Web Summit, IA e nossas escolhas

Por Fabiana Ramos, CEO da PinePR*

Com um recorde de 71.528 participantes de 153 países e cerca de 3 mil startups apresentando soluções ao longo de três dias, o Web Summit Lisboa 2024 é uma ótima oportunidade de conexão, atualização e geração de insights. Ideias surgem praticamente de todo lugar: conversas nos corredores, um bate-papo informal enquanto aguardamos na fila para um pastel de nata, palestras, mesas-redondas e encontros com outros participantes.

Um momento de total imersão no que poderá ser o nosso futuro. Um futuro que pode ser ameaçador, mas que, se agirmos corretamente, tem um potencial incrível. Tudo depende das nossas escolhas. Individuais e coletivas.

Como disse o vice-chanceler da Alemanha, Robert Habeck, a tecnologia não é, em si, boa ou ruim: tudo depende de quem a usa. Com as redes sociais, já tivemos a oportunidade de transformar uma ideia excelente de conexão de pessoas em um mar de desinformação e discursos de ódio – com a Inteligência Artificial, podemos fazer diferente.

Mas para que isso aconteça, precisamos de um olhar diferente. Já é mais do que hora de acelerar o desenvolvimento de lideranças femininas: inúmeros estudos demonstraram que uma presença mais marcante de mulheres em cargos de gestão cria ambientes de trabalho mais colaborativos, menos agressivos e mais saudáveis.

Nesse sentido, o Web Summit vem dando um ótimo exemplo: das cerca de 3 mil startups presentes no evento, 44% foram fundadas por mulheres e estão em diferentes estágios de evolução. O espaço Women in Tech, um dos destaques do evento, se transformou em uma parada obrigatória para comprovar a capacidade feminina de construção de comunidades, negócios e prosperidade.

Com diversidade de origens e mais oportunidades, podemos encarar os problemas a partir de novos olhares e resolver das questões mais básicas às mais complexas, diminuindo a desigualdade social. Um bom exemplo é a eletricidade: o que parece resolvido em nosso dia a dia é, para 770 milhões de pessoas, algo nunca visto – mesmo quase 150 anos depois da primeira lâmpada ter sido acesa.

Dependendo de como analisamos, é um grande fracasso: já passaram 150 anos e quase 10% da população ainda não conta com um item tão básico. Saneamento básico também é luxo em muitas regiões do mundo. Para mim, porém, é um alerta dos erros que não devem ser cometidos no uso da Inteligência Artificial e tantas tecnologias que serão desenvolvidas nos próximos anos.

Não basta que uma tecnologia exista – é preciso fazer com que ela seja acessível ao maior número possível de pessoas. É o que a chinesa Alibaba decidiu fazer com um sistema comercial que facilita o procurement de produtos em fornecedores. Disponível para pequenas empresas em mais de 200 países, o Accio usa IA para facilitar a busca por produtos a serem comprados e a geração de conteúdo para ambientes digitais.

Sonho ou pesadelo?

Um tema frequente nas conversas com startups e investidores no Web Summit é o desenvolvimento de LLMs de uso restrito. A Inteligência Artificial Generativa ganhou fama como uma tecnologia para resolver todo tipo de problema, mas está ficando cada vez mais claro que agentes de IA com ação limitada são mais simples de desenvolver, oferecem respostas mais confiáveis e impulsionam negócios com mais velocidade.

Agir dessa forma tira o foco de um sonho que pode se transformar em um pesadelo: a ideia de uma IA Geral, capaz de fazer de tudo e muito melhor que uma pessoa. Max Tegmark, presidente do Future of Life Institute, colocou bem o problema quando disse que é impossível “desinventar” a IA, mas uma Inteligência Artificial sem nenhuma regulamentação tornará o ser humano obsoleto.

A questão é que esse caminho não é inevitável. A evolução rápida da tecnologia faz com que estejamos mais perto de criar uma IA Geral do que de encontrar mecanismos para proteger a sociedade desse tipo de sistema. Parece uma perspectiva bem tenebrosa, mas que pode ser corrigida: é preciso evitar um olhar puramente econômico-financeiro e pensar no efeito para toda a sociedade.

E é esse tipo de reflexão que torna o Web Summit um evento tão especial. Ideias contraditórias e um olhar que tempera o bem-estar das pessoas e o crescimento econômico. Reflexões necessárias em um evento que é muito tech, mas também é muito humano.

 

*Fabiana Ramos é CEO da PinePR, agência de PR especializada no atendimento a scale-ups, empresas de tecnologia e grandes players inovadores, com atuação dentro e fora do Brasil, e possui 20 anos de experiência em empresas multinacionais. É responsável pela expansão comercial da agência e por posicionar a PinePR como referência no mercado, garantindo a melhor experiência para os clientes. Em sua última experiência, atuou por 3 anos na expansão comercial da Swarovski, desenvolvendo uma abordagem internacional de vendas. Atualmente, também atua como mentora; é conselheira do 30% Club Brazil, capítulo da campanha global que promove a equidade de gênero nos Conselhos de Administração das 100 maiores companhias do Mercado de Capitais; e colabora regularmente com veículos como Meio & Mensagem e HSM.

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