Especialista no assunto, a fundadora e CEO da Connecting Food, Alcione Pereira, aponta para uma virada de chave nas práticas de redução de desperdício de alimentos no ano que vem
O ano de 2022 foi marcado por uma série de questões que cercam o campo das políticas sociais, ambientais e econômicas. A guerra entre a Rússia e a Ucrânia provocou um aumento disparado na inflação e gerou uma crise alimentar em todo o mundo. No Brasil não foi diferente e o país voltou a fazer parte do Mapa da Fome após oito anos. Segundo a Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan), mais de 125 milhões brasileiros não fazem as três refeições diárias e 33 milhões passam fome.
No mundo, são desperdiçadas toneladas de alimentos todos os dias. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), 17% do que é produzido vai para o lixo entre a colheita e residências, varejo, restaurantes e outros serviços alimentares. No entanto, mesmo em um cenário paradoxal e preocupante, o Brasil inicia 2023 com boas expectativas em torno de soluções para minimizar este desperdício.
Para Alcione Pereira, especialista no assunto e CEO e Fundadora da Connecting Food, primeira foodtech brasileira de impacto social focada na gestão inteligente de doação de alimentos excedentes, é preciso evoluir nas discussões sobre o paradoxo que é a fome e o desperdício de alimentos. E se a luz no fim do túnel sempre esteve acesa, o Brasil deverá avançar e muito no ano que vem. Isso devido a um novo momento político, econômico e social.
“O ano de 2023 começa com um cenário muito mais favorável para evoluirmos em políticas públicas em torno do desperdício de alimentos. Acredito que o caminho para enriquecer as discussões será ampliado, assim como teremos mais incentivos para implementar novas práticas focadas nas populações vulneráveis como uma estratégia para o alívio da fome no país”, explica.
O que esperar para o ano que vem
Se por um lado 2022 foi o ano pautado por debates acerca do assunto, 2023 é o ano de agir. Inclusive, o tema insegurança alimentar foi tratado como prioridade na COP 27, Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas 2022, que reuniu lideranças mundiais no Egito.
Durante o evento foram debatidos diferentes aspectos acerca do tema, sobretudo o social e o econômico, e um dos maiores pontos de destaque foram os impactos adversos das mudanças climáticas causados na cadeia de produção de alimentos e as mudanças no setor agrícola.
Para Alcione Pereira é preciso colocar o discurso em prática. “O ano que está por vir será de muitas transformações, uma virada de chave”, destaca. Pensando nisso, a especialista elencou três prioridades para o próximo ano.
1. Organizações mais sustentáveis
Inúmeras ações são necessárias para o enfrentamento da crise climática e o combate à fome, e a indústria de alimentos é uma das partes para essa transformação, que deve estar cada vez mais engajada com as questões socioambientais.
O cenário já está se mostrando positivo. A pesquisa “Climate Check 2022”, realizada pela Deloitte em colaboração com a Oxford Economics, com executivos de 14 países, incluindo o Brasil, revelou que, entre os participantes brasileiros, 84% das empresas já estão executando estratégias de mitigação, que têm a função de combater as causas e minimizar os possíveis impactos das mudanças climáticas. Já para o próximo ano, 37% das lideranças afirmam que suas organizações pretendem acelerar os esforços de sustentabilidade.
Isso indica uma nova perspectiva na potencialização do cumprimento da agenda ESG (na sigla em inglês, Environmental, Social and Governance) dentro das indústrias, que se mostram mais engajadas, olhando para as perdas e desperdício de alimentos e repensando a cadeia de suprimento de alimentos.
2. Inovação de impacto social e meios tecnológicos
As tecnologias se tornaram grandes aliadas para a promoção do acesso de alimentos, e será uma das grandes soluções para o próximo ano. Hoje, a tecnologia é uma das responsáveis por entregar soluções do abastecimento de alimentos no mundo. Por isso, ao tornar mais eficiente os sistemas atuais, será possível promover um melhor acesso e controle da entrega de alimentos e gerar um impacto positivo.
3. Novos empreendedores engajados
Nos últimos anos, surgiram inúmeras startups focadas no combate ao desperdício de alimentos. Chamadas “foodtechs”, elas têm como aliada a tecnologia para promover grandes impactos dentro de organizações e, consequentemente, na sociedade.