As mais de 13 milhões de pessoas que vivem nas comunidades periféricas do Brasil podem ser as principais vítimas do Covid-19. Nessas áreas – com alta concentração de moradores em habitações pequenas, insalubres e muitos sem acesso à água tratada –, o potencial dano causado pela pandemia adquire dimensões maiores diante da vulnerabilidade econômica e social. Nesse cenário, os empreendedores de impacto social, com produtos e serviços voltados a amenizar a escalada da pobreza e a escassez econômica, têm papel preponderante durante o combate do coronavírus e no contexto pós pandemia.
Para apoiar a sobrevivência desses negócios – que geram renda, empregos e apoiam a economia na qual estão inseridos – a Articuladora de Negócios de Impacto da Periferia (ANIP) e o Banco Pérola anunciam uma aliança estratégica para conceder crédito com juros zero e acompanhamento a 50 negócios de impacto social. A ANIP é resultado da parceria entre A Banca, Artemisia e FGVcenn; o fundo Volta por Cima conduzirá aportes em negócios selecionais com apoio de doações feitas pela Potencia Ventures, Fundação ARYMAX, Instituto Humanize, Fundação Tide Setubal, Instituto Vedacit, Votorantim Cimentos, Tigre e Instituto Carlos Roberto Hansen (ICRH), Gerdau, Instituto de Cidadania Empresarial (ICE), Instituto C&A, Fundação Telefônica Vivo e INSEAD Alumni Association Brazil.
Com foco na concessão de empréstimos sem juros para cobrir despesas essenciais de negócios com forte atuação nas periferias – e que foram afetados pela crise decorrente do Covid-19 –, o fundo emergencial Volta por Cima conta com doações de pessoas físicas e jurídicas. Neste primeiro momento, a concessão será restrita a negócios do portfólio de acelerados da ANIP e da Artemisia, que se encaixam no perfil proposto pela iniciativa. O fundo será acolhido pelo Banco Pérola, OSCIP de crédito habilitada pelo Ministério da Justiça para conceder empréstimos. A Artemisia, organização pioneira no Brasil no apoio a negócios de impacto social, conduzirá a chamada para os potenciais beneficiários que integram os portfólios.
Maure Pessanha – diretora-executiva da Artemisia e uma das articuladoras do fundo Volta por Cima – destaca que não é de hoje que os empreendedores de impacto social enxergam as pessoas em situação de vulnerabilidade econômica e que têm transformado a forma de fazer negócios no Brasil com soluções que visam, justamente, amenizar os problemas enfrentados pelos mais vulneráveis. “Embora não possamos estimar o que vamos vivenciar em um futuro próximo, acreditamos que esses empreendedores serão cada vez mais necessários para conter a escalada da pobreza e da escassez econômica em um país durante e pós pandemia. Em um momento no qual a inovação social assume uma importância gigantesca, o papel dos investidores e articuladores do ecossistema de negócios de impacto é decisivo. Por isso, a ANIP se uniu ao Banco Pérola com o objetivo de criar uma solução financeira que permita que esses empreendedores de impacto social continuem as próprias jornadas e possam permanecer como fonte de emprego e renda, gerando impacto e apoiando as economias locais em que atuam”, afirma.
A proposta do fundo Volta por Cima – que usou como base os resultados da pesquisa conduzida pela Artemisia com 78 empreendedores da rede sobre o impacto da pandemia nos negócios em estágio inicial – é apoiar negócios com capacidade de execução e que apresentam risco imediato, de curto e de médio prazos. “Essa avaliação foi fundamental para termos uma fotografia dos efeitos do cenário atual nesse recorte do nosso portfólio, detectando os riscos que acometem os negócios de diferentes setores e modelos”, detalha Maure, acrescentando que os negócios beneficiados pelo fundo na primeira rodada de apoio deverão ser anunciados no mês de maio. Cada negócio receberá R$ 15 mil, que podem ser pagos em até 12 parcelas sem juros, com carência de seis meses. Segundo Maure, à medida que os empréstimos forem pagos, o fundo passa a ter a possibilidade de apoiar, no futuro, novos negócios.
Marcelo Rocha – DJ Bola (foto), fundador do negócio social A Banca e cofundador da Articuladora de Negócio de Impacto da Periferia (ANIP) –, comenta que o fundo Volta Por Cima é um elo de uma corrente de inovação social e econômica no ecossistema de negócios de impacto. “Esse recurso apoiará diversos negócios de impacto periféricos. Mais que nunca, criar um mecanismo financeiro que entende as reais necessidades desses empreendedores e empreendedoras – dando acesso a empréstimo de forma simples, sem juros e com condições especiais – é necessário e urgente”, afirma, acrescentando que o fundo, nesse momento, é emergencial por conta do Covid-19, mas que futuramente pode ser um exemplo de cooperação a ser seguido para que outras iniciativas sejam fortalecidas e criadas para que os empreendedores atuantes nas periferias tenham autonomia e poder de escolha por meio de sonho de empreender e gerar impacto positivo. Reforça, também, que a luta para evidenciar o que tem de mais potente nas periferias é de longa data. “Há mais de 10 anos, buscamos fomentar as inovações sociais e economias criativas para que os irmãos e irmãs das quebradas continuem sendo protagonistas e revolucionárias em seus territórios”.
Edgard Barki, coordenador do FGVcenn, ressalta que o fundo Volta por Cima tem o objetivo de apoiar negócios que sempre tiveram a preocupação com o impacto social. “Esse fundo é de extrema relevância para que empreendedores de periferia, que sempre buscaram resolver problemas sociais e/ou ambientais, possam sobreviver e conseguir continuar impactando mais no futuro”, salienta o professor.
O fundo Volta Por Cima segue captando recursos – em forma de doação – de pessoas físicas e jurídicas para ampliar o número de empreendedores beneficiados.
Uma nova forma de enxergar os negócios de impacto da periferia
Nas periferias brasileiras emerge um novo pensamento sobre negócios de impacto social, liderado por uma geração de empreendedores que unem potência de inovação, impacto e superação. Para apoiar e potencializar esse empreendedorismo transformador, A Banca, a Artemisia e o FGVcenn se uniram, em 2018, para criar a Aceleradora de Negócios de Impacto da Periferia (ANIP), iniciativa pioneira no tema. Em 2020, as organizações conduziram um reposicionamento estratégico, passando a atuar como Articuladora de Negócios de Impacto da Periferia (ANIP).
A mudança representa uma ampliação do escopo de trabalho para implementar uma estratégia integrada de apoio à jornada empreendedora dentro das periferias em quatro grandes frentes de atuação: mobilização e inspiração; novos modelos financeiros – na qual se insere o fundo emergencial Volta por Cima –; geração de conhecimento; e formação de empreendedores. Atuando como articuladora, em 2020, a ANIP tem a intenção de compreender, articular e mobilizar atores estratégicos para a consolidação do ecossistema de negócios de impacto nas periferias. A Articuladora de Negócios de Impacto da Periferia conta com o apoio da Fundação ARYMAX, Fundação Tide Setubal, Fundação Via Varejo, Instituto Humanize e AZ Quest.
BANCO PÉROLA |
Há mais de 10 anos o Banco Pérola concede empréstimos e apoio ao micro e pequeno empreendedor. Nesse período, foi desenvolvida uma metodologia de análise de crédito específica, fundamental para o propósito: por se tratar de um público vulnerável, as operações apresentam um alto risco, o que faz com que esse empreendedor seja excluído ou enfrente muitas dificuldades no sistema financeiro tradicional. A experiência que o Banco Pérola adquiriu nessa importante etapa do processo garante que o recurso será oferecido nas melhores condições e que seja aplicado para gerar movimento na economia local e que sejam criados empregos na comunidade. Nos primeiros anos, a operação foi viabilizada pelas premiações que a associação e a fundadora Alessandra França receberam; todas foram integralmente direcionadas ao projeto. Para obter recurso recorrente e conseguir atingir mais empreendedores, o Banco Pérola participou da criação do Pérola FIDC – fundo de investimento em direitos creditórios – em 2014. Essa é uma ferramenta inovadora para um mercado que busca, ao mesmo tempo, rentabilidade e investimento de impacto.
A BANCA |
A Banca é um negócio de impacto da periferia que proporciona uma mudança de perspectiva, contribuindo para que a periferia seja empreendedora do próprio sonho, com qualidade de vida, conectando pessoas e articulando o ecossistema. A A Banca nasceu como um movimento juvenil no final da década de 1990 quando o Jardim Ângela era o lugar mais violento do mundo. Em 2007, passou pelo processo de aceleração da Artemisia; em 2008, estruturou-se juridicamente, tornando-se uma associação. Desde o início de suas atividades, A Banca já realizou mais de 130 eventos gratuitos em espaços públicos da cidade de São Paulo, nos quais se apresentaram 120 grupos musicais, beneficiando diretamente 45 mil pessoas. Atuou com mais de 25 escolas públicas e privadas, oferecendo intervenções educacionais por meio da cultura Hip Hop e da Educação Popular. Foi a pioneira em fazer conexões de impacto, em busca de romper as barreiras invisíveis culturais, sociais e econômicas com pessoas de diferentes realidades na cidade de São Paulo.
ARTEMISIA |
A Artemisia é uma organização sem fins lucrativos, pioneira na disseminação e no fomento de negócios de impacto social no Brasil. A organização apoia negócios voltados à população em situação de vulnerabilidade econômica, que criam soluções para problemas socioambientais e provocam impacto social positivo por meio de sua atividade principal. A missão da organização é identificar e potencializar empreendedores(as) e negócios de impacto social que sejam referência na construção de um Brasil mais ético e justo. A organização já apoiou mais de 500 iniciativas de todo o Brasil em seus diferentes programas, tendo acelerado intensamente mais de 180 negócios de impacto social. Fundada em 2005 pela Potencia Ventures, possui atuação nacional e escritório em São Paulo.
FGVcenn |
O Centro de Empreendedorismo e Novos Negócios (FGVcenn) foi criado em junho de 2004 com a missão de ser um gerador de conhecimento em empreendedorismo no Brasil, construindo uma cultura empreendedora na Fundação Getulio Vargas e contribuindo para impulsionar o ecossistema de empreendedorismo no Brasil. Para isso, o Centro reúne pesquisadores de formações diversas para estudar e propagar conhecimento sobre empreendedorismo de forma multidisciplinar, independente e de acesso público. O FGVcenn é reconhecido como um centro de excelência sobre empreendedorismo e realiza uma série de eventos, workshops, congressos e pesquisas, a maioria deles oferecida gratuitamente a um público interno e externo à FGV.
Interessados podem acessar o site da iniciativa: https://impactosocial.