Para o estudante João Thiago Stilben, 22 anos, o fim do mês é sinônimo de dor de cabeça. Mesmo com uma mesada de R$ 500 e o salário de R$ 750 recebido pelo estágio na Confederação Nacional da Indústria (CNI), o saldo das despesas, muitas vezes, é bem superior à renda mensal, destinada a alimentação, lazer e combustível. O descontrole dos gastos levou o estudante a se enrolar em dívidas. Há quatro meses, ele acabou estourando o limite do cartão de crédito e do cheque especial, de R$ 300 cada. Desde então, foi obrigado a reduzir drasticamente as despesas para colocar o orçamento em dia.
João Thiago engrossa a estatística dos jovens que se descontrolam com suas contas. Dados do Serviço Central de Proteção ao Crédito (SCPC) revelam que 17% dos jovens entre 20 e 25 anos encerraram 2011 enrolados em dívida e sem condições de pagar. A quantidade de inadimplentes nessa faixa etária aumentou 7% em relação a 2010. E a corda no pescoço continuou apertando em 2012. Uma outra pesquisa, do SPC Brasil, feita a pedido do Correio, mostra que, no mês passado, 30,4% dos consumidores entre 18 e 29 anos estavam com débitos em atraso, 6% mais do que em janeiro e 2% acima de fevereiro de 2010.
O gerente de negócios do SPC Brasil, Gustavo Guimarães, vê o crescimento da inadimplência entre os mais jovens como reflexo da falta de maturidade no consumo. "O alto índice de empregabilidade é um fator favorável à inadimplência nesse caso. O jovem tem dívidas, não por ter menos dinheiro na conta, mas por dispor de mais renda em mãos e não saber como administrar os gastos", constata Guimarães.
O educador financeiro Mauro Calil concorda que a desorganização dos gastos entre jovens é fruto de um deslumbramento com o aumento repentino de renda. "São pessoas que tinham uma mesada de não mais do que R$ 100 por mês e, de repente, começam a ter salário ou uma renda maior que a dos pais. Quando veem o dinheiro, acham que estão ricos e dão vazão a todos os desejos de consumo de uma só vez", analisa.
João Thiago conta que teve que regular o orçamento para conseguir quitar o rombo na conta após ter estourado o limite do cartão de crédito e do cheque especial. "No mês seguinte, fiquei com apenas R$ 150 para gastar. Não dava. Acabei sendo obrigado a recorrer ao crédito de novo. Tive que reduzir em muito os gastos durante os últimos quatro meses", afirma.
O estudante Welington Alencar Borges, 21 anos, também sofre para controlar os gastos com o cartão de crédito. Com uma renda mensal de R$ 800, fruto de uma mesada semanal dada pelo pai, o estudante diz sentir no bolso o peso da desorganização na hora de administrar as contas. O susto mais recente aconteceu quando o estudante comprou, pelo cartão de crédito, um relógio e um perfume em um site no exterior. Ele conta que gastou cerca de US$ 200.
"Guardei o dinheiro para cobrir o valor quando chegasse a conta mas, com preguiça de depositar o montante, acabei gastando aos poucos", revela. "Pegava R$ 20 do dinheiro reservado e pensava "depois eu reponho". Mas, quando a conta chegou, não tinha mais nenhum centavo para quitá-la", afirma. Já quanto ao débito do cheque especial, Welington precisou da ajuda do pai para cobri-lo.
O estudante admite que recorre sempre ao cheque especial. "Uma vez fiquei no vermelho e tive que usar o dinheiro da mesada para cobrir a dívida. Passei uma semana comendo pão de forma no café da manhã, no almoço e no jantar", diverte-se, ao se lembrar do período de vacas magras.
Ilusão
O consultor Mauro Calil diz que avançar sobre o cheque especial é arriscado em razão dos juros altos. O melhor é evitar esse crédito fácil. "O valor do limite não deve ultrapassar 10% da renda. É para ser pouco mesmo, só deve ser utilizado em emergências", diz. O educador financeiro Reinaldo Domingos esclarece que o crédito não é um inimigo se bem administrado. "O grande problema é que o jovem se ilude com o parcelamento e compra o que não precisa com o dinheiro que não tem", explica. Domingos ensina que, se o jovem possui apenas um emprego, deve se limitar a ter um cartão de crédito, com limite que não ultrapasse 50% da renda. "Isso inibe a pessoa a gastar mais do que ganha", afirma. O vencimento deve ser programado para o prazo entre cinco e dez dias após o recebimento do salário.
A real armadilha para Domingos é o débito em conta, definida pelo educador como demonstração de "preguiça financeira". Ele defende que o consumidor tenha compromisso e agende todos os gastos mensais. "A facilidade do débito em conta já levou muita gente ao prejuízo. Se uma fatura de telefone vem errada, pode acabar consumindo todo o dinheiro disponível na conta, inclusive o cheque especial. O consumidor fica no prejuízo porque o ressarcimento pode demorar até um ano", explica.
Negocie o pagamento
O educador financeiro Mauro Calil recomenda que os endividados negociem as contas atrasadas a partir das mais puxadas, ou seja, aquelas com juros mais elevados, para as que têm os encargos mais baixos. "Honre suas negociações. Se precisar vender algo que comprou, venda. Afinal de contas, não foi o cartão de crédito que fez o jovem ficar endividado e sim sua decisão de consumir algum produto", ensina.