Passos lentos

Quem já abriu uma empresa no Brasil sabe que é preciso uma boa dose de paciência para encarar a tradicional burocracia embutida neste processo. Mas algumas iniciativas recentes estão reacendendo a esperança de que essa via-sacra pode acabar. Em Brasília, o Sebrae, o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) e a Junta Comercial de Minas Gerais (Jucemg) anunciaram o início do projeto Integrar, que vai implantar o registro e a formalização on-line de empresas no Distrito Federal, Sergipe, Paraná, Rondônia, Roraima, Tocantins, Ceará, Pará e Paraíba. A meta é que o prazo para abrir um negócio não passe de nove dias. Em São Paulo, o governo do estado lançou em maio passado uma série de medidas de estímulo e favorecimento às micro e pequenas empresas, incluindo ações que devem reduzir o tempo de abertura ou fechamento de empresas em até cinco dias.

O projeto Integrar é inspirado no Minas Fácil, programa da Jucemg que simplificou a legalização de empresas em Minas Gerais, reduzindo o tempo médio de abertura para três dias em Belo Horizonte e nove dias no restante do estado. O serviço integrou os principais órgãos públicos envolvidos no processo. Hoje, os empreendedores mineiros conseguem formalizar suas empresas depois de atender quatro etapas: consulta de viabilidade, formulário do cadastro sincronizado (ferramenta que integra os procedimentos cadastrais), acesso ao módulo integrador (sistema que integra as informações) e apresentação dos documentos necessários para abertura do negócio. As três primeiras são feitas via web e a última, presencialmente, em uma das unidades da Jucemg. O serviço está presente em mais de 90 cidades mineiras. 

A Jucemg repassará toda a metodologia do sistema Minas Fácil às nove juntas comerciais que vão participar desta primeira fase do projeto Integrar. A presidente da Jucemg, Angela Pace, explica que o prazo para implantação depende da disposição de cada um dos órgãos envolvidos. Mas a expectativa é de que em um ano e meio os empreendedores do Distrito Federal e dos outros oito estados que estão assinando o convênio poderão registrar suas empresas via web. “O maior desafio é todos entenderem a importância da integração. A partir da hora que isso acontecer, o sistema trabalhará por eles”, destaca Pace. A proposta é de que o Integrar abra caminho para a implantação da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios (Redesim), criada por lei em 2007 com a proposta de unificar os procedimentos em todo o País.

Em São Paulo, as medidas anunciadas pelo governo estadual também prometem desburocratizar a abertura de empresas. Entre elas, a assinatura de um convênio com a Receita Federal para que o empreendedor obtenha simultaneamente o Número de Inscrição no Registro de Empresas (Nire) e da inscrição na Receita Federal (CNPJ) pela Junta Comercial do Estado de São Paulo (Jucesp). Estima-se que com isso seja possível reduzir de 20 para sete dias o prazo de conclusão desses processos. O estado também enviou à Assembleia Legislativa um projeto que reestrutura, moderniza e transforma a Jucesp em uma autarquia. O objetivo é que ela promova a modernização de seus serviços, a virtualização do atendimento aos empreendedores e a sua atuação como integrador estadual da Redesim, garantindo o registro de empresas pela internet.

Maratona burocrática

De acordo com o último relatório do Banco Mundial sobre ambiente para fazer negócios, a maratona para registrar e legalizar uma empresa no Brasil leva em média 120 dias. Com esse desempenho, o País é o 179º no ranking formado por 183 países. Só ganha da Guiné Equatorial (137 dias), Venezuela (141), Congo (160) e Suriname (694). Nos outros países do Bric a burocracia é bem menor. Na África do Sul, o empreendedor precisa de 19 dias para abrir uma empresa; na Índia, 29; e na China, 38 dias. A boa notícia é que a situação já foi pior. Na pesquisa anterior, o tempo gasto por um empresário brasileiro para registrar o negócio chegava a 152 dias. O relatório se baseia na maior cidade de cada país – São Paulo, no caso do Brasil.

“O dado publicado pelo Banco Mundial não expressa a realidade brasileira quanto a prazo de abertura de empresas”, defende João Elias Cardoso, diretor do Departamento Nacional de Registro do Comércio (DNRC), vinculado ao MDIC. Ele explica que o processo de registro e legalização de empresas envolve três subconjuntos de procedimentos: registro na junta comercial; inscrições na Receita Federal e nos órgãos arrecadadores estaduais e municipais; e, por último, obtenção de alvarás e licenças para funcionamento. “O primeiro e segundo subconjuntos são realizados, normalmente, em curto prazo. As juntas têm o prazo legal de dois dias úteis para decisão em processos que não se referem a sociedades anônimas, transformação, incorporação, fusão e cisão de empresas mercantis, para os quais o prazo é de cinco dias úteis”, argumenta Cardoso.

Segundo ele, os prazos mais dilatados estão relacionados à obtenção dos alvarás e licenças, que não impedem o início das atividades da empresa. Ou seja, para iniciar a compra e venda de produtos e serviços, basta obter o registro na Junta Comercial e o CNPJ nos órgãos tributários. Mas se a falta de licenças e alvarás não inviabiliza o início do negócio, certamente causa transtornos. “A empresa precisa estar com todos os documentos em dia para receber crédito”, exemplifica o presidente da Confederação Nacional das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Comicro), José Tarcísio da Silva. “Temos casos de empreendimentos com 10 anos, mas ainda sem alvará. E pagando imposto municipal. É uma contradição que precisa acabar e nós acreditamos na proposta da Redesim para unificar todos os procedimentos”, afirma Silva.

O problema é que a Redesim caminha a passos lentos. Em quatro anos, a principal conquista do Comitê Gestor da Redesim (CGSIM) foi a instalação, em 2009, do programa de formalização on-line do empreendedor individual (EI). Aliás, um grande feito. Mais de 2 milhões de EIs se cadastraram por meio do Portal Empreendedor de forma simplificada. Mas, em geral, os demais empresários continuam tendo que enfrentar muita burocracia para abrir suas empresas. No final de 2011, a adesão à Redesim era de 512 prefeituras em nove estados (Alagoas, Bahia, Maranhão, Santa Catarina, Espírito Santo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo e Rondônia). O Brasil tem mais de 5,5 mil municípios. “O desafio é muito grande. Basta dizer que envolve mais de 22 mil órgãos e entidades no País responsáveis pelo registro e legalização de empresas”, destaca Cardoso, do MDIC.

A esperança é que projetos como o Integrar e o Via Rápida Empresa possam finalmente concretizar os anseios da Redesim. “Nós temos certeza de que isso é possível. E hoje temos um terreno muito próprio para isso. Em Ouro Preto (MG), por exemplo, os prefeitos, empresários e entidades estão encantados porque o Minas Fácil ordenou a vida de todo mundo”, afirma Angela Pace, da Ju­cemg. “E quando isso acontecer, finalmente poderemos falar de igual para igual com a comunidade asiática. Sim, porque nós entendemos que não estamos competindo com outros estados, mas com outros países. Precisamos tornar a abertura e a legalização de empresas mais ágeis para que a concorrência se faça de maneira dinâmica.”

Consulte

Enquanto a Redesim não sai do papel na sua cidade, o jeito é gastar sola de sapato. O Sebrae disponibiliza em seu site um guia que mostra o caminho que o empreendedor terá que percorrer para legalizar seu negócio. Siga o roteiro:

1. Junta Comercial ou Cartório de Registro de Pessoa Jurídica
O primeiro passo é registrar o negócio, ou seja, fazer a “certidão de nascimento” da sua empresa, incluindo a escolha do nome (razão social).
2. Receita Federal
Chegou a hora de cadastrar o CNPJ da empresa, ou seja, de registrar o negócio como contribuinte. O processo é feito no site da Receita e os documentos enviados por sedex.
3. Prefeitura
Para o negócio começar a operar é preciso ter um alvará de funcionamento, concedido pelo órgão municipal. Em alguns estados, é preciso fazer primeiro a inscrição estadual.
4. Secretaria Estadual da Fazenda
O próximo passo é fazer a inscrição estadual. Muitos estados têm convênio com a Receita Federal, o que permite que este procedimento seja realizado no momento da inscrição do CNPJ.
5. Previdência Social
Mesmo sem funcionários, a empresa precisa fazer seu cadastro na Previdência Social. O prazo para este cadastramento é de até 30 dias após o início do funcionamento do negócio.
6. Notas Fiscais
Por último, o empreendedor vai precisar de um bloco de notas que pode ser feito pelo órgão municipal ou estadual, dependendo do estado.

Atenção: Não esqueça de registrar a marca de sua empresa – e possíveis patentes do negócio. Estes procedimentos são feitos pelo Instituto Nacional da Propriedade Intelectual (Inpi).

Saiba mais: www.sebrae.com.br/mo

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