Luiz Gabriel Tiago

por Mariana Rosa (mariana@empreendedor.com.br)

Inspirado pelo Profeta Gentileza, figura que chamava a atenção nas ruas do Rio de Janeiro, na década de 1980, o carioca Luiz Gabriel Tiago, 36 anos, foi pioneiro em trazer o conceito de genti­leza no trabalho para o Brasil com a consultoria especializada SGEC (Sr. Gentileza Educação Cor­pLuiz Gabriel Tiagoorativa). A SGEC completa quatro anos no mer­cado prestando serviço a variadas instituições, entre elas a Polícia Militar do Rio de Janeiro que participou, este ano, de treinamentos para a atu­ação na segurança dos jogos da Copa do Mundo e nas unidades de pacificação. Tem experiência de 10 anos na rede hoteleira, com passagem pe­las redes Atlantica Hotels International e Accor Hotels. Apesar de não visar títulos acadêmicos, o interesse pela área da educação o levou, em 2001, à pesquisa de mestrado “(Re)educação de adul­tos no ambiente profissional através de valores humanos e gentileza”, defendida em 2001 pela Universidade Cândido Mendes, no Rio de Janeiro. É também autor das obras Como driblar a raiva no trabalho (Ideias e Letras, 2009), A arte de se tornar um profissional cobiçado (Interagir, 2011), A arte de se tornar um profissional cobiçado em vendas (Interagir, 2012) e Gentileza no trabalho (Ideias e Letras, 2013). Prepara-se para lançar, ainda este ano, sua quinta obra, O que papai não me ensinou, pela editora Ideias e Letras. Nesta entrevista, Luiz Gabriel conta sobre o método que desenvolveu, discute também os valores humanos que faltam ao mundo do trabalho atualmente e deixa como mensagem final uma advertência: “Não é preciso ter medo de ser gentil”.

Como o conceito de gentileza é aplicado?

Luiz Gabriel – Os treinamentos são o ponto máximo do nosso trabalho de consul­toria de gentileza nas empresas. Nós fazemos todo um preparo antes, conhecemos o am­biente, diagnosticamos problemas, propo­mos soluções. E os treinamentos acontecem justamente quando tudo já está mapeado. Nós conhecemos os profissionais que vão participar e durante os treinamentos a gen­te sela, a gente comove a todos e sedimenta a nossa proposta. É isso que a gente quer. Temos dois programas. Um acontece no for­mato de workshop, sempre em torno do as­sunto gentileza: gentileza no relacionamento interpessoal, gentileza estratégica, gentileza para líderes, gentileza para vendas. Em um segundo momento, dando continuidade aos workshops, nós temos o Jogo da Gentileza, que é adaptado às necessidades dos nossos clientes. Neste programa, acontece uma gin­cana, que é uma espécie de competição ao contrário: os grupos que são eliminados e desclassificados vão sendo absorvidos pelos vencedores, então todos chegam ao final. O objetivo dele é mostrar, na prática, como é possível ser gentil no trabalho, lógico visan­do resultados, mesmo sem pressão e sem tempo. Após os treinamentos, nós continua­mos fazendo acompanhamentos. Colhemos bastantes informações durante os treina­mentos, depoimentos. Acreditamos que a solução dos problemas está contida dentro do próprio problema. E ninguém melhor que o próprio colaborador para dar as solu­ções aos problemas da empresa.

Que comportamentos se procura eliminar?

Luiz Gabriel – A primeira coisa que fazemos quando somos contratados por uma empresa é pedir que todas as demis­sões previstas para as próximas semanas sejam congeladas por três a quatro meses. Geralmente, as demissões são por baixo de­sempenho, problema de relacionamento in­terpessoal, pessoas que não estão se dando. Então, a gente pede que congele porque se o problema for comportamental, nosso traba­lho é justamente superar isso. O que garan­timos que vai melhorar é o comportamento hostil. Por exemplo, “eu não falo com você”, isso é muito comum nas empresas, mais do que a gente imagina. Ou então, “eu te tolero, me relaciono porque sou obrigado, o míni­mo necessário”. A hostilidade, consequen­temente a fofoca, também é muito comum. Assim como as intrigas, o achismo. A genti­leza é um conjunto de valores e predicados para a gente. Se aplicarmos a gentileza no ambiente profissional, queremos maximizar os valores humanos. Preciso que se aprenda a enxergar o próximo de outra forma. Ao in­vés de potencializar o que as pessoas têm de ruim, potencializar o que elas têm de bom. Todos nós temos algo, isso é indiscutível.

Que mudanças de consciência se procura obter?

Luiz Gabriel – É exatamente isso, uma mudança de consciência para que isso reflita no seu comportamento no dia a dia. Conscientizar as pessoas que estão partici­pando deste projeto, envolvê-las no tema, comovê-las, para que definitivamente elas mudem sua postura. Mas isso só vai acon­tecer se houver um avanço de consciência. Não pode ser um projeto que a gente inicie numa empresa e que não tenha continuida­de, que as nossas estratégias não deem uma sustentação a ele. Entendemos que a gen­tileza começa dentro de nós. Ou seja, co­meça com o próprio “eu” através de ações individuais, para que as suas ações sirvam de exemplo para quem está ao seu lado. Aí sim, conseguimos atingir a coletividade.

Qual é o tipo de exercício que fazem na prática para atingir este resultado?

Luiz Gabriel – Um dos exercícios que fazemos, por exemplo, no Jogo da Gentile­za é a capacidade de valorizar aspectos po­sitivos das pessoas. Como se trata de uma competição, em uma das provas cada grupo é obrigado a homenagear um membro de outro grupo. A gente quer romper paradig­mas, acabar com tabus. Se essas pessoas não se davam muito bem, melhor ainda. Quando acontece, as pessoas se comovem, choram. Como posso ter sido homenageado por um grupo que mal falava comigo? Por menos que conheça aquelas pessoas, vai ter que usar da sua intuição, da sua percepção. A cultura diz que devemos julgar pelas aparên­cias – o cabelo, a forma como se fala, como se comporta. Este é um olhar diferente, um olhar para dentro das pessoas.

Quais são os resultados que esta mudança de comportamento pode trazer para uma empresa?

Luiz Gabriel – Nosso objetivo final numa empresa são os resultados. Queremos que as empresas prosperem ao aplicar gen­tileza no ambiente profissional. Acreditamos que a gentileza seja capaz de transformar o clima organizacional. Pessoas felizes pro­duzem mais. Isso já é até um clichê, todo mundo sabe, há vários livros. Pessoas gentis também produzem mais. Porque acreditamos que a felicidade seja consequência da prática da gentileza. O primeiro efeito da prática da gentileza no dia a dia do trabalho é a melho­ria no relacionamento interpessoal, ou seja, as pessoas aprendem a se relacionar com as demais. Em consequência disso, há a melho­ria do clima organizacional. Isso não acontece de uma hora para outra, a gente vai mudando aos poucos isso. E assim, melhoram os resul­tados. Se eu tiver prazer em estar na empresa, independente do tamanho dela, do segmento que ela atue, se eu tiver prazer em ir para lá é lógico que eu vou produzir mais e melhor. É isso que os patrões querem na verdade. No início, nossa atuação, há quatro anos quando nos lançamos no mercado, as empresas bus­cavam a gente com o objetivo final de resulta­do. Mas é engraçado que hoje o cenário mu­dou. As empresas estão se conscientizando da importância do clima organizacional, da paz no trabalho e nos buscam por isso. Se os re­sultados melhorarem e o faturamento junto, bacana. Mas o que querem mesmo é paz para trabalhar. É engraçado isso, como está mudan­do o perfil das empresas que nos procuram.

Hoje as empresas entendem bem a proposta de vocês então. Como foi no início do negócio?

Luiz Gabriel – Foi muito difícil. No primeiro ano, boa parte das empresas que a gente batia na porta não tinha interesse. Não acreditavam, diziam que era utopia. Algumas nem nos recebiam. Após o nosso primeiro cliente, que foi um hotel em São Paulo, o negócio foi de boca a boca. Hoje temos na carteira 200 clientes, entre órgãos públicos e privados. Ativos, com projeto atualmente, temos 35. Um deles é a Polí­cia Militar do Rio de Janeiro. Fazemos um trabalho super legal com eles no Complexo do Alemão e no Complexo da Maré, que são comunidades pacificadas. É o maior de­safio da gente. No início, ficamos com mui­to medo de aceitar e não dar conta. Eles abraçaram a causa, não tiveram resistência nenhuma. Capacitamos também todos os PMs que trabalharam na Copa no Rio de Janeiro, todos passaram pelas nossas mãos, temos o maior orgulho disso.

Quais são os segmentos que mais procuram o ser­viço de vocês hoje?

Luiz Gabriel – Hoje, sem dúvida, são hospitais e hotelaria. Hospitais particulares e públicos, por meio das secretarias munici­pais de saúde. São os nossos principais clien­tes hoje, é o que tem absorvido mais o nosso trabalho. Mas já tivemos, por exemplo, uma fase de agências de viagens, já atendemos empresas de engenharia, de advogados, fu­nerária, professores, etc.

São áreas mais propícias a assédio moral?

Luiz Gabriel – Não vejo esta relação. Todas as áreas padecem de grosseria, tem problemas de pressão. Não é justo dizer que as hotelarias e os hospitais sejam áreas mais tensas. A rede hospitalar tem hoje, felizmen­te, um programa de humanização em hos­pitais públicos e privados. É um programa do governo, o ministério da saúde estimula a adesão. Um dos requisitos para ser um hos­pital humanizado é melhorar o clima orga­nizacional. Talvez este seja um dos motivos para sermos tão absorvidos por esta área. De qualquer forma, ambos dependem do acolhimento e da hospitalidade. E você não pode fazer isso se não for humanizado, se não entender a prática de valores humanos.

Como foi seu contato com o conceito de genti­leza e a ideia de formular uma consultoria espe­cífica na área?

Luiz Gabriel – Meu primeiro conta­to foi com o falecido José Datrino, o Profeta Gentileza, não posso deixar de falar dele. Foi um homem que abdicou de seus bens mate­riais na década de 1960 para ensinar gentileza nas ruas do Rio de Janeiro. Isso por quase 40 anos. Ele simplesmente ficava gritando na rua “gentileza gera gentileza”. Pintou poemas em­baixo de um viaduto. Ele deixou um legado. Como carioca, convivi desde pequeno vendo o profeta gritando “gentileza gera gentileza”. Mas meu contato mais direto, mais conceitual foi no mestrado em educação, na minha pes­quisa que foi sobre a reeducação de adultos no ambiente profissional. O que eu quis dizer – com a pesquisa – foi que todos nós somos analfabetos em valores humanos e precisa­mos deles no ambiente profissional. Migrei estes poemas do falecido profeta gentileza para minha pesquisa de Mestrado. Ou seja, reeducação de adultos no ambiente profissio­nal através da gentileza. Não tinha pretensão nenhuma naquela época de ser chamado de Sr. Gentileza, de ser palestrante, de abrir uma empresa de consultoria, foi só uma pesquisa acadêmica. Na época trabalhava em hotel, sou graduado em turismo, mas sempre fui apaixo­nado por educação, continuei estudando e fui para a área da educação. Mas não pretendia sair da hotelaria. Meus livros começaram a ser publicados e empresas fizeram contato para fazer palestras. Percebi que havia um nicho, havia uma carência nas pessoas realmente de gentileza. Ou seja, a minha teoria era verdadei­ra. Há a necessidade de gentileza no ambiente profissional realmente. Resolvi formatar esta teoria em método. Ainda trabalhando na ho­telaria consegui uma transferência para a Irlan­da e lá pude me especializar em gentileza no trabalho, lá existe esta especialização.

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