Por Raquel Coutinho, COO da Humora*
A indústria da cannabis tem experimentado um crescimento notável nos últimos anos. Mas o que vale a pena destacar é não apenas sua relevância econômica, como também seu papel de mitigação ambiental, num cenário cuja transformação de um presente e futuro melhor são essenciais para a resiliência de nosso planeta. Em um contexto global marcado por desafios climáticos cada vez mais urgentes e sendo vivenciados por todos nós, a cannabis surge como uma alternativa positiva, com diversas aplicações ecológicas, redução de danos e benefícios à saúde das pessoas e do planeta.
A cannabis, especialmente o cânhamo, é uma planta de crescimento rápido, que tem demonstrado alta capacidade de sequestrar carbono, podendo ser ferramenta poderosa na luta contra a crise climática. Pesquisadores americanos do centro de pesquisas Hudson Carbon demonstraram que o cânhamo pode capturar até 16 toneladas de dióxido de carbono do ar anualmente, enquanto outras espécies vegetais absorvem cerca de 6 toneladas. Ou seja, a maconha pode ajudar a controlar o aquecimento global e, consequentemente, reduzir a crise climática.
Além dessa captura de carbono, do ponto de vista industrial, essa planta pode ser utilizada para produção de bioplásticos, insumos à indústria têxtil, materiais de construção e tantas outras aplicações. Produtos derivados do cânhamo são biodegradáveis e também podem ser considerados uma alternativa sustentável ao plástico, tão presente e comumente usado, mas ainda alvo de pouca reflexão: de lenta decomposição, vale mesmo a pena usar o plástico, mesmo sabendo dos impactos em nossos ecossistemas e saúde, e que temos possibilidades para substituí-lo por alternativas mais amigáveis à natureza?
O cânhamo também demanda pouca água para seu cultivo. Para se ter ideia, cerca de 1 kg de cânhamo utiliza 2,9 mil litros de água, enquanto 1 kg de algodão necessita de cerca de 10 mil litros. Ainda, a planta apresenta uma resiliência natural, exigindo pouca ou nenhuma utilização de pesticidas, fungicidas ou herbicidas, consequentemente, reduzindo assim a carga de químicos no meio ambiente. E não para por aí, já que estudos do Journal of the International Hemp Association apontam que meio hectare de cânhamo pode produzir a mesma quantidade de papel que uma área de 1,5 a 4 hectares de árvores plantadas, tornando-o uma alternativa mais sustentável que o eucalipto, atual matéria-prima da indústria de papel e celulose.
Além disso, a cannabis ainda pode beneficiar significativamente a saúde do solo. Pesquisas da Dalhousie University sugerem que o plantio contribui para a melhoria da estrutura e fertilidade do solo, ajudando a prevenir erosão e estimulando a retenção de nutrientes. Tais propriedades tornam a cannabis uma cultura próspera para práticas agrícolas sustentáveis, ajudando a manter a produtividade e a biodiversidade do solo.
Sabemos que nem tudo são flores, mas tudo é semente para sensibilizar em prol da natureza. Há de se considerar que sempre há impacto em tudo que fazemos, alguns benéficos, outros nem tanto. Hoje, muitas vezes cultivada indoor, a cannabis pode ter um impacto no consumo energético. A alternativa do cultivo ao ar livre sofre com questões de legalização, principalmente no Brasil, e ainda poderia requerer tratamento contra as consideradas ”pragas”, para não falar sobre o consumo de água. A sustentabilidade é pilar essencial na discussão de qualquer cultura.
A emergente indústria da cannabis pode se tornar uma alternativa bioeconômica, e extrapolar os limites de seu próprio setor, podendo promover uma verdadeira revolução verde em diversos setores. Para além da promessa, o olhar para o potencial de fazer algo diferente e sustentável dentro de sua própria indústria é fundamental. Além disso, investimentos e pesquisas são necessários para melhor avaliação, para que possamos melhorar a percepção pública sobre a planta em relação à saúde das pessoas e do planeta. O futuro deve ser verde, e a cannabis é uma parte importantíssima dele.
*É formada em Comunicação Social pela Universidade de São Paulo (USP), com MBA em Gestão de Projetos pela USP/ESALQ. Iniciou sua jornada profissional na Índia, onde participou do programa internacional de estágio da Infosys, com foco em mudanças climáticas. Trabalhou por 11 anos na maior empresa da indústria florestal brasileira, Suzano SA, onde liderou projetos socioambientais e comunicação. Participou, na Califórnia, do Environmental Leadership Program, da Universidade de Berkeley, com foco em liderança sustentável. Hoje com foco em gestão de conhecimento, projetos e sustentabilidade, atua como COO e Gerente de Projetos na Humora.