Do zero aos nove dígitos

Há 10 anos no mercado, a Wier começou como um projeto disruptivo de faculdade que possibilitava utilizar o plasma frio e ozônio para descontaminação do ar e de águas. Sem nenhum investidor ou dinheiro em caixa, a empresa conseguiu tirar a ideia do papel e em 2020 cresceu mais de 500% com recursos próprios

Empreender no Brasil não é tarefa fácil. Além da burocracia e o mínimo de conhecimento em gestão, o fator “dinheiro” é o que mais pesa na hora de criar e dar continuidade ao negócio. Mas isso não impediu o estudante de química Bruno Mena Cadorin de seguir com o sonho de criar a Wier. Muitas startups começam a sua jornada em hubs e com o incentivo de investidores-anjos ou de fundos de investimentos. Esse é o caminho natural. Mas no caso da Wier, a trajetória foi diferente. A empresa é bootstrap, modalidade conhecida por quem começa um negócio do zero ou a partir de recursos limitados. Caminho tomado também por grandes nomes como Involves e a MaxMilhas.

Para entender um pouco mais sobre os desafios de quem toma esse caminho – na maioria das vezes por conta da necessidade e não propriamente por uma escolha -, precisamos voltar 10 anos, quando a ideia da Wier começou a tomar forma. Durante o projeto de conclusão de curso na faculdade de química, em 2010, o então universitário e bolsista do CNPq desenvolveu uma tecnologia com potencial de utilizar o plasma frio e ozônio para descontaminação do ar e de ambientes, alimentos e tratamento de efluentes. A ideia era tão disruptiva que se tornou a pedra angular na criação da Wier.

Para contextualizar, o ozônio é um gás oxidante natural formado a partir do oxigênio do ar. É mais potente e eficiente quando comparado a oxidantes e sanitizantes convencionais como o cloro, o ácido peracético e o peróxido de hidrogênio. Consegue matar e inativar, com eficiência comprovada por laudos, microorganismos como bactérias, vírus e fungos presentes no ar, em superfícies, e na água, além de degradar quimicamente poluentes orgânicos em efluentes líquidos.

Voltando à ideia embrionária de empreender, a primeira barreira de Bruno era o dinheiro. Sem nenhum capital ou ajuda de custo, ele não tinha como dar um pontapé inicial na sua tão sonhada empresa. “Busquei investidores no começo, mas ninguém queria investir. Florianópolis é um celeiro de startups na área de tecnologia, mas que possuem modelos de negócios diferentes e que chamam muito mais a atenção dos investidores (a exemplo das fintechs). Na WIER é diferente, temos tecnologia de ponta embarcada em nossos equipamentos, mas no fundo somos indústria e isso requer capital financeiro intensivo, o que não é muito bem visto por investidores.” destaca o, hoje, PhD em química e CEO da Wier.

O Dr. Bruno Cadorin lembra que, desde pequeno, sua mãe ensinava a ele e aos irmãos a correrem um pouco mais rápido e a serem mais fortes, porque a vida não iria ser fácil. “Eu fiquei muito frustrado em receber vários “nãos” de investidores. Não foram alguns “nãos”, foram todos “nãos”. Mas não desisti e corri muito atrás para me capacitar e fazer bons projetos que pudessem captar recursos para desenvolver os produtos e a empresa”, reforça o empresário.

Até que, em 2011, apareceu uma grande oportunidade com o programa Sinapse da Inovação, promovido pela FAPESC e pela Fundação Certi, em Santa Catarina. “Sem noção alguma de planejamento estratégico, de gestão financeira e afins, eu me inscrevi, estudei sobre negócios e fui aprovado nas etapas da seleção. Das quase duas mil ideias inscritas em todo o Estado, apenas 50 foram aprovadas. Uma delas foi o projeto que viria a ser a Wier”, conta o Dr. Bruno.

Com o prêmio de R$ 50 mil a empresa começou a dar os primeiros passos. De acordo com o CEO, o recurso foi utilizado para comprar matéria-prima, pagar algumas consultorias na área de engenharia e, por fim, desenvolver o protótipo de pequeno porte do produto. Mas, segundo Bruno, ainda faltava desenvolver muita coisa. “Eu tive que buscar mais recursos para não deixar a ideia morrer e desenvolver a empresa. Nos anos seguintes, consegui recursos financeiros em projetos adicionais que ajudaram os primeiros produtos a serem comercializados. Um foi com a FAPESC, com o projeto PAPPE Inovação e com o Edital Senai/Sesi de Inovação na Indústria”, explica.

O grande desafio na época para a Wier era que ainda não existia nada concreto para mostrar, só uma ideia e um protótipo. Outra dificuldade relatada pelo CEO era que ele não tinha conhecimento nenhum sobre gestão de negócios, planejamento financeiro, orçamento e afins. “O ponto mais positivo que eu tinha era a ideia de negócio, e acho que foi isso que mais deve ter chamado atenção dos avaliadores”, lembra.

No começo das atividades comerciais, com a empresa ainda incubada no Celta, o próprio empresário comprava matéria-prima, montava os equipamentos, fazia a pré-venda e a venda, além do financeiro. “Assim, comecei vendendo algumas unidades por mês que foram crescendo em volume com o passar dos meses. Com isso, fui tendo recurso para contratar estagiários e outros profissionais para me ajudarem na empresa”, conta.

O que começou com algumas unidades de máquinas vendidas por mês, se converteu – 10 anos depois – em mais de duas mil unidades vendidas por mês e mais de 50 colaboradores. De acordo com o Dr. Bruno, o modelo de geração de caixa ainda é contínuo. “Naturalmente ele oscila, mas segue melhorando como um todo, principalmente nos principais indicadores da operação da empresa atrelados a ele como EBITDA, margem de contribuição e lucratividade”. O CEO conta que, por muitos anos, todo o lucro da empresa era reinvestido nela mesma. “ Eu, como fundador e principal executivo da empresa, adotei essa estratégia porque eu aprendi e consegui entender o conceito de equity e da real importância do valuation da empresa. Consegui entender que o meu maior valor como acionista da empresa estava no valuation e não necessariamente no salário e na divisão de lucro para o sócio. Então, o lucro era reinvestido na consolidação da empresa, aumento de market share, lançamento de melhorias e novos produtos, expansão, exportação, entre outros. E assim, hoje, a Wier tem atuação em todos os estados do Brasil, produtos em mais de 20 países e um valor de mercado na casa dos nove dígitos”.

Bruno Cadorin lembra que se, há 10 anos, a Wier era o “patinho feio” na busca por investidores, hoje o jogo virou. “Hoje, recebemos inúmeras abordagens de investidores. Conversamos com todos e ainda estamos discutindo internamente e de forma estratégica sobre a possibilidade”, afirma.

A trajetória ascendente da empresa acumula premiações, como o Prêmio Nacional Kurt Politzer de Tecnologia, em 2017, que tem como objetivo estimular a pesquisa e a inovação na área química no País. Em 2018, recebeu o prêmio Fritz Muller de Sustentabilidade, na categoria Tratamento de Efluentes, iniciativa do Instituto de Meio Ambiente de Santa Catarina. No mesmo ano, realizou a primeira exportação de seus equipamentos.

Em 2019, a empresa fechou o faturamento com um crescimento de 70%, puxado pelos produtos para descontaminação de ambientes, tratamento de efluentes, alvejamento de jeans e sanitização em indústria de bebidas. No mesmo ano, lançou a sua linha de produtos residencial, que torna esses ambientes mais saudáveis e livres de microrganismos que causam doenças respiratórias. Também permite combater contaminantes em alimentos e piscinas.

Já em 2020, a empresa recebeu uma certificação emitida pela renomada Quasar Bio com testes realizados em laboratório de Biossegurança Nível 3, da USP, que confirma a eficácia do ozônio em até 99,9% na inativação do vírus Sars-CoV-2, por meio dos equipamentos da empresa. Por conta disso, teve uma disparada no crescimento, com a marca de 500% em comparação ao ano anterior.

Estima-se que a Wier impactou a vida de mais de 8,6 milhões de pessoas e fomentou cerca de mil novos negócios com o poder do ozônio. Para 2021, a meta é dobrar esse faturamento.

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