por Mariana Rosa (mariana@empreendedor.com.br)
O coaching surgiu na década de 1970, inicialmente entre atletas que buscavam uma nova estratégia de treinamento: identificar seus erros através do autoconhecimento. A ideia foi adaptada ao ambiente corporativo, destacando-se em relação às consultorias em alguns aspectos, por exemplo, por ser um processo mais simples. Empresária e coach de negócios e executivos, Katia Macedo ocupou, por mais de 15 anos, posições executivas em empresas petroquímicas – é graduada em Engenharia Química, com pós em Engenharia Econômica e Processos e MBA em gestão executiva. Em 2012, fundou a Premium Coaching e Consultoria, visando o treinamento de pequenas e médias empresas, mercado ainda pouco explorado no Brasil. Nesta entrevista, a empreendedora comenta os desafios de gestão do segmento e as soluções que podem ser oferecidas pelo coaching de negócios.
Quais costumam ser os principais desafios de gestão enfrentados pelas pequenas e médias empresas no Brasil?
Katia Macedo – Segundo o estudo “Taxa de Sobrevivência das Empresas no Brasil”, feito pelo Sebrae, de cada 100 pequenas empresas abertas no Brasil, apenas 73 permanecem em atividade após os primeiros dois anos de existência. Em 2010, 58% das empresas de pequeno porte fecharam as portas antes de completar cinco anos. Em relação a 2009, este índice era de 62%. Entre os principais motivos descritos pelos empreendedores estão a falta de clientes (29%), capital (21%), concorrência (5%), burocracia e os impostos (7%). Segundo o Sebrae, outros fatores influenciam no processo de mortalidade das pequenas e médias empresas, como a falta de planejamento, de técnicas de marketing, de avaliação de custos e fluxo de caixa, entre outros.
Na nossa experiência à frente da Premium Coaching, no que tange às PMEs e seus líderes observamos que em geral há uma grande dependência da presença e da atuação do proprietário no dia a dia da empresa. O empreendedor ou líder precisa aprender a delegar o que não é essencial que ele faça pessoalmente, permitindo-lhe focar nos aspectos essenciais e estratégicos do seu negócio. Como consequência, as PMEs muitas vezes se veem focadas no curto prazo, faltando-lhes foco nas necessidades de seus clientes e no desenvolvimento contínuo da organização. Faltam, sobretudo, estratégias de crescimento e de saída do negócio para seus sócios, quando for o caso. Após a fase inicial de crescimento, muitas vezes é alcançado um estágio de estabilidade de resultados que é dificilmente vencido para que se possa atingir um novo patamar. Faltam recursos, conhecimentos, ferramentas, pessoal adequado e, sobretudo, tempo e foco na construção da nova realidade.
Há grande dificuldade para atrair, treinar e reter pessoal com o perfil profissional adequado. Em geral, não há preocupação com a construção e a manutenção de times de alta performance. O sucesso de qualquer empresa depende de reunir pessoas certas nos lugares certos. Pessoas certas, em lugares certos e que, adicionalmente, sentem-se parte de um time produzem mais e melhor. Mas reunir um grupo de pessoas competentes e denominá-lo como um time também é muito diferente de construir uma verdadeira equipe de alto desempenho, capaz de gerar resultados acima dos que seriam alcançados individualmente pelos seus membros.
A paixão pelo seu negócio e ao mesmo tempo essa sua percepção de que há necessidade dele se desdobrar entre todas as funções de gestão – planejamento, vendas, marketing, finanças, relacionamento com clientes, gestão de pessoal, operações, qualidade – levam os empreendedores a uma excessiva dedicação, com esgotamento da capacidade de inovação e criatividade, além de prejuízo da sua qualidade de vida.
De que forma o coaching pode colaborar com o desempenho deste segmento especificamente?
Katia – Coaching é uma parceria construída para desbloquear o potencial de pessoas e organizações para que possam maximizar seu desempenho alcan çando objetivos pessoais e profissionais. Verifica-se a situação atual do cliente, pessoa física ou negócio, e define-se o ponto onde se quer chegar. Identifica-se o que está impedindo que o resultado seja alcançado, quais são os pontos fortes que podem auxiliar e que estratégias podem ser usadas para atingir o alvo; por fim, definem-se parâmetros de medida para aferir o resultado alcançado.
No segmento de PMEs, duas modalidades de coaching são particularmente úteis: o coaching de negócios e o coaching executivo, nesse caso com destaque ao coaching de liderança.
No coaching de negócios, o foco é a melhora do desempenho da organização pelo estabelecimento de objetivos estratégicos. Por intermédio de um processo de reflexão, são construídos planos de ação, metas e alvos específicos a serem alcançados pelo negócio em horizonte de tempo definido. São trabalhados os valores e a estrutura da organização, recursos e competências a serem mobilizados, desenvolvidos ou adquiridos, desafios de marketing e gestão de pessoas, necessidade de treinamento de pessoal e ajustes na organização, entre outros.
No coaching executivo para PMEs, o foco é o desenvolvimento de competências de liderança. Através desse trabalho, são identificados os pontos fortes do cliente (empreendedor ou executivo), os melhores usos desses recursos e as áreas mais relevantes ainda por desenvolver. O cliente compreende seu estilo de liderança e aprende a usá-lo em todo o seu potencial como alavanca para alcance de resultados, aprimora seu pensamento estratégico e também a capacidade de construir e manter equipes de alta performance. O coaching também propicia o desenvolvimento de competências para uma gestão de mudanças mais eficaz e, ainda, a superação de comportamentos improdutivos, com otimização do tempo e priorização de rotas.
Não há uma receita única: as ferramentas variam, e cada indivíduo e negócio precisa ser apoiado pelo coach de acordo com as suas particularidades.
Os processos seletivos das pequenas e médias empresas costumam ser menos rigorosos do que os utilizados pelas grandes empresas. Quais aspectos esses empreendedores devem considerar para garantir a seleção de uma boa equipe?
Katia – É importante fazer uma reflexão prévia sobre o perfil desejado para que ele seja compatível com a cultura da empresa e com os desafios sob responsabilidade do candidato. Usar a rede de relacionamentos e ferramentas como o Linkedin e os sites de vagas podem ser decisões acertadas, eventualmente, mas recrutar às pressas, sem reflexão prévia cuidadosa, é arriscado. Além das competências técnicas, é importante ficar atento à interação do indivíduo com o futuro time de trabalho: características pessoais complementares e compatíveis com as da equipe de trabalho são fundamentais para a construção de times de alto desempenho.
Na hora de distribuir tarefas específicas entre os membros da equipe, o que deve ser levado em conta?
Katia – Estabelecer tarefas apenas para quem já teve oportunidade de realizá-las é o mais comum, mas essa escolha é mais compatível com uma gestão de curto prazo do que com o desenvolvimento estratégico sustentável dos negócios. Manter profissionais e equipes motivadas e em constante aprimoramento impõe estipular desafios continuamente. Por outro lado, é importante ter em mente que as pessoas tendem a produzir mais quando têm metas claramente estabelecidas em termos de resultado, qualidade e prazo e ao mesmo tempo estão razoavelmente livres para exercitar sua criatividade e iniciativa.
Qual a importância da participação do líder da empresa nas atividades planejadas?
Katia – O mais relevante papel do líder é assegurar as condições necessárias para que os times de trabalho operem com elevado grau de comprometimento, desempenho e resultados. É importante que ele mantenha uma comunicação eficiente com o grupo, permitindo a troca de informações e opiniões, além do espaço para o surgimento de novas ideias. Também é imprescindível que o líder dis semine uma visão comum dentro do time em relação aos objetivos do grupo, suas metas e as responsabilidades de cada membro. Cabe, finalmente, a ele destacar a cada oportunidade a importância de um espírito de cooperação entre os profissionais e equipes em prol de objetivos comuns, favorecendo a compreensão de que o todo integrado é maior que a soma dos talentos individuais, com isso evitando os conflitos desnecessários. Nesse aspecto, destacamos que nem todos os conflitos são perniciosos: se adequadamente geridos pelo líder, os conflitos podem mesmo se tornar produtivos, trazendo novos modos de trabalho, novas visões e amadurecimento para o grupo.
Como identificar o limite ideal entre a participação do líder e atuação da equipe?
Katia – O líder precisa estar envolvido profundamente com o negócio, mas determinar passo a passo o que deve ser feito pela equipe não é a melhor forma de delegar porque não desenvolve competências nem constrói senso de responsabilidade. Estimular a criação de rotinas e o mapeamento dos processos é fundamental para o aprendizado e a melhoria contínua, mas é imprescindível garantir espaço para que as possibilidades de aprimoramento identificadas no dia a dia pelos indivíduos e pelos times possam ser aproveitadas, estimulando-os no exercício da criatividade e na busca pela inovação.
Com que frequência os processos devem ser acompanhados para avaliar o retorno?
Katia – O processo de feedback não deve ser um evento anual. A comunicação sobre o que está funcionando e o que não está deve ser frequente, pois, distanciado no tempo dos eventos dignos de registro, o retorno dado ao colaborador perde muito do seu poder de consolidar comportamentos produtivos e de corrigir aqueles que não estejam contribuindo para os resultados positivos. Por outro lado, é importante planejar a reunião de feedback para que ela seja estruturada, objetiva e transparente. É importante usar a reunião de feedback para traçar um plano de desenvolvimento e permitir o acompanhamento da evolução no próximo ciclo. Sem metas estabelecidas, diminuem as chances de que os aperfeiçoamentos saiam do mundo das intenções e se integrem ao mundo dos fatos.
Oferecer bônus e promoções aos funcionários é uma boa forma de garantir o cumprimento dos objetivos estabelecidos?
Katia – As pessoas trabalham motivadas por dinheiro, status, reconhecimento ou mesmo pelo sentimento de contribuição para um resultado, mas trabalham ainda mais em busca de sentido para suas vidas. As pessoas querem desafios, aprender algo novo, fazer a diferença para a sua comunidade ou desenvolver um talento. Empresas que recompensam apenas com dinheiro gastam muito e mantêm relações superficiais com os funcionários, perdendo lealdade e comprometimento. Além disso, recompensas exclusivamente individuais minam o espírito de equipe e encorajam visões de curto prazo.
Além da recompensa financeira, que outros modelos podem ser adotados por pequenos e médios empreendedores para incentivar sua equipe?
Katia – Não existe um sistema mais adequado de recompensas, e as modalidades podem variar em larga escala: cursos e treinamentos especiais, participação em eventos e congressos, publicação de trabalhos, viagens, entre outros. É relevante ter em mente, entretanto, que toda a premiação dever ser estabelecida a partir da cultura e dos valores de cada organização. É imprescindível ainda que o processo seja bem comunicado e os objetivos integralmente compreendidos resultando em maior motivação, comprometimento e alinhamento com os resultados da empresa.
Cabe ainda refletir sobre a oportunidade de estabelecimento de premiações para os times e mesmo para toda a organização, além das recompensas individuais. Quando o sistema de avaliação e de recompensas da organização não estimula o trabalho de equipe, ele pode se tornar um obstáculo para a imprescindível manutenção de times de alta performance.