Energia para vencer a crise

O Brasil precisa mais do que um pacote fiscal que case a receita com a despesa para vencer a recessão econômica. Se não superar o estresse que tomou conta do setor elétrico brasileiro nos últimos anos, a recuperação da economia vira quimera.

Hoje, é consenso nos países desenvolvidos que a produção não avança sem energia barata e limpa. Entre os setores produtivos, um dos mais dependentes deste recurso é a indústria nacional, que consome mais de um terço da energia gerada no País, e os líderes empresariais só veem o círculo do desenvolvimento se completar com aumento de geração e opção pelas fontes renováveis.

Além dos benefícios ambientais já conhecidos, a geração de energia limpa e renovável é capaz de gerar até dez vezes mais postos de trabalho do que os empreendimentos movidos a combustíveis fósseis, segundo levantamento da organização inglesa UK Energy Research Centre. Essa conclusão foi tomada com base na análise de 50 estudos desenvolvidos desde 2000 que relacionam o investimento e a criação de empregos na área. Os países pesquisados foram os Estados Unidos, os da Europa e a China.

A energia limpa e barata já teve sua melhor opção nas hidrelétricas. Mas hoje a realidade é outra. Os projetos de grandes usinas e as grandes linhas de transmissão vão sendo atropelados pela impossibilidade de se fazer novas hidrelétricas com grandes reservatórios. O regime de chuva abaixo do esperado e o uso pleno das termelétricas para suprir a demanda acabaram determinando um uso exagerado de fontes energéticas sujas – carvão e óleo, principalmente.

Nos últimos dois anos, mais do que dobramos a emissão de gases do efeito estufa para produzir a mesma quantidade de energia. E, o pior: a um preço mais caro. Somente nos últimos 12 meses, o aumento da tarifa superou 50%. Energia cara, suja e não-renovável. Isso acabou colocando definitivamente em questão assuntos como energias limpas (hoje mais baratas que a térmica a carvão – a eólica é disparada mais barata), eficiência energética e geração distribuída (mini e microgeração). “Deixou de ser apenas uma preocupação ambiental de médio e longo prazo, e passou a pesar no bolso já”, afirma o presidente do Instituto para o Desenvolvimento de Energias Alternativas na América Latina (Ideal), Mauro Passos.

Novo rumo

Mas o País vem tentando fazer o dever de casa. Segundo Passos, de 2005 para cá, especialmente nos últimos cinco anos, houve grande crescimento da participação da energia eólica na matriz elétrica brasileira. “É uma expansão em ritmo sem igual no mundo. Hoje os principais players do setor estão no Brasil.” E o estudo Energy Outlook (NEO), realizado pela Bloomberg New Energy Finance (BNEF), mostra que o Brasil deve atrair US$ 300 bilhões em investimentos para geração de energia elétrica até 2040, a maior parte desses aportes para projetos solares e eólicos.

Para o presidente da Eletrosul, Djalma Berger, a necessidade de retomada do  crescimento econômico faz com que sua organização se mobilize para assumir um papel preponderante na corrida pelo fornecimento de energia de qualidade como única forma de impulsionar a produção que está em queda. “O País precisa avançar e a empresa precisa estar na vanguarda deste crescimento, oferecendo energia boa às pessoas e às empresas para que elas possam se desenvolver e ajudar o País a crescer.” E acrescenta: “Com ou sem crise, tem muita gente querendo investir na expansão do setor elétrico e isso nos induz a programar investimentos em transmissão e todas as formas de geração de energia limpa, principalmente a eólica, o futuro da geração de energia”.

As restrições na economia enfrentadas pelo Brasil, como em outros países, determinam uma necessidade de reestruturação de valores, de conceitos, mas sem deixar de lado a prioridade de segurança do setor elétrico que, para o presidente da Eletrosul, “é tão ou mais importante que o retorno financeiro”.

Berger concorda que a receita de crescimento com energia limpa deve começar megawatts pelo entendimento de que a energia gerada pelas hidrelétricas, embora mais barata, esteja saindo de cena. Primeiro, porque grandes projetos já foram executados. Só sobraram os de menor atratividade. Além disso, as exigências ambientais são cada vez maiores sobre as hidrelétricas, cuja construção é sempre envolvida com denúncias de impactos no meio ambiente. Os projetos de energia eólica, por exemplo, são igualmente fiscalizados, mas a aprovação ambiental tem sido tranquila pelo menor impacto que eles representam.

A implantação de um projeto eólico ficou também mais interessante com a redução do  custo de implantação, possível com o avanço da tecnologia e a instalação de fabricantes de aerogeradores no País – entre eles há uma única empresa brasileira, a Weg, de Jaraguá do Sul (SC), que utiliza torres de concreto de 120 metros produzidas pela também catarinense Cassol. Antes, devido ao preço dos componentes, a construção de um parque eólico custava quatro vezes mais do que a de uma usina hidráulica.

Essa relação já baixou bastante. O custo de implantação hoje gira entre R$ 5,5 milhões a R$ 6 milhões o MW instalado, valor semelhante ao de uma PCH. Além disso, uma eólica começa a gerar energia gia em seis meses. Numa hidráulica, um projeto de maturação é de três anos, em média. “Hoje a Eletrosul gera quase 600 MW a partir da energia eólica. Com a tecnologia disponível, uma única torre é capaz de gerar 2 MW de energia”, diz Berger. A organização já estuda promover uma forte ampliação do sistema em Santa Catarina, nos moldes do Rio Grande do Sul. A região escolhida deve ser o Sul do Estado, partindo de Imbituba em direção à divisa com o Rio Grande do Sul.

A energia eólica, junto à solar, de resíduos (biomassa) e outras fontes renováveis foram responsáveis por gerar 9,1% da eletricidade global em 2014, contra 8,5% em 2013. No Brasil, eólica e biomassa respondem atualmente por 11,7% da eletricidade gerada, contra 9,4% em 2014, e a energia solar fotovoltaica ainda possui uma participação insignificante no total (mas, segundo Mauro Passos, deve ser a próxima a apresentar grande expansão no País), o que revela muito espaço ainda para crescer e aplainar os caminhos da retomada do crescimento da produção.

A modalidade é inesgotável, não emite gases poluentes, não gera resíduos, diminui a emissão de gases de efeito estufa (GEE), além do que os parques eólicos são compatíveis com outros usos e utilizações do terreno, como a agricultura e a criação de gado. O Brasil, que aposta na limpeza da energia para a retomada do crescimento, agradece.

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