Uma norma deve modificar a forma como instituições financeiras oferecem serviços bancários para os usuários. Conhecido como open banking (abertura bancária, em tradução literal), a modalidade permitirá que os bancos compartilhem suas tecnologias e informações de clientes com terceiros. Com isso, novos serviços poderão ser ofertados, garantindo maior integração, acessibilidade, além de uma maior democratização e poder de escolha de serviços pelos consumidores.
Essa norma ganhou maior visibilidade após entrar em vigor na Europa no início deste ano. Conhecida como PSD2 (sigla para diretiva revisada sobre os serviços de pagamento, em tradução livre), a diretriz obriga as instituições financeiras da União Europeia a abrirem suas tecnologias de interface de programação (conhecida no jargão técnico como APIs) para que outras empresas possam ter acesso e assim criem novas soluções em cima dessas. É nesse contexto que startups e fintechs (empresas com foco em tecnologia financeira) podem desempenhar papel decisivo.
No Brasil ainda não há uma diretriz que obriga as instituições financeiras a compartilhar informações e dados de seus clientes para terceiros a partir das APIs. Mas iniciativas começam a surgir a partir do modelo europeu. Bancos e fintechs começam a criar soluções inovadoras com base no open banking.
“Esse ano veremos novos aplicativos sendo criados em cima desses sistemas, além de serviços como o pagamento em sites e lojas diretamente com a sua conta corrente sem utilizar cartões”, afirma Ricardo Taveira, sócio-fundador da Quanto, fintech especializada em soluções com foco em open banking. “A ideia do open banking é simples: permitir que o usuário escolha o método de acesso à suas contas da mesma maneira como é possível escolher o programa que acessa a caixa de entrada do seu e-mail”, explica.
A Quanto tem sido pioneira na criação de soluções com foco em open banking no País. Em parceria com instituições financeiras, a fintech já colocou em prática algumas iniciativas. Uma delas foi firmada com o Banco Rendimento, que permite que pequenas e médias empresas criem digitalmente uma conta corrente para Pessoa Jurídica. A parceria da Quanto com o Banco Rendimento integra todos os sistemas do Banco com a Quanto, fazendo com que o usuário final tenha a experiência de utilizar um internet banking especializado para o segmento PME.
Outra fintech que observa com olhos atentos o sistema open banking é a Hash lab. Especializada em implementação de Provedores de Serviços de Pagamento (PSP, na sigla em inglês) para outras empresas, com a iniciativa, a startup conseguirá oferecer serviços bancários mais integrados. “Especificamente em pagamentos, faz muito sentido uma integração entre soluções de provedores de pagamentos com a parte bancária a partir do sistema open banking”, afirma Thiago Arnese, sócio-fundador da Hash lab. “Assim uma empresa pode se beneficiar e entregar uma solução completa do seu negócio, sendo ele o próprio ‘banco’ de seus clientes ou da rede de estabelecimentos que utiliza a solução”, complementa. Exemplo prático disso, diz Arnese, seriam bancarização da população, soluções de bancos focadas em nichos específicos e integração com outros produtos, como microcrédito, pagamentos, venda de ingressos e etc.
Em parceria com o Banco do Brasil, a Conta Azul, especializada em gestão empresarial para micro e pequenas empresas (MPEs), já colocou em prática, em meados do ano passado, uma iniciativa de open banking. Uma integração permite que os clientes MPEs integrem informações bancárias com a plataforma. A integração de sistemas, via APIs, permite que empresas e desenvolvedores conectem os seus sistemas aos do banco, compartilhando dados e realizando transações de forma automatizada. De acordo com a instituição, os clientes MPEs terão uma integração de informações mais rápida e completa, com maior detalhamento no descritivo das transações.
De acordo com Taveira, da Quanto, a iniciativa do Open Banking é um primeiro passo para fomentar o avanço da inovação em setores tradicionalmente burocráticos. “Esse ano veremos uma safra de soluções inovadoras de ‘regtech’ —empresas que visam facilitar esses processos, incorporando biometria, criptografia avançada e até mesmo redes sociais para reduzir prazos e facilitar a contratação de novos produtos e serviços”, afirma.
Para Arnese, da Hash lab, o open banking será benéfico também para outros segmentos da economia e não apenas para os usuários dos bancos. “Cada vez mais as empresas que estão inseridas em algum nicho, como venda direta, franquia, sistema de salões de beleza, distribuidores e atacados estão trazendo serviços financeiros para a rede de clientes”, afirma. “Nesse contexto, o open banking é um enorme viabilizador de novos negócios e criação de uma nova linha de receita que não era possível antes”, exemplifica
Diferente da Europa, no Brasil ainda não há uma norma com diretrizes para implementação clara do open banking. Porém, o Banco Central acompanha de perto essas tendências. “O papel de instituições como o Banco Central é primordial e inclusive há interesse de incentivar conceitos como open banking”, diz Arnese, da Hash lab. “As discussões já públicas sobre questões como a proibição de pagamento parcelado sem juros e até mesmo [a criptomoeda] Bitcoin estão colocando os nossos reguladores no palco da discussão das fintechs, e esse ano veremos o Banco Central e a Comissão de Valores Mobiliários virarem protagonistas de algumas destas revoluções do setor”, complementa Taveira, da Quanto.