O tema é controverso e gera muitas dúvidas entre empreendedores e gestores, especialmente os que lideram a área de recursos humanos: uma empresa pode controlar o uso do celular dos funcionários no ambiente de trabalho? E mais, pode acontecer uma demissão de justa causa por conta do uso excessivo do celular durante o horário do expediente?
Embora não exista uma lei específica sobre o assunto, há algumas interpretações de juristas dizendo que sim, a empresa tem o direito de disciplinar o uso do aparelho no horário de expediente. E que se o colaborador usar o smartphone de maneira excessiva no ambiente de trabalho, a demissão por justa causa é um procedimento a ser adotado.
Mas os especialistas afirmam que a empresa deve ter uma política interna para a utilização do aparelho no ambiente profissional. E que estas regras devem ser mencionadas no momento da contratação do funcionário ou ainda estarem discriminadas no contrato de trabalho. Vale até mesmo enviar por e-mail, por exemplo, uma circular que disciplina o uso de celulares e dispositivos móveis por parte dos funcionários.
Em resumo: a companhia deve ter uma comunicação clara e direta sobre o tema. E que antes de uma demissão por justa causa, por exemplo, há outras ações punitivas que podem e devem ser colocadas em prática. Confira abaixo a interpretação de três juristas sobre a questão:
Existem outras medidas a serem aplicadas antes da demissão
A demissão por justa causa deve ser utilizada com cautela, pois é a medida mais grave a ser aplicada ao empregado. Quem manda um funcionário embora deve ter bom senso e lembrar que se trata de uma ação extrema. Há outras medidas disciplinares que podem e devem ser usadas antes da empresa tomar esta decisão.
Quem afirma isso é desembargador do Tribunal Regional do Trabalho (TRT-CE), Paulo Régis Machado Botelho. “O uso excessivo do celular no ambiente de trabalho pode provocar punições por parte do empregador. Tudo está dentro da razoabilidade. O uso excessivo implica no fato do empregado não estar comprometido com o trabalho. Evidentemente, o empregador pode usar o poder disciplinar e aplicar as punições devidas. Isso pode implicar em uma advertência, suspensão e até dispensa por justa causa”, disse desembargador do Ceará. Confira um áudio em que o jurista fala sobre o assunto no site do TST.
A demissão pode acontecer se causar prejuízo ao trabalho
A desembargadora aposentada do Tribunal Regional do Trabalho (TRT-RJ), Vólia Bomfim, em texto publicado no site da LFG, afirma que o uso excessivo do celular no horário de expediente pode causar demissão quando o uso do dispositivo no ambiente profissional “é proibido pelo empregador ou mesmo quando permitido e causar prejuízo ao trabalho”. A juíza tem a intepretação similar a do desembargador cearense e afirma que em algumas situações uma empresa pode realizar a demissão por justa causa.
“Se houve proibição expressa e o empregado já foi advertido várias vezes pelo uso indevido, pode o empregador, em caso de reincidência, aplicar a justa causa. Um motorista de ônibus que dirige o veículo falando ao celular é mais grave que uma atendente que, quando ociosa no trabalho, fala ao telefone durante o expediente. Logo, tudo depende da gravidade do ato”, escreve Vólia Bomfim. Ela cita o artigo 482 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) como embasamento legal.
Sob o viés do público interno, a especialista em direito trabalhista carioca afirma ainda que o funcionário que for demitido pode usar a falta de uma política interna como argumento de defesa. De acordo com ela, o colaborador deve comprovar que a prática era permitida na empresa e que não era prejudicial ao serviço. Ou mesmo que o uso de celulares e smartphones não comprometia a sua produtividade.
Não há leis específicas sobre o tema
Em artigo publicado no site da Federação Nacional das Empresas de Serviços Contábeis e das Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas (Fenacon), a advogada Daiana Capeleto afirma que o sistema jurídico do Brasil não conta com uma legislação específica que regule ou discipline uso do celular em horário de expediente.
De acordo com Capeleto, “o direito de proibição está inserido no poder diretivo do empregador. Para tanto, é prudente incluir cláusulas restritivas nos contratos de trabalho e estabelecer, por meio de regulamento interno, quais são as regras para uso racional do aparelho, fixando horários pré-determinados ou limitados às pequenas pausas de descanso”.
A advogada catarinense afirma ainda que em atividades de risco, recomenda-se que a proibição conste nos procedimentos de segurança. É o caso de trabalhadores que executam atividades manuais, como os da construção civil ou da indústria. “O uso constante do telefone resulta não apenas na interrupção dos serviços, mas também contribui para a ocorrência de acidentes, colocando em risco a integridade física dos trabalhadores”, argumenta Capeleto.
Conclusão
Vale lembrar ainda que atualmente o celular pode ser uma ferramenta de trabalho em diversos setores e segmentos. Ele pode ser uma forma de um vendedor entrar em contato mais rapidamente com um cliente, por exemplo. E que os smartphones não contemplam somente o uso de serviços de voz, como no passado, mas também possibilitam o acesso a aplicativos como o Google, Facebook e o WhatsApp.
Estes aplicativos são bem populares entre os usuários brasileiros e podem ser uma ferramenta de trabalho para aumentar a produtividade, as vendas e, por consequência, a lucratividade de uma companhia. Há uma extensa literatura que comprova que a transformação digital impacta positivamente no ambiente corporativo. Confira um vídeo sobre este aspecto no canal do YouTube do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Mas a mesma reportagem mostra que o uso excessivo destes aplicativos pode interferir na concentração do funcionário e afetar o seu desempenho nas tarefas para as quais ele foi admitido. Trata-se da desídia no desempenho das respectivas funções. Ou seja, desempenhar as suas atividades laborais com preguiça, agir com desinteresse, desleixo ou desatenção.
Como de regra, para disciplinar o uso de celulares no ambiente de trabalho, é necessário ter bom senso e boa fé, tanto da parte do empregador, como do colaborador. A Grounds pode ajudar o empreendedor a mitigar riscos sobre estes e outros assuntos. A companhia é referência em áreas como contábil, tributária, trabalhista, previdenciária e financeira e oferece uma visão estratégica, comprometida em ir mais além na busca de soluções eficientes para seus clientes.
*Dhyego Pontes é Consultor Trabalhista e Previdenciário da Grounds