Por Francisco Pereira, CEO da Trademaster*
A expectativa para taxa Selic, a taxa básica de juros, em 2024 subiu de 10,5% para 11,25% ao ano, de acordo com um boletim divulgado recentemente pelo Banco Central. Nos últimos anos, a economia brasileira tem enfrentado um cenário desafiador marcado por oscilações da Selic, que atingiu novamente patamares de dois dígitos. Essa alta reflete, principalmente, o esforço do Banco Central para controlar a inflação e equilibrar as pressões macroeconômicas. No entanto, esse movimento afeta diretamente diversos setores da economia, especialmente a indústria, que tem seu desempenho comercial afetado diretamente pela taxa.
A Selic é a principal ferramenta utilizada pelo Banco Central para controlar a inflação. Quando elevada, a taxa visa desestimular o consumo e o crédito, o que diminui a pressão sobre os preços. Contudo, essa mesma elevação afeta o custo de capital e o investimento, encarecendo o crédito para empresas e consumidores. Para a indústria, o impacto se reflete principalmente em três áreas: aumento do custo de financiamento, retração do consumo e desaceleração dos investimentos produtivos.
E um dos principais efeitos de uma Selic acima dos dois dígitos, como é o caso atual, é o encarecimento do crédito. As indústrias que dependem de capital de terceiros para financiar suas operações, expandir suas capacidades ou realizar investimentos em inovação enfrentam um cenário menos favorável. O crédito mais caro dificulta que sejam realizados novos financiamentos, tornando menos atrativa a realização de projetos de expansão ou a renovação do parque industrial.
Além disso, empresas com dívidas atreladas à Selic sofrem com o aumento de suas despesas financeiras, comprometendo margens de lucro e capacidade de geração de caixa. Esse efeito é ainda mais acentuado em setores que dependem de grande alavancagem, como o de infraestrutura, construção civil e bens de capital. A longo prazo, a menor capacidade de investimento pode resultar em perda de competitividade, obsolescência tecnológica e, principalmente, redução da produtividade.
A elevação dos juros também impacta diretamente o consumo das famílias, um dos principais motores da demanda por produtos industriais. Com o crédito mais caro e as contas mais altas, as famílias reduzem o consumo de bens como eletrodomésticos, automóveis e móveis, afetando setores industriais que dependem da demanda interna.
Esse cenário de retração do consumo impõe um desafio duplo para a indústria: lidar com a menor demanda e, ao mesmo tempo, com o aumento dos custos de produção, impulsionados pela inflação. Com as margens apertadas, muitas empresas se veem obrigadas a repassar os custos aos consumidores, agravando ainda mais a situação de queda nas vendas.
Embora a alta da Selic seja, em tese, uma medida temporária para conter a inflação, seus efeitos na indústria podem ser duradouros. Com o encarecimento do crédito, muitas empresas postergam projetos e investimentos, o que compromete a capacidade de inovação e modernização no futuro. A retração do consumo também pode resultar em uma desaceleração do ritmo de produção e na consequente redução de empregos no setor industrial.
Por outro lado, a elevação da Selic também pode trazer benefícios em um horizonte mais longo. A contenção da inflação, por exemplo, contribui para a estabilização da economia, o que pode gerar um ambiente mais favorável para o crescimento sustentável da indústria. Além disso, indústrias exportadoras podem se beneficiar da valorização cambial associada à alta dos juros, o que aumenta a competitividade de seus produtos no mercado externo.
*Francisco Pereira é formado em Administração pela FGV (Fundação Getúlio Vargas), especialista em soluções de crédito para as pequenas e médias empresas e CEO da Trademaster, fintech que potencializa as vendas de grandes indústrias e distribuidores ao varejo.