profissionais.
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Criatividade: com profissionais que têm competências bem diversas, vivem em regiões diferentes do Brasil e do mundo e estão imersas em culturas muito diferentes, o resultado tende a ser mais criativo. São mais visões diferentes sobre o mesmo tema, o que aumenta a possibilidade de um grande insight.
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Horizontalidade: por atuar em um ecossistema digital que estimula a agilidade, o novo ecossistema da publicidade é pouco hierarquizado – o que gera tomadas de decisões mais rápidas e permite que uma ideia se transforme em uma campanha em pouquíssimo tempo.
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Redução de custos: modelos de negócios digitalizados não dependem de uma estrutura física complexa, que gera custos adicionais. A remuneração se dá pelo capital intelectual utilizado – e que pode ser acessado de qualquer lugar do mundo.
Por esse conjunto de motivos, a contratação de agências independentes tem crescido nas grandes empresas, criando um ambiente de convivência com agências já estabelecidas e que, normalmente, se dedicam a modelos mais consolidados de comunicação. Para se destacar, as marcas precisam ousar – e, para isso, buscam profissionais que tragam essa inovação, em qualquer lugar do planeta.
Isso faz com que profissionais independentes de marketing e publicidade (freelancers ou pequenas empresas) tenham uma grande oportunidade de participar do ecossistema das agências. Grandes marcas também podem se beneficiar, especialmente se têm uma cultura digitalizada e entendem que “pescar” em um pool de profissionais mais amplo traz mais criatividade, acelera a execução e diminui custos.
Por tudo isso, o futuro caminha para contar com cada vez mais ecossistemas de marketing e publicidade, conectando profissionais, agências independentes, agências tradicionais e marcas para aumentar a criatividade e a capacidade de resposta do setor às demandas dos consumidores. Esses ecossistemas permitem que agências utilizem ferramentas e plataformas tecnológicas para alcançar parceiros especialistas e lidar com a fragmentação da mídia, ao mesmo tempo em que conectam todos os meios de comunicação com uma linguagem unificada para impulsionar a força das marcas.
*Beto Sirotsky é cofundador da BPool, EGM (Enterprise Gateway Marketplace) que conecta empresas com os melhores parceiros de marketing, estúdios e agências do mercado. Foi por 10 anos sócio fundador da 3yz – Agência de Comunicação Digital que foi adquirida pelo Grupo WPP em 2016 e integrada à Ogilvy. Sempre atento às inovações nas áreas de comunicação, tecnologia e futurismo, já participou de programas na Singularity University, Hyper Island e Berlin School of Creative Leadership. Em 2016 foi escolhido pela Associação Riograndense de Propaganda como “empresário de comunicação do ano” e em 2017 eleito pela Forbes Brasil como um dos 30 jovens mais promissores até 30 anos. Participa também do Conselho da Maromar Investimentos.