Por Daniel R. Bastreghi, sócio administrador e Consultor de Marketing na DRB.MKT
Numa era em que os dados fluem de forma acelerada e a interconexão redefine a maneira como a informação é consumida, já se pode dizer que é incontestável a presença quase que onipresente da Inteligência Artificial no cenário do Marketing. Testemunhamos no nosso dia a dia a condução dos algoritmos que demonstram compreender nossos desejos antes mesmo de termos a chance de expressá-los publicamente. Neste palco, surge uma forte questão que, inclusive, vem sendo muito discutida nos últimos grandes eventos de comunicação e tecnologia: quais seriam os impactos da IA no marketing? Cada vez mais presente no cotidiano de empresas e profissionais desde o surgimento de plataformas como ChatGPT, a IA vem dividindo opiniões no último ano quanto aos seus usos, benefícios e até a questões éticas que envolvem a sua aplicação.
A expectativa, segundo a Gartner, é que até 2028 cerca de 60% da força de vendas feita por empresas globais serão realizadas por meio de tecnologias de IA. E não para por aí! A mesma pesquisa revela que 30% da comunicação com o público será feita artificialmente por automação. De acordo com a Harvard Business Review, a inteligência artificial possui um potencial de amplificar significativamente as funções-chave do marketing, que vão desde compreender as preferências do consumidor até conectá-las com produtos e serviços mais direcionados, incentivando, assim, a uma compra mais efetiva.
Grandes fabricantes e varejistas, por exemplo, estão dedicando esforços significativos na coleta e interpretação de dados com auxílio da IA, gerando data products capazes de fornecer inteligência para a interação com o cliente, seja ela digital ou tradicional. O que não podemos deixar de fora é o grande potencial transformador nas atividades de atendimento ao cliente. A IA já é usada em canais digitais para interpretar o sentimento do cliente em atendimento por texto ou por voz e resolve questões mais simples, bem como percebe o momento de oferecer um atendimento humano. Então, mesmo quando um humano entra em cena, a IA continua atuando como ferramenta de apoio do atendente, sinalizando soluções, oportunidades de venda adicional, riscos de fraude, entre outros aspectos. Seth Godin, autor do livro Permission Marketing e de muitos outros na área, defende a importância da permissão e da construção de relacionamentos autênticos com os consumidores. Não vejo o porquê a IA não possa ser uma ferramenta valiosa para personalizar as interações, desde que seja usada com sensibilidade.
No entanto, a comunicação promocional vem enfrentando desafios crescentes devido à dispersão da atenção das pessoas em meio a estímulos concorrentes. O uso generalizado da inteligência artificial amplifica a competição pela atenção, reduzindo a efetividade dos anúncios. A tendência de queda na eficácia dos anúncios é acentuada pela influência da IA. Além disso, a intensificação da regulamentação da mídia e do uso de dados é antecipada, uma vez que a inteligência artificial oferece um potencial significativo para a disseminação de informações falsas indistinguíveis da verdade, exigindo esforços adicionais para garantir a integridade das comunicações.
Neil Patel, especialista renomado no campo do Marketing Digital, também expressa sua preocupação com os impactos substanciais em duas áreas específicas: analytics e o panorama delineado para a personalização, bem como as maneiras pelas quais as empresas podem explorar essas transformações em seu benefício.
A IA suscita entusiasmo, mas levanta preocupações éticas, especialmente no tocante à propriedade de obras geradas, como textos e imagens. Questões legais sobre direitos autorais, responsabilidade e posse emergem, sem clareza jurídica. Portanto, teremos certamente muitas discussões sobre direitos autorais. Quem será o dono de algo criado por IA? O desenvolvedor da IA, os donos das inúmeras bases de dados consumidas no processo de aprendizagem ou a pessoa que redigiu o prompt? Não está claro qual será o entendimento jurídico em torno desta questão, havendo grande risco para aqueles que fizerem uso negligente.
Outra questão está no processamento de dados pela IA. O uso de dados sensíveis no treinamento da IA e a possibilidade de respostas não alinhadas com a realidade também demandam atenção, requerendo cautela e verificação rigorosa por parte dos profissionais, além da definição de ambientes seguros para o processamento de IA. Com isso, os profissionais de marketing precisam ser céticos e submeter toda resposta gerada por IA à uma dupla ou tripla checagem. A dúvida é: estamos preparados para duvidar de tudo o que uma IA responde? Teremos condições de perceber as possíveis falhas antes que seja tarde?
Uma das últimas apostas ousadas no marketing foi a criação de uma influenciadora digital totalmente desenvolvida por IA. A agência de modelos espanhola The Clueless investiu na criação inusitada e, hoje, a modelo virtual batizada de Aitana, já participa de campanhas publicitárias que faturam até € 10 mil por mês. Acredito que essa seja uma das tendências na publicidade para os próximos anos e que oferece muitas vantagens para as empresas anunciantes, como total controle sobre a associação da marca, a certeza de que aquela personalidade será eternamente alinhada aos valores da empresa, maior produtividade e liberdade para estabelecer novas formas de remuneração pelo uso da imagem. Para o público consumidor, Aitana é quase indistinguível de qualquer outro perfil no Instagram e, se for bem trabalhada, pode conseguir diversos seguidores e influenciar muitas decisões de compra.
Desde que fique claro se tratar de um personagem, há uma relação de entretenimento e consumo tão válida quanto diversas outras já existentes na mídia. Hoje, o que estamos acostumados a ver nos perfis dos famosos já constitui um personagem, uma criação de diversos profissionais de marketing. Logo, havendo clareza sobre a inexistência da Aitana, entendo que há verdade e que a IA vem sendo usada dentro de limites éticos.
*Daniel R. Bastreghi é sócio administrador e Consultor de Marketing na DRB.MKT, atuando com orientação e assessoria de planejamento de marketing, planejamento estratégico, estruturação comercial, implantação de CRM, inbound marketing, ações integradas de marketing digital e pesquisas. É autor do livro “Os 5 fatores de sucesso na Internet” e da ferramenta de planejamento “Marketing Strategy Canvas”. Sendo assim, é a fonte ideal para falar sobre tendências do setor, social media, influenciadores, produtividade e gestão. Daniel é MBA em Gestão de Projetos pela UNINTER. Pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná, possui especialização em Planejamento e Gerenciamento Estratégico.