Desperdício de alimentos no Brasil: responsabilidade e olhar crítico do meio empresarial e sociedade civil são fundamentais para a transformação deste triste cenário
O desperdício alimentar é uma questão crítica da sociedade atual. A ONU (Organização das Nações Unidas) estima que, do total de alimentos que são produzidos em nível global para consumo humano, cerca 17% se perca entre a colheita e as prateleiras dos supermercados anualmente, quantidade que poderia alimentar 1 bilhão de pessoas no mundo. O cenário se torna ainda mais preocupante quando olhamos os dados da fome. No Brasil, mais de 33 milhões vivem em insegurança alimentar, como revelou o último relatório da FAO, braço da ONU para Alimentação e Agricultura.
Parte desses alimentos que têm como destino o lixo, resultam da má gestão da da produção e distribuição na cadeia de alimentos, bem como do comportamento do consumidor. A coleta eficiente de alimentos excedentes acaba sendo dificultada por questões logísticas, como a falta de infraestrutura de armazenamento e transporte adequado, que mantenham a refrigeração dos alimentos, por exemplo.
“Uma das chaves para minimizar os impactos do desperdício de alimentos e também para o desenvolvimento sustentável de empresas que atuam com a produção, distribuição e comercialização, primeiramente, é a conscientização. É importante as empresas começarem a implementar iniciativas em que o ESG ganhe espaço prático”, afirma Alcione Pereira (foto em destaque), fundadora e CEO da Connecting Food, primeira foodtech brasileira especializada em conectar os alimentos que seriam descartados por empresas, mas ainda são bons para o consumo, às organizações sociais.
Para mudar este cenário, empresas, organizações e sociedade como um todo desempenham um papel fundamental: disseminar a cultura de combate ao desperdício e doação desses excedentes alimentares. É preciso haver olhar crítico, conscientização e mudança de hábitos para assim realmente começar a trilhar um caminho voltado para a sustentabilidade.
Além disso, a legislação pode acabar não sendo tão efetiva na prática. A lei nº 14.016, que dispõe sobre o combate ao desperdício e sobre a doação de excedentes de alimentos para o consumo humano, precisa ser otimizada, uma vez que envolve questões burocráticas que, muitas vezes, desencorajam empresas e indivíduos a contribuir. Simplificar e esclarecer essas leis poderia incentivar mais doações, garantindo, ao mesmo tempo, a segurança jurídica para os doadores.
“Possíveis doadores simplesmente não conhecem os benefícios disponíveis com a doação de alimentos, mas eles existem. A falta de informações claras sobre esses incentivos impede um maior aproveitamento das oportunidades e acaba fazendo com que, praticamente, seja necessário pagar para doar. Este é um contrassenso que precisa ser mudado, para que haja mais contribuições da parte de quem tem excedentes disponíveis”, destaca a CEO da Connecting Food.
A mudança de cultura e visão de longo prazo das lideranças e da sociedade são capazes de promover ações com responsabilidade, e isso é uma das chaves para minimizar os impactos sociais e ambientais causados pela perda e desperdício de alimentos.
“É preciso evoluirmos em políticas públicas em torno do desperdício de alimentos. Acredito que o caminho para enriquecer as discussões deva envolver setores públicos e privados, Governo e sociedade civil. Desse modo, teremos mais incentivos para implementar novas práticas focadas nas populações vulneráveis, como uma estratégia para o alívio da fome no país e combate ao desperdício de alimentos”, finaliza a CEO da foodtech.