por Raquel Rezende
Quando uma pessoa está doente ou percebe algum sintoma incômodo, geralmente recorre a um médico para tratar e acabar com o problema. A mesma situação pode acontecer com uma empresa. Se o negócio não está indo bem ou não evolui, é sinal de que algo precisa ser melhorado. E foi pensando nisso que o Sebrae desenvolveu o programa ALI(Agentes Locais de Inovação). E exatamente como aqueles médicos da família que visitam os pacientes em suas casas para verificar se tudo está bem, os agentes batem às portas das empresas para descobrir o que elas precisam para crescer e ter sucesso.
Inspirado em um modelo indiano de trabalho de agentes de saúde, o ALIé um programa nacional presente em todos os estados com o objetivo de disseminar a cultura da inovação às pequenas indústrias, conscientizando e auxiliando os empresários sobre a adoção de práticas de inovação que envolvem a adequação de seus produtos e processos, desenvolvimento de novos modelos de negócios e implementação de diferentes estratégias de marketing, buscando elevar a competitividade do empreendimento. O cotidiano do trabalho é realizado pelos agentes que são profissionais de nível superior, formados no máximo há três anos, e bolsistas do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que é parceiro do Sebrae no projeto.
Há três anos e meio o projeto funciona no País, atingindo até agora 24.866 empresas com 1.041 ALIs em ação. A meta até o fim de 2013 é chegar a 35 mil empresas. Um dos estados brasileiros considerado pelo Sebrae Nacional referência do ALIé Santa Catarina. Segundo Sergio Cardoso, diretor de administração e finanças do Sebrae/SC, os Agentes Locais de Inovação têm o desafio de desmistificar e promover a inovação dentro das empresas, incentivando a execução de ações que elevem a competitividade do empreendimento e, consequentemente, o desenvolvimento socioeconômico de todo o estado. E o ALIjá começou bem em Santa Catarina por causa da seleção rigorosa dos agentes, acredita Urandi Flores Boppré, gerente da unidade de empreendedorismo e inovação do Sebrae catarinense. Boppré relata que uma empresa de recursos humanos foi contratada por edital para selecionar os profissionais que ficaram dois meses em uma imersão para receber capacitação e formação de consultores. E todo o processo foi acompanhado pela diretoria do Sebrae/SC.
Atualmente, 32 ALIs acompanham 1.740 micro e pequenas empresas industriais catarinenses participantes das cadeias produtivas de madeira e móvel, confecção, acessórios, higiene pessoal, plástico e borracha, eletrometal-mecânico, alimentos e bebidas e construção civil. A primeira turma de ALIs em Santa Catarina iniciou sua atuação em outubro de 2011 e segue acompanhando as empresas até setembro de 2013. Ao aderir ao projeto, a empresa recebe a visita do agente local de inovação para um diagnóstico completo do estágio de inovação e das oportunidades de melhoria a serem exploradas para ampliar a sua competitividade. A partir desse diagnóstico, o agente propõe a construção de um plano para inserir soluções inovadoras no ambiente da empresa. Depois de definido, esse plano será implantado sob a responsabilidade da empresa e com o acompanhamento e orientação do agente local de inovação. O acompanhamento do ALIé gratuito e pode ser feito por até dois anos.
Após a assinatura do termo de adesão pela empresa, o agente de inovação coleta dados para a mensuração do grau de inovação e do modelo de gestão da pequena empresa, respeitando a vivência do empresário e a sua realidade de mercado. Com base nestes dados, o ALIelabora um plano de trabalho, identificando as consultorias que poderão trazer soluções para a empresa, e prepara um cronograma de atuação. Ambos os documentos são avaliados por um consultor especializado do Sebrae, antes de serem apresentados ao empresário. O atendimento do ALInão tem custo para a empresa. Mas o empresário terá que investir nas ações propostas pelo ALIpara a inovação realmente ser integrada ao negócio. A empresa poderá contar também com o subsídio do Sebraetec – instrumento do Sebrae que proporciona às empresas conhecimentos através de consultorias tecnológicas que têm quase a totalidade dos custos, cerca de 80%, pagos pelo Sebrae.
Sem complicação
E quando se fala em inovação muitos empresários logo pensam em mudanças altamente tecnológicas e custos elevadíssimos. Porém, essa é uma noção equivocada, embora muito comum no meio empresarial. Sergio Cardoso esclarece que inovação é toda mudança em um produto, serviço, processo, método de gestão organizacional ou de marketing que tenha sido implementada e que traga vantagem para a empresa. “Inovações geram vantagens competitivas a médio e longo prazo, porque permitem que as empresas acessem novos mercados, aumentem suas receitas, realizem novas parcerias, adquiram novos conhecimentos, melhorem sua produtividade e aumentem o valor de suas marcas”, afirma. Boppré complementa enfatizando que a inovação pode ser algo simples, utilizada para melhorar diferentes facetas da empresa. “No varejo, por exemplo, uma funcionária vende uma roupa para uma festa e depois liga para a cliente querendo saber como foi a festa, como ela se sentiu. Isso pode ser inovação. O pós-venda é uma grande inovação”, explica. Outro exemplo de inovação com resultados altamente positivos citados por Boppré aconteceu na Nugali, empresa de Pomerode (SC) que fabrica chocolates. Ele conta que a empresa produz excelentes chocolates, mas tinha uma embalagem modesta para comercializá-los. Depois que a empresa recebeu o auxílio do Sebrae, a embalagem foi aprimorada e por causa disso o faturamento da empresa aumentou 30% no primeiro ano, após a mudança.
Para conscientizar e sensibilizar os empresários sobre a importância de inovar, o Sebrae promove palestras. “Geralmente, depois das palestras e abordagens que fazemos, os empresários acabam concordando. Mas existe um pouco de resistência no início. E, às vezes, é agravada pelo fato da maioria dos agentes ser muito nova e recém-formada. Por isso, o empresário acaba se perguntando como um jovem vai saber mais que ele sobre como administrar a empresa”, revela Bop-pré. O sócio-proprietário da Nugali, Ivan Blumenschein, admite que há um pouco de preconceito do empresário quando o assunto é inovação. Ele conta que pensava em inovação como algo mirabolante, aeroespacial ou alguma coisa parecida com isso. “A discussão sobre inovação é colocada em outro patamar pelo Sebrae. E envolve mais uma atitude e maneira de fazer aquilo que a empresa tem que fazer, mas com uma postura questionadora, pensando no melhor jeito de realizar”, afirma Blumenschein.
Na opinião do sócio da Nugali, inovar significa sair do cercadinho, da jaula, que muitas vezes o empresário está, para ter uma outra visão. “É a cultura de se questionar sempre e se conscientizar disso. E mesmo que a empresa não tenha dinheiro e nada a ver com tecnologia, existem muitas formas de inovar”, define. Blumenschein conta que a Nugali busca inovar sempre nos produtos, porém defende que qualquer trabalho de inovação é válido. “Existem inovações que não precisam de nenhum investimento, pois são maneiras diferentes de fazer algo”, enfatiza. Certamente, a maioria das mudanças sugeridas pelos agentes de inovação necessita de investimento. E, neste caso, Blumenschein aconselha avaliar a viabilidade econômica da inovação, mensurando o investimento, retorno e risco, mas sempre pensando na inovação como uma oportunidade de mudança para crescer.
Blumenschein diz que o projeto ALIfoi positivo na identificação dos problemas, das necessidades do negócio, e trouxe resultados úteis para a empresa. “O Sebrae não vai resolver os seus problemas, entretanto age como um psicólogo. Um exemplo disso é o Prêmio MPE Brasil, que você vai preencher o formulário e começa a avaliar e refletir sobre sua empresa”, destaca. Para Blumenschein, o Sebrae traz uma metodologia que obriga o empresário a dedicar um tempo para refletir sobre suas ações dentro da empresa.
Vanessa Greve, a ALIque visitou, propôs e está acompanhando as transformações na empresa Nugali, relata que o projeto trouxe para ela uma visão totalmente diferenciada sobre inovação. “Antes, quando se falava em inovação, realmente o primeiro pensamento que me vinha à cabeça era o mesmo que na da maioria dos empresários: que isto envolvia muito investimento de recursos e tempo. Após a preparação para atuar como agente local de inovação ficou mais fácil falar sobre o assunto e conscientizar os empresários sobre a importância da sua empresa buscar inovação.” Ela explica que a inovação pode ser baseada em uma atitude de fazer diferente, buscar mudanças e sair da zona de conforto que muitas empresas se encontram. “Na empresa Nugali, esta atitude faz parte do dia a dia, sendo que desde o momento do primeiro contato com a empresa os sócios Ivan Blumenschein e Maitê Lang inovaram, buscando diferenciais ainda inexistentes no Brasil, no ramo do chocolate, com produtos nobres e diferenciados”, observa.
Por este motivo, Vanessa diz que conscientizar a Nugali não foi algo difícil. A aceitação ao projeto foi rápida, pois o posicionamento inovador auxiliou bastante. A adesão da Nugali ocorreu através de uma sensibilização conjunta, promovida pelo Sebrae da regional de Blumenau, em Pomerode, sede da empresa. “Ivan Blumenschein estava presente e achou a ideia interessante, entretanto fomos altamente questionados sobre os benefícios que este programa poderia trazer. Sendo assim, utilizei todo o conhecimento adquirido na capacitação para fazê-lo compreender que sua participação traria diversos benefícios, entre eles treinamentos específicos, consultorias, missões empresariais, feiras, acompanhamento constante e uma avaliação do quanto a empresa se destaca devido às suas ações inovadoras”, explica Vanessa. Ainda assim, na primeira visita à Nugali, a agente fez novamente uma sensibilização para no final conseguir iniciar o trabalho.
Os incentivos dados à Nugali com o projeto ALIforam diversos, desde cursos para aprimorar o atendimento aos seus clientes até a implantação de um sistema integrado de informações, firmado em uma parceria com uma empresa de Concórdia (SC) para conseguir maior aproveitamento de informações de todos os setores da Nugali. Além disso, a empresa buscou auxílio de uma consultoria da Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina (Fiesc) para desenvolver e aprimorar o processo produtivo da empresa, que foi uma das vertentes do diagnóstico ALI e do gráfico Radar de Inovação, que busca saber se a empresa faz uso rotineiro de consultorias ou do apoio de entidades como o Sebrae, Senai, Sesi, universidades, empresas júnior, sindicatos patronais, entre outras instituições. A agente Vanessa conclui que o projeto ALIna Nugali veio para aguçar ainda mais a vontade e necessidade da empresa em se destacar no mercado como uma empresa altamente inovadora.
Vendas constantes
Outra empresa que conquistou crescimento por conta do projeto ALIfoi a Visual Criativa, da cidade de Mafra (SC). A empresa especializada em confecção foi criada em 1981 por Roseli Hable, que costurava em pequenas quantidades para a vizinhança. Em 1988, seu filho Alexandre Hable passou a ser sócio da confecção trazendo novas ideias sobre produtos, tecidos e acessórios. Apesar do bom andamento dos negócios, havia dificuldade em manter o montante de vendas durante todo o ano. Quando a empresa passou a participar do projeto Agentes Locais de Inovação, em dezembro de 2012, o cenário mudou. O empresário Alexandre Hable aceitou o desafio de desenvolver uma coleção de moda masculina em tempo recorde, trabalhou intensamente durante as festas de fim de ano para terminar as entregas com o propósito de participar de uma ação do Programa da Nova Economia Catarinense, a 32ª Pronegócio, em Brusque (SC). Esta ação fez com que a empresa vendesse 15% de sua produção anual. “Antes só tínhamos uma cadeia restrita de vendas. Agora temos mais acesso e facilidade em mostrar nosso produto para o mercado, e isso é muito positivo”, avalia Hable. Hoje, a empresa conta com 20 funcionários que produzem uniformes empresariais personalizados, uniformes escolares e uma linha de camisetas masculinas.
Localizada na região oeste de Santa Catarina e com atuação no setor metal-mecânico, a empresa Zumaq, indústria de peças e máquinas, recebeu auxílio do ALIpara criar um website através do “Conecte seu Negócio”, ferramenta oferecida pelo Sebrae para melhorar a atuação virtual das empresas. Assim, a Zumaq apresentou resultados positivos por meio desta ação de mercado, realizando vendas para os estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul e contatando um representante comercial da região de Minas Gerais. Outra ação resultante do website foi a possibilidade de realizar vendas por meio do Finame e Cartão BNDES, possibilidades que exigiam website. Além disso, o projeto ALIreorganizou a produção, incentivando o descarte de matérias não utilizadas, contribuindo para confeccionar um painel para organizar ferramentas, pintura de faixas no espaço fabril, identificação de peças no almoxarifado, tornando o ambiente mais limpo e agradável para trabalhar.
Em outro ponto do estado, mais próximo do litoral, a empresa de bijuterias de Letícia Oliveira está há 12 anos no mercado de joias e acessórios. Com a aplicação do diagnóstico do ALI, a empresária mostrou interesse em participar de feiras e eventos. Então, o Sebrae conseguiu levar a empresa para expor na Feira Rio-à-Porter. A participação da empresa na feira foi fantástica, proporcionando vendas e crescimento na carteira de clientes, conforme relata o agente Leonardo Ferreira. “As vendas na feira ultrapassaram a marca dos R$ 50 mil. Com o espírito empreendedor da empresária e a proatividade do projeto ALIconseguimos que a empresa se tornasse um sucesso na feira”, afirma Ferreira.
A participação em uma feira também foi decisiva para a empresa de móveis Estofaria LG, localizada na cidade de Mondaí (SC). A microempresa participou da feira Mercomóveis em agosto de 2012, em Chapecó (SC), e a partir daí aumentou as vendas em 30%. Por causa disso, a produção precisou de adequações. A estofaria construiu dois mezaninos para depositar matéria-prima e liberou um grande espaço no galpão. Em seguida, começou a receber consultoria que auxiliou a empresa a organizar o almoxarifado, construir prateleiras e identificar produtos. Isso ajudou a Estofaria LG a aumentar a produção para suprir o grande aumento de demanda ocasionado pela feira.
Na empresa Eloeth Lingeries, de Ilhota (SC), cidade que concentra grande número de confecções de moda íntima, praia e fitness, o projeto ALI ajudou a esclarecer dúvidas sobre qual foco a empresa deveria seguir. O agente Rafael Maioral conta que quando a empresa foi aderida, em meados de 2012, o ALIestava em um período de dúvidas sobre qual caminho seguir: varejo ou atacado, e talvez por isso não tinha resultados consistentes. Para solucionar essa questão, o ALIatuou nesse sentido e buscou implantar um plano para gerar maior motivação dos funcionários. Outras ações positivas foram mudanças na data de lançamento da coleção e valorização das vendedoras. “É uma das maiores e mais bem organizadas empresas de Ilhota”, destaca o agente.
Para um futuro breve em Santa Catarina, o Sebrae trabalha para contratar novos agentes para atender o varejo. Com o nome de Inovarejo, o ALI identificará a situação dos varejistas em três pontos – automação comercial, comércio eletrônico e meios eletrônicos de pagamento – e fará recomendações para melhorar os processos. Em nível nacional, o projeto foi lançado em 2012 e pretende atingir 43,6 mil varejistas até 2015.