Desenvolvimento de Carreira para profissionais com deficiência: como as empresas podem ir além da cota

Por Guilherme Braga, CEO da Egalite*

A inclusão de pessoas com deficiência (PcD) no mercado de trabalho é um tema central em discussões sobre diversidade e responsabilidade social corporativa. Entretanto, ainda há um longo caminho a ser percorrido para garantir a verdadeira inclusão e possibilidade de progressão de carreira. O cumprimento da Lei de Cotas, que exige a contratação de PcD, embora seja um avanço, frequentemente resulta na concentração de profissionais com deficiência em funções de menor responsabilidade, sem um plano claro para seu desenvolvimento de carreira. 

Muitas empresas ainda veem a contratação de pessoas com deficiência como uma obrigação legal, e não como uma oportunidade de agregar valor à organização. Em vez de investir no desenvolvimento desses profissionais, há uma tendência de alocá-los em cargos operacionais. Isso perpetua um ciclo de estagnação, em que a pessoa com deficiência tem poucas chances de avançar na carreira ou demonstrar seu verdadeiro potencial.

Embora as empresas estejam fazendo progressos na inclusão, muitos obstáculos ainda precisam ser superados. Como mencionado por um dos líderes em um programa de mentoria no qual eu fiz parte, “a deficiência não invalida uma pessoa; o que a impede de progredir são as barreiras impostas pela sociedade e pelas organizações”.

Para mudar esse cenário, as empresas precisam adotar uma abordagem proativa no desenvolvimento de carreira para PCDs. Isso significa:

Programas de mentoria são essenciais para apoiar o desenvolvimento de profissionais com deficiência dentro das empresas, promovendo uma troca valiosa de experiências entre mentores e mentorados com deficiência. Essa relação permite que o mentor, muitas vezes em cargos de liderança, ofereça uma visão clara dos caminhos para o crescimento profissional, além de ajudar a reduzir preconceitos e barreiras. Em paralelo, treinamentos voltados para o desenvolvimento de hard skills, como o uso de novas tecnologias, e soft skills, como liderança e comunicação, são fundamentais para capacitar esses profissionais, permitindo que assumam funções de maior complexidade e responsabilidade.

Além disso, é necessário que as empresas implementem planos de carreira direcionados para pessoas com deficiência, considerando suas aspirações e os objetivos da organização. Esses planos devem traçar um caminho claro para promoções e mudanças de função, incluindo oportunidades de liderança. O sucesso desse processo depende também da sensibilização e treinamento de gestores para que saibam lidar adequadamente com a diversidade, garantindo que os funcionários com deficiência recebam o mesmo apoio e oportunidades de crescimento que os demais, evitando discriminação e promovendo um ambiente de inclusão real.

As pessoas com deficiência, durante milhares de anos, foram excluídas da nossa sociedade. Sua entrada no mercado de trabalho aconteceu há poucas décadas e ainda de uma forma tímida. O formato da lei de cotas exige a contratação, mas não a progressão de carreira. Por isso, é fundamental que as empresas façam um esforço específico para mudar esse cenário e chegar a ter lideranças com deficiências em sua organização. 

Um dos fatores mais importantes para o sucesso da inclusão é criar uma cultura na qual os funcionários com deficiência se sintam à vontade para pedir ajuda e expressar suas necessidades sem medo de retaliação ou julgamento. No exemplo do programa de mentoria, a transparência e a abertura para o diálogo permitiram que os profissionais com deficiência se sentissem mais empoderados e engajados em suas carreiras. Como uma funcionária mencionou, “não podemos fingir que nossas limitações não existem, mas também não devemos permitir que elas nos impeçam de alcançar nossos objetivos”.

Talvez a maior barreira para o desenvolvimento de carreira das pessoas com deficiência seja a percepção dos seus gestores em relação às suas capacidades. Essa visão é, muitas vezes, sustentada por estereótipos e preconceitos que não refletem a realidade. No programa de mentoria mencionado, um dos objetivos foi desmistificar a deficiência dentro da empresa, promovendo o diálogo entre funcionários com e sem deficiência. O resultado foi uma maior conscientização sobre as capacidades dos profissionais com deficiência e uma mudança de atitude por parte dos gestores. Como um dos líderes mencionou, “o sucesso do programa de mentoria está na capacidade de transformar percepções e criar uma cultura de inclusão verdadeira, onde todos são valorizados por suas habilidades, e não subestimados por suas limitações”.

Promover o desenvolvimento de carreira de pessoas com deficiência vai além de cumprir cotas ou oferecer cargos operacionais. Trata-se de criar um ambiente em que todas pessoas possam prosperar e contribuir plenamente para o sucesso da organização. As empresas que adotam essa abordagem proativa não apenas cumprem suas obrigações legais, mas também se posicionam como líderes em diversidade e inovação, beneficiando-se da riqueza de perspectivas e talentos que a inclusão proporciona.


*Guilherme Braga é CEO e fundador da Egalite, startup de inclusão de profissionais PcDs no mercado

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